Somam-se as notícias sobre uma já pouco disfarçada reversão da estratégia norte-americana no que diz respeito ao esforço financeiro, que já ultrapassou os 20 mil milhões USD, no apoio à Ucrânia na sua guerra contra a invasão russa que já dura há oito meses... a não ser que seja uma jogada táctica para favorecer os Democratas nas eleições intercalares de hoje, onde as sondagens mostram que os Republicanos estão a dois passos de reconquistar o controlo do Congresso devido à crise económica e à inflação que é em pate resultado do conflito no leste europeu.
Primeiro, foi The Washington Post a noticiar, sempre recorrendo a fontes próximas da Administração Biden, que a Casa Branca está a pressionar o Governo de Volodymyr Zelensky para não fechar totalmente a porta a negociações com a Rússia para alcançar um acordo de paz.
Depois foi The Wall Street Journal a garantir, sob certezas afiançadas por fontes ligadas ao Governo norte-americano, que Jake Sullivan, o conselheiro principal de Joe Biden para a Segurança Nacional, manteve permanentes contactos com o Kremlin para evitar uma escalada perigosa nesta guerra e manter a porta sempre entreaberta para uma solução negociada.
Por fim, a Bloomberg, já hoje, terça-feira, 08, dias das eleições intercalares nos Estados Unidos, divulgou que o Presidente Joe Biden permitiu, secretamente, apesar das sanções claras a impedi-lo, que os gigantes da banca norte-americana, como JP Morgan ou Citigroup, que mantivessem os negócios com as grandes empresas russas... alegadamente para diluir os efeitos-refluxo das sanções na economia do país.
Segundo a Bloomberg, nesta que pode ser a mais importante das três notícias que mostram como Washington está a esforçar-se para manter uma ligação sólida com Moscovo, apesar de toda a retórica agressiva de parte a parte sobre e por causa da guerra na Ucrânia, o Tesouro dos EUA (tutela das Finanças) e o Departamento de Estado (tutela das Relações Exteriores), não só autorizaram como "pediram tecnicamente que os grandes bancos norte-americanos não recusassem manter os negócios com certas empresas estratégicas russas".
Esta informação revela ainda, pela primeira vez, que a Administração Biden admite que as sanções à Rússia estão a ter um impacto perverso, uma espécie de tiro que saiu pela culatra, e que podem não ter sido bem ponderadas, a ponto de, como alguns analistas já avançam, poderem ser a razão principal para o desaire eleitoral dos Democratas nesta terça-feira de eleições de meio-termo, e, possivelmente, a sentença de morte do projecto de recandidatura de Biden em 2024 para um segundo mandato.
A notícia das Bloomberg diz que os bancos norte-americanos foram aconselhados a manterem as ligações às empresas russas especialmente no que diz respeito às transferências monetárias e a conversão para dólares do rublo russo, especialmente da Gazprom, o gigante russo do gás natural, e, entre outras, as companhias produtoras de fertilizantes e fosfatos Uralkali e PhosAgro, atenuando assim o impacto económico no país das sanções aplicadas à Federação Russa, aprovadas em catadupa logo após a invasão da Ucrânia a 24 de Fevereiro.
Estas sanções são uma das razões principais da crise económica e inflação que os EUA atravessam, especialmente por causa do aumento vertiginoso no preços dos combustíveis fruto das sanções atiradas contra as exportações de petróleo, gás e carvão pela Rússia, um dos maiores produtores/exportadores do mundo, e que está na base da degradação dopeso eleitoral dos Democratas de Joe Biden, como as sondagens mostram, podendo mesmo perder o controlo nas duas câmaras do Congresso.
Kherson, a última batalha desta guerra?
Entretanto, no campo de batalha, é na cidade de Kherson que o mundo tem os olhos postos, porque é ali que se deverá travar a mais sangrenta das batalhas deste conflito que já vai para o seu 9º mês, com as forças ucranianas a aproximarem-se dos limites da cidade e as forças russas a deixarem a urbe passando para o outro lado do Rio Dniepre, numa manobra que alguns analistas admitem poder ser uma espécie de armadilha para um cerco letal de artilharia às forças ucranianas que a ocuparem.
Isto resulta de uma análise objectiva ao que se passa em torno da cidade de Kherson, ocupada desde Março pela Rússia, depois anexada e feita território russo em Setembro, mas de onde os civis estão a ser retirados à pressa, mais de 70 mil, em escassos dias, de onde até as bandeiras russas nos edifícios públicos estão a ser retiradas pelos... russos, mas com as redondezas da urbe, situada na margem direita do Rio Dniepre, a serem avassaladoramente fortificadas com reforços em homens e em equipamento, como se de um convite aos ucranianos para entrarem na cidade se tratasse.
Algumas chefias ucranianas já admitiram que os russos estão a preparar uma armadilha para as forças ucranianas serem apanhadas sob um cerco dantesco de artilharia quando ocuparem a cidade de Kherson.
Alguns relatos apontam mesmo para que as casas dos civis que estão a sair da cidade são ocupadas por militares das forças especiais russas que despem as fradas e trajam à civil, de forma a melhor esperar pelas unidades de combate ucranianas.
Mas o que se passa, de facto, segundo analistas militares, como o major-general Agostinho Costa, ouvido na CNN Portugal, é que Kiev tem aqui uma oportunidade de tomar a única capital tomada fisicamente pelos russos das quatro anexadas, o que seria um momento de grande importância simbólica e propagandística para a Ucrânia, o que deverá ser suficiente para que essa contra-ofensiva siga nesse sentido, como, diga-se, o indicia já os repetidos ataques com tropas especiais aos arredores de Kherson e a destruição das pontes no Rio Dniepre por onde os russos se podem reabastecer, usando para o efeito os misseis HIMARS norte-americanos.
Armamento ocidental adequado a uma derradeira e decisiva batalha
Este cenário, que aponta para a batalha de Kherson como um estrondoso, trágico e letal cair dos panos deste conflito que já é visto como insuportável pelos países europeus e pelo resto do mundo, pode estar a ser visto como uma última oportunidade para testar armamento em contexto de guerra real, com os EUA a apressarem as entregas dos sistemas antiaéreos de médio alcance NASAMS, que produziram em parceria com a Noruega, e que estavam a ser pedidos por Zelensky há meses.
Foi o ministro da Defesa ucraniano, Aleksey Reznikov, que confirmou esta chegada ao país dos NASAMS, assim como os italianos ASPIDE, misseis terra-ar, oferecidos por Espanha, Noruega e EUA, um reforço substancial para o aparato antiaéreo ucraniano que está a ser montade em redor das suas maiores cidades e locais de importância estratégica, como as centrais eléctricas, os alvos mais atingidos nesta fase da guerra pela Rússia, que deixou uma larga maioria do país sem energia eléctrica e levou mesmo o Governo de Zelensky a admitir já que terá de retirar os três milhões de cidadãos que habitam em Kiev por falta de condições mínimas para aguentarem o rigoroso Inverno que pode chegar a 10 graus negativos.
Estas armas, com grande mobilidade, podem ainda ser de utilidade efectiva depois de os ucranianos reocuparem Kherson, para se defenderem não só da aviação russa mas também dos seus furtivos misseis Kalibr ou Iskander, ou ainda dos seus drones, difíceis de detectar pela actual parafernália antiaérea de que dispõem.
A pergunta agora que mais se coloca é "quando" é que os ucranianos vão avançar sobre Kherson, porque a questão não é já "se", e logo de seguida, pergunta-se se efectivamente a retirada estranha dos russos de Kherson é estratégica para cercar e destruir o grosso das suas principais tropas com a intensa e cerrada chuva de artilharia que estará a ser preparada, ou se se trata, na verdade, de uma retirada por falta de condições para manter a cidade face ao volume e qualidade de forças ucranianas dispostas para a contra-ofensiva, finalmente, ao que tudo indica, com um número elevado de sistemas de misseis de precisão HIMARS e os obuses M777, de grande eficácia, ambos, a distâncias de 70 kms ou mais, fornecidos pelos Estados Unidos.
A resposta só poderá ser efectiva se acontecer em breve ou se a chuva enlameadora dos caminhos e frio intenso que tudo gela em seu redor chegarem antes da Ucrânia dar este passo, porque isso quererá dizer que já não o vão fazer, pelo menos até ao início da Primavera.
Putin entre os grandes do mundo?
Na próxima semana, o G20, grupo que agrega os 20 países mais ricos do mundo, vai reunir na Indonésia, e os media internacionais já especulam que este pode ser o palco inesperado de um encontro entre os Presidentes norte-americano, Joe Biden, e russo, Vladimir Putin, ajustando-o a temas globais, como a questão do nuclear ou até dos alimentos em trânsito pelo Mar Negro, embora depois, à porta fechada, como sempre acontece, nenhum tema relevante deve ser tabu.
Mas esse encontro não está confirmado, nem é certo ainda que Putin se desloque à Indonésia para esta reunião do G20, que decorrerá em Bali, onde o Presidente ucraniano, Zelensky, já afirmou que se o senhor do Kremlin estiver, ele não fará qualquer comunicação durante os trabalhos, como sempre acontece...
Porém, considerando a nova realidade, substanciada pelos repetidos sinais de aproximação e ou interesse dos EUA em por um ponto final a esta guerra que já está a cansar o mundo e onde os protestos populares se avolumam contra a sua continuação e contra o apoio ocidental a Kiev, pelo impacto negativo na vida das família devido ao destrutivo e crescente aumento do custo de vida, a chantagem com a ameaça de ausência no G20 de Volodymyr Zelensky, poderá, desta vez, não surtir o efeito desejado, até porque neste fórum vão estar alguns dos de facto mais importantes apoiantes de Moscovo, como a China, Índia, Brasil, África do Sul...
Isto, porque a Indonésia, como país anfitrião, já mostrou interesse em contar com a presença do líder russo, e o presidente da organização Joko Widodo, avançou mesmo estarem e curso conversações para que tal suceda, admitindo que se tal não acontecer fisicamente, Putin poderá juntar-se ao grupo por via digital.
E Putin também ainda não decidiu se vai ou de que forma irá, física ou virtualmente, como explicou o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, que avançou que tal decisão será tomada até ao final da semana, tempo suficiente para preparar a deslocação ao G20 que vai decorrer entre 15 e 16 deste mês de Novembro.
O histórico recente desta crise no leste europeu pode ser revisitado nos links colocados em baixo, nesta página.