Moscovo enviou um pedido de investigação urgente às Nações Unidas para que as imagens, alegadamente feitas na pequena cidade de Makeyevka, na região de Lugansk, sejam aceites como provas documentais de um "bárbaro crime de guerra" perpetrado pelas forças ucranianas.
Nesse vídeo, altamente perturbante, podem ver-se vários soldados russos deitados no chão, uns, e outros em movimento em direcção ao solo, em clara posição de rendição, que são, posteriormente, abatidos à queima-roupa, com tiros na cabeça.
O New York Times refere, todavia, depois de confirmar que não se trata de um "fake", que a morte destes soldados em condições desumanas, é, possivelmente, resultado, segundo fontes ucranianas, dos disparos realizados contra os soldados ucranianos por um dos russos, ficando por esclarecer como é que soldados claramente dominados e desarmados puderam ripostar abrindo fogo contra os captores.
Este vídeo irrompeu nos media e nas redes sociais com grande aparato, abrindo um debate sobre o alegado comportamento bárbaro das forças sob comando do Presidente Volodymyr Zelensky, que sempre se colocou como o rosto de um país que se defende com vigor dos invasores mas que respeita os Direitos Humanos, contrastando com as persistentes acusações da Federação Russa de que as forças ucranianas cometeram inúmeros crises de guerra contra civis e militares russos ou das regiões independentistas do Donbass, desde 2014, ano em que foi anexada a Crimeia à Federação Russa.
Face à refutação de Kiev às acusações de Moscovo sobre crimes de guerra realizados pelos seus militares neste vídeo - embora não seja a primeira vez que são mostrados este tipo de crimes ucranianos em imagens -, o Ministério dos Negócios Estrangeiros russo já exigiu à ONU a abertura de um rigoroso processo de investigação a estas imagens para tirar dúvidas.
Até porque as imagens mostram, num primeiro momento, os soldados russos dominados e deitados no chão, e, num momento posterior, já mortos com tiros na cabeça, faltando preencher a lacuna entre estes dois momentos, sendo facto que se trata de russos dominados por ucranianos armados.
Mas é igualmente verdade, segundo o NYT, que este vídeo foi divulgado entre as redes sociais ucranianas para glorificar a coragem e os avanços das forças ucranianas em território que estava sob domínio dos russos, tendo depois chegado aos restantes utilizadores, permitindo que chegasse ao conhecimento de Moscovo, o que levou à exigência de análise por parte das Nações Unidas.
Se se vier a provar aquilo que parece ser mais provável a partir destas imagens, em causa está uma acto bárbaro e claramente punido pela lei internacional como crime de guerra.
Entretanto, o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, já veio a público garantir que a Rússia vai "fazer tudo para encontrar e punir" os autores deste "crime de guerra" e as Nações Unidas pediram a Kiev para investigar, o que não caiu bem em Moscovo porque é como investigar em causa própria, ao contrário do que a ONU faz quando é a Rússia a ser acusada de crimes semelhantes, criando para o efeito equipas de peritos internacionais para investigar.
Central nuclear voltou a ser atacada
A central nuclear de Zaporijia, na província com o mesmo nome que a Rússia considera agora parte do seu território, voltou a ser bombardeada por mais de uma dezena de projecteis de grande calibre, tendo alguns caído a escassos metros dos seis reactores que compõem aquela que é a maior central nuclear da Europa.
Embora Moscovo tenha rapidamente acusado as forças ucranianas dos disparos, até porque seria pelo menos anormal que a Rússia atacasse um local que tem sob seu controlo desde Março, Kiev recusa a autoria e acusa Moscovo de estar a atacar a central nuclear onde as forças russas estão há mais de oito meses.
E ali estão igualmente há cerca de dois meses técnicos da Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA), o que permite a este organismo da ONU ter uma ideia aproximada, pelo menos, da direcção original destes ataques, visto que as posições militares de um e outro lado estão bem definidas actualmente no terreno, sem grandes avanços.
Mas, para já, Rafael Grossi, o director-geral da AIEA, recusa fazer qualquer juízo sobre a autoria destes perigosos disparos contra a maior central nuclear da Europa, estando em curso uma investigação.
Tratando-se de obuses de grande calibre, segundo alguns analistas, tanto a NATO como os EUA possuem ferramentas tecnológicas para determinar a sua posição de origem. Até ao momento não houve qualquer posição por parte de países da Aliança Atlântica.
EUA congelam ímpeto em direcção à paz
Entretanto, depois de quase duas semanas de sucessivas notícias que levaram o mundo a admitir que a paz estava ao virar da esquina, tendo sido conhecidas as conversações secretas entre os EUA e a Rússia, depois de se saber que vários países ocidentais pressionaram Kiev a redireccionar as suas energias para uma solução dialogada, eis que de Washington, pela voz do Secretário da Defesa, Lloyd Austin, vem um balde de água fria... inesperado.
Ainda mal desfeita está a polémica do míssil ucraniano que caiu na Polónia e esteve quase aumentar de forma até aqui nunca vista a fricção NATO/Rùssia, por Kiev reafirmar, até hoje, que se tratou de um ataque russo a um país da NATO, sabendo tratar-se de um dos seus projectéis, procurando assim uma escalada inimaginável neste conflito, e já Washington volta a desfazer a teia para um acordo de paz que vinha a ser tecida com a participação activa de... Washington.
Isto, porque, depois de o general Mark Milley, o comandante das Forças Armadas dos EUA, ter dito publicamente, há menos de uma semana, que é tempo de os ucranianos aproveitarem o caminho que está a ser aberto para a paz, eis que Lloyd Austin, o Secretário da Defesa da Administração Biden, vem remar contra a maré que estava subir garantindo que os EUA vão dar todo o apoio militar a Kiev até que os russos sejam todos expulsos do território ucraniano reclamado por Zelensky.
Austin foi citado em Washington, pelo próprio Departamento de Defesa, a 16 de Novembro, que "os EUA vão apoiar a Ucrânia durante o tempo que for preciso", sublinhando que os militares ucranianos "estão a lutar com mais coragem que nunca e com cada vez mais capacidades" e que se sucedem as vitórias sobre os russos.
Contexto da guerra na Ucrânia
A 24 de Fevereiro as forças russas iniciaram a invasão da Ucrânia por vários pontos, tendo o Presidente russo dito que se tratava de uma "operação militar especial", sublinhando que o objectivo não é a ocupação do país vizinho, condição que evoluiu depois para a anexação de territórios no Donbass mas também as regiões de Kherson e Zaporijia, mas sim a sua desmilitarização e desnazificação e assegurar que Kiev não insiste na adesão à NATO, o que Moscovo considera parte das suas garantias vitais de segurança nacional.
O Kremlin critica há vários anos fortemente o avanço da NATO para junto das suas fronteiras, agregando os antigos membros do Pacto de Varsóvia, organização que também colapsou com a extinção da URSS, em 1991.
Moscovo visa ainda garantir o reconhecimento de Kiev da soberania russa da Península da Crimeia, invadida e integrada na Rússia, depois de um referendo, em 2014, e ainda a independência das duas repúblicas do Donbass, a de Donetsk e de Lugansk, de maioria russófila, que o Kremlin já reconheceu em Fevereiro, tendo acrescido a esta reivindicação as províncias de Kherson e Zaporijia, depois da realização de referendos que a comunidade internacional, quase em uníssono, não reconhece.
Do lado ucraniano, a visão é totalmente distinta e Putin é acusado de estar a querer reintegrar a Ucrânia na Rússia como forma de reconstruir o "império soviético", que se desmoronou em 1991, com o colapso da União Soviética.
Kiev insiste que a Ucrânia é una e indivisível e que não haverá cedências territoriais como forma de acordar a paz com Moscovo, sendo, para o Presidente Volodymyr Zelensky, essencial o continuado apoio militar da NATO para expulsar as forças invasoras.
A organização militar da Aliança Atlântica está a ser, entretanto, acusada por Moscovo de estar a desenrolar uma guerra com a Rússia por procuração passada ao Exército ucraniano, o que eleva, segundo o ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Sergei Lavrov, o risco de se avançar para a III Guerra Mundial, com um confronto directo entre a Federação Russa e a NATO, que tanto o Presidente dos EUA, Joe Biden, como o Presidente Vladimir Putin, da Rússia, já admitiram que se isso acontecer é inevitável o recurso ao devastador arsenal nuclear dos dois lados desta barricada que levaria ao colapso da humanidade tal como a conhecemos.
Esta guerra na Ucrânia contou com a condenação generalizada da comunidade internacional, tendo a União Europeia e a NATO assumido a linha da frente da contestação à "operação especial" de Putin, que se materializou através de bombardeamentos das principais cidades, por meio de ataques aéreos, lançamento de misseis de cruzeiro e artilharia pesada, e com volumosas colunas militares a cercarem os grandes centros urbanos do país, mas que agora está concentrada no leste e sudeste da Ucrânia.
Na reacção, além da resistência ucraniana, Moscovo contou com o maior pacote de sanções aplicadas a um país, que está a causar danos avultados à sua economia, sendo disso exemplo a queda da sua moeda nacional, o rublo, que chegou a ser superior a 60%, embora já tenha, entretanto, recuperado.
Estas sanções, que já levaram as grandes marcas mundiais a deixar a Rússia, como as 850 lojas da McDonalds, a mais simbólica, abrangem ainda os seus desportistas, artistas, homens de negócios, a banca e grande parte das suas exportações, ficando apenas de fora o sector energético, do gás natural e em pate do petróleo...
Milhares de mortos e feridos e mais de 5,5 milhões de refugiados nos países vizinhos da Ucrânia são a parte visível deste desastre humanitário.
O histórico recente desta crise no leste europeu pode ser revisitado nos links colocados em baixo, nesta página.