O RAND Corporation é, actualmente, o mais respeitado grupo de análise pelas chefias militares norte-americanas, embora isso seja menos evidente ao nível político, com divergências, por vezes, acentuadas, como ficou claro na questão do envio de carros de combate pesados, os MI Abrams, por decisão política da Adminisração Biden contrariando as indicações das chefias militares de topo que temem uma escalada grave e desnecessária no conflito.

Com ligações extensas ao meio académico norte-americano, às empresas privadas com maior exposição internacional e ao Pentágono, a RAND, num documento de análise elaborado por Samuel Charap e Miranda Priebe, nota que a discussão em torno do conflito no leste europeu já está numa fase onde a questão essencial é "como é que vai acabar", o que é um tiro em cheio na estratégia até aqui seguida pela Casa Branca e contradiz a posição de envio dos veículos pesados de combate, embora esta decisão tenha sido acompanhada de um conjunto alargado de travões que garantem que só em finais do ano é que as lagartas do M1 chegam ao campo de batalha.

O argumento vai mais longe e aponta para a ideia de que um conflito com uma duração superior ao previamente estimado, para o qual pode contribuir o envio de tanques pesados, como os norte-americanos M1 Abrams, mas, ainda mais importantes, os alemães Leopard-2, não é do interesse de Washington, sendo esse interesse melhor servido evitando a sua extensão artificialmente à qual se junta o risco de escalada.

"Os custos e os riscos de uma guerra longa na Ucrânia são significativos e passam largamente os eventuais benefícios desta trajectória para os EUA", dizes os autores do texto, acrescentando que "não está nas mãos apenas de Washington definir o fim da linha çara este conflito" embora possa determinar passos que "conduzam a um fim negociado para as hostilidades".

Uma das razões pelas quais o estudo aponta para a importância de os EUA poderem acelerar as etapas conducentes a uma solução negociada é que, actualmente, "ucranianos e russos têm razões para estarem optimistas sobre uma vitória militar e pessimistas sobre as implicações de uma paz negociada".

O caminho que os EUA devem seguir, segundo estes autores é o de salientar as ferramentas com que Washington poderá ajudar Kiev no pós conflito, criar um conjunto de compromissos com a Ucrânia sobre segurança, gerar garantias para a neutralidade ucraniana e definir etapas para o alívio das sanções a Moscovo.

Estas perspectivas de ganhos consideráveis com a criação de condições para a paz têm uma tradução clara no título do documento de análise: "Evitar uma guerra longa: A Política norte-americana e a Trajectória do Conflito Rússia-Ucrânia", notando logo a abrir a prosa extensa e densa que este conflito no leste europeu é o mais importante em décadas entre países e as suas consequências futuras vão ser severas para Washington, especialmente no que toca ao seu potencial de danificar os interesses estratégicos dos EYA no médio e longo prazo.

No entanto, o documento também adverte para o perigo de interromper o apoio dos norte-americanos a Kiev porque isso levaria ao imediato colapso do regime de Zelensky, mas a sua intensificação permite verificar um aumento no risco de uma degradação da situação em direcção a um conflito nuclear envolvendo a NATO e a Federação Russa.

Esta análise choca de frente, no entanto, com a posição de um alto quadro da NATO, Rob Bauer, o presidente do Comité da Aliança Militar, que disse que a organização está "pronta para uma guerra com a Rússia".

O oficial explicou que essa preparação resulta da colocação de forças extraordinárias na fronteira leste da NATO num contexto de pré-guerra na Ucrânia, e isso garante uma resposta efectiva se os russos atacarem algum dos membros da Aliança Atlântica, coisa que até agora nenhum governante russo disse que estaria em cima da mesa como possibilidade.

Alemanha não permitirá guerra aberta entre Rússia e NATO

Depois da polémica trapalhada da sua ministra dos Negócios Estrangeiros, Annalena Baerbock, onde esta, no Parlamento Europeu admite, claramente, que a Alemanha e a União Europeia estão em guerra com a Rússia, o seu chefe, o chanceler Olaf Scholz veio a público metê-la no lugar, afirmando que a posição oficial de Berlim é que não será tolerada a eclosão de uma guerra com os russos.

"A Alemanha não permitirá que a guerra na Ucrânia se transforme num conflito entre a Rússia e a NATO", disse Scholz, acrescentando mesmo que o seu Governo, pelo contrário, contribuiu para que uma guerra não ocorresse entre a União Europeia e a Federação Russa.

"Uma guerra entre a Rússia a NATO não irá acontecer, porque nós vamos impedir que isso suceda com todo o nosso empenho", garantiu o chanceler, colocando na corda bamba a sua ministra chefe da diplomacia alemã.

Entretanto, com a cabeça a prémio...

... e com recompensa milionária, não no oeste selvagem mas no leste em guerra, são os carros de combate norte-americanos M1 Abrams e os alemães Leopar-2, cuja destruição garante ao autor do disparo uma recompensa milionária que vai se paga por uma empresa privada russa.

O primeiro destes tanques que for destruído garante ao autor do feito 70 mil dólares, sendo que os restantes que forem destruídos passam a valer "apenas" sete mil USD a quem fizer ir pelos ares um destes veículos, cujo custo de produção vai dos seis milhões USD (Lepard-2) aos 10 milhões USD para o M1 Abrams, se se incluírem os extras normais, como treino de tripulações e manutenção de rotina.

Os prémios pagos pela Fores, uma empresa ligada ao sector petroquímico russo, vai ainda mais longe e, se um dia os caças norte-americanos F-16 chegarem aos céus deste conflito, o que é altamente improvável porque isso seria o mesmo que inaugurar uma guerra entre a NATO e a Rússia, o primeiro que for abatido garante ao autor do "abate" mais de 200 mil USD, passando os restantes a valer por asa no chão 12 mil dólares.

Segundo o site da Russia Today, um canal público russo, também um conhecido actor russo, Ivan Okhlobystin, publicou nas redes sociais que cada tanque norte-americano M1 Abrams garante ao autor do disparo certeiro 1º milhões de rublos, o equivalente a 144 mil dólares.

Entre as ofertas já dadas como certas estão os 31 M1 dos EUA, mas que só devem chegar à Ucrânia em finais deste ano, enquanto a Alemanha, a Polónia e os Paises Baixos garantem 14 Leopar-2 cada um, entre outros envios de menor quantidade, como oito noruegueses, quatro do Canadá...

Isto, quando na frente de batalha mais intensa, na província de Donetsk, diariamente morrem centenas de militares de um e do outro lado, com os russos a conseguirem ligeiros ganhos de território, empurrando os ucranianos cada vez para mais perto do Rio Dniepre, o que seria uma etapa importante desta guerra, porque esse curso de água permitiria a Moscovo assegurar mais facilmente as suas posições mais avançadas.

A III GM...

... está claramente a caminho, defende o Presidente croata Zoran Milanovic, porque o conflito no leste europeu está a ser travado entre os EU, com apoio da NATO, e a Federação Russa, e "a menos que estejam em curso negociações secretas entre Moscovo e Washington, então o mundo está mesmo a aproximar-se de uma catástrofe inimaginável".

O Chefe de Estado croata, ainda a propósito das palavras insensatas da ministra alemã dos Negócios Estrangeiros, depois de ter alertado para o risco de uma guerra mundial a desenrolar-se à frente dos olhos de toda a gente, disse que, apesar de estar há muitos anos na política, "nunca tinha visto este tipo de loucura à solta".

Ironizando, disse, admitindo que a Alemanha esteja em guerra com a Rússia, desejou que Berlim se dê melhor agora que há 70 anos, quando, durante a II Guerra Mundial, as tropas de Adolf Hitler sofreu uma pesada derrota frente aos russos do Exército Vermelho, da então URSS, que levou ao fim do maior conflito a que a Humanidade alguma vez assistiu, com a morte de 100 milhões de pessoas entre 1939 e 1945.

E a paz...?

Com isto, a possibilidade de uma paz negociada entre Kiev e Moscovo parece agora cada vez mais distante, até porque o Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, disse agora numa entrevista à Sky News, que "o Presidente russo não é ninguém" e que com ele "não vale a pena falar", que não tem "nenhum interesse em falar com ele", isto, depois de ter feito aprovar legislação que torna ilegal qualquer conversa com o Kremlin.

Alias, anda esta semana, Zelensky chegou mesmo a dizer que duvida que Putin esteja vivo, sequer, admitindo mesmo que as imagens que surgem com o Presidente russo sejam manipulações com recurso a Inteligência Artificial.

Apesar de serem muitos os países que pedem a Moscovo que dê o passo na direcção da paz, como é o caso de Angola, o que voltou a acontecer agora, com a recente visita do MNE russo, Sergei Lavrov, o chefe da diplomacia russa voltou a dizer que esse passo foi dado várias vezes e que em Março de 2022 esteve mesmo para ser assinado um acordo, tendo Kiev voltado atrás por pressão ocidental de EUA e Reino Unido.

Isto acontece quando, horas depois de ser conhecida a decisão alemã e norte-americana de enviar tanques pesados para a Ucrânia, as forças russas, a partir do Mar Negro e de bombardeiros pesados, voltaram a atacar massivamente com misseis e drones dezenas de cidades ucranianas, incluindo a capital, com a destruição avultada de infra-estruturas eléctricas e vias rodoviárias e ferroviárias, embora Kiev garanta que a maior parte destes foram abatidos.

Esta vaga de misseis e drones lançados sobre a Ucrânia, mais uma de várias nos últimos dois meses, deixa claro que as informações divulgadas nos media ocidentais, a partir de fontes nos serviços secretos britânicos, de que a Rússia estava a gastar os últimos "cartuchos", são, na verdade, ligeiramente exageradas.

E, por fim, o aviso mais abrasivo feito ao ocidente pelo Kremlin, através do seu porta-voz, Dmitri Peskov: "O envio dos tanques é o envolvimento directo dos países ocidentais" nesta guerra. O que é que isso significa, só com o passar dos dias se perceberá, mas uma escalada é temida por muitos analistas militares, deixando o mundo mais perto de um incandescente conflito nuclear.

África "entra" na guerra

O Governo do Rei Mohammed VI, de Marrocos, decidiu escolher um lado da guerra e é o primeiro país africano a enviar equipamento de guerra para o conflito na Ucrânia, oferecendo duas dezenas de carros de combate pesados, T-72B, de fabrico soviético, a Kiev.

O envio dos 20 T-72B marroquinos para a Ucrânia tem um forte valor simbólico porque poderá abrir um novo corredor de material de guerra para o conflito no leste europeu, visto que em África existem largas dezenas de milhares de veículos blindados adquiridos ao longo dos anos à então União Soviética, e também já depois, à Federação Russa.

Até 1991, com a consolidação do colapso da ex-URSS, a maior parte dos países africanos eram grandes clientes da indústria militar de Moscovo, tendo depois continuado, mas já enquanto Federação Russa ou CEI (Comunidade de Estados Independentes), o que levou a que fosse concentrado um grande volume de viaturas, sejam os carros de combate ou viaturas blindadas de transporte de tropas.

Agora, no que já está a acontecer, alguns países aliados de Kiev têm estado a adquirir equipamento de guerra em África, desde munições de calibre 152 mm, padrão soviético, até peças de artilharia e viaturas, mas, segundo a informação disponível, sempre por terceiros e com o objectivo deste ser oferecido para alimentar o esforço de guerra de Kiev.

Mas o envio dos 20 carros de combate pesados de fabrico russo, que eram os mais avançados até ao colapso da URSS, e que constituem ainda a espinha dorsal das unidades blindadas ucranianas, por Rabat, surge como a primeira vez que um Estado africano toma a iniciativa de disponibilizar apoio directo a um dos intervenientes neste conflito.

Marrocos, ao contrário da vizinha Argélia, que mantém uma ligação mais sólida e próxima com a Rússia, desde há muito que se posiciona ao lado do ocidente, e esteve mesmo, segundo a imprensa marroquina, presente na reunião recente do denominado Grupo de Contacto para a Ucrânia, composto por cerca de 50 países, maioritariamente da NATO e da União Europeia, na base aérea norte-americana de Ramstein, na Alemanha, para relançar o apoio a Kiev.

No entanto, estas viaturas, só vão chegar à frente de combate na guerra Rússia/Ucrânia depois de uma requalificação profunda na República Checa, porque, segundo avança o site ucraniano Defense Express, as Forças Armadas marroquinas, que adquiriram estes veículos, em 1999 e 2000, à Bielorrússia, não foram capazes de os manter operacionais, sendo bastante profunda a sua deterioração.

Estes "tanques" foram adquiridos por Rabat na perspectiva de contenção das forças argelinas a norte, numa altura, que actualmente se repete, em que os dois países viviam momentos de forte tensão e estava iminente um conflito.

No entanto, segundo publicações especializadas na área da defesa, os EUA e a Holanda têm em curso um programa de compra de quase 100 unidades T-72B para enviar para Kiev, existindo fortes evidências de que estes estejam a ser adquiridos em países africanos com disponibilidade abundante deste tipo de equipamento devido aos prolongados e violentos conflitos internos em que estiveram envolvidos e que, agora, têm, com estes, uma grande e permanente despesa de manutenção.

Alguns países africanos nestas circunstâncias podem mesmo aproveitar este conflito europeu para se verem livres de algum material de guerra, incluindo carros de combate de diversos tipos, do qual já não precisam e que estão em vias de se tornarem obsoletos, podendo amortizar algum do investimento feito, nalguns casos, há mais de três décadas.

Contexto da guerra na Ucrânia

A 24 de Fevereiro de 2022 as forças russas iniciaram a invasão da Ucrânia por vários pontos, tendo o Presidente russo dito que se tratava de uma "operação militar especial", sublinhando que o objectivo não era (é) a ocupação do país vizinho, condição que evoluiu depois para a anexação de territórios no Donbass mas também as regiões de Kherson e Zaporijia, mas sim a sua desmilitarização e desnazificação e assegurar que Kiev não insiste na adesão à NATO, o que Moscovo considera parte das suas garantias vitais de segurança nacional.

O Kremlin critica há vários anos fortemente o avanço da NATO para junto das suas fronteiras, agregando os antigos membros do Pacto de Varsóvia, organização que também colapsou com a extinção da URSS, em 1991.

Moscovo visa ainda garantir o reconhecimento de Kiev da soberania russa da Península da Crimeia, invadida e integrada na Rússia, depois de um referendo, em 2014, e ainda a independência das duas repúblicas do Donbass, a de Donetsk e de Lugansk, de maioria russófila, que o Kremlin já reconheceu em Fevereiro, tendo acrescido a esta reivindicação as províncias de Kherson e Zaporijia, depois da realização de referendos que a comunidade internacional, quase em uníssono, não reconhece.

Do lado ucraniano, a visão é totalmente distinta e Putin é acusado de estar a querer reintegrar a Ucrânia na Rússia como forma de reconstruir o "império soviético", que se desmoronou em 1991, com o colapso da União Soviética.

Kiev insiste que a Ucrânia é una e indivisível e que não haverá cedências territoriais como forma de acordar a paz com Moscovo, sendo, para o Presidente Volodymyr Zelensky, essencial o continuado apoio militar da NATO para expulsar as forças invasoras.

A organização militar da Aliança Atlântica está a ser, entretanto, acusada por Moscovo de estar a desenrolar uma guerra com a Rússia por procuração passada ao Exército ucraniano, o que eleva, segundo o ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Sergei Lavrov, o risco de se avançar para a III Guerra Mundial, com um confronto directo entre a Federação Russa e a NATO, que tanto o Presidente dos EUA, Joe Biden, como o Presidente Vladimir Putin, da Rússia, já admitiram que se isso acontecer é inevitável o recurso ao devastador arsenal nuclear dos dois lados desta barricada que levaria ao colapso da humanidade tal como a conhecemos.

Esta guerra na Ucrânia contou com a condenação generalizada da comunidade internacional, tendo a União Europeia e a NATO assumido a linha da frente da contestação à "operação especial" de Putin, que se materializou através de bombardeamentos das principais cidades, por meio de ataques aéreos, lançamento de misseis de cruzeiro e artilharia pesada, e com volumosas colunas militares a cercarem os grandes centros urbanos do país, mas que agora está concentrada no leste e sudeste da Ucrânia.

Na reacção, além da resistência ucraniana, Moscovo contou com o maior pacote de sanções aplicadas a um país, que está a causar danos avultados à sua economia, sendo disso exemplo a queda da sua moeda nacional, o rublo, que chegou a ser superior a 60%, embora já tenha, entretanto, recuperado.

Estas sanções, que já levaram as grandes marcas mundiais a deixar a Rússia, como as 850 lojas da McDonalds, a mais simbólica, abrangem ainda os seus desportistas, artistas, homens de negócios, a banca e grande parte das suas exportações, ficando apenas de fora o sector energético, do gás natural e em pate do petróleo...

Milhares de mortos e feridos e mais de 5,5 milhões de refugiados nos países vizinhos da Ucrânia são a parte visível deste desastre humanitário.

O histórico recente desta crise no leste europeu pode ser revisitado nos links colocados em baixo, nesta página.