Quem esperava um Donald Trump mais cordato e simpático, "modalidades" essenciais para dar substância à sua decisão de redireccionar a sua atitude política de guerreiro com uma causa única, fazer a "América Great Again", para a união da Federação, foi quase. quase tempo perdido.
É verdade que ele começou a falar, do púlpito da convenção no Milwaukee, na madrugada desta sexta-feira, hora de Luanda, fim de tarde de quinta-feira pela hora local, da razão para as expectativas de que ali estivesse um homem novo, por causa da bala que por dois centímetros não lhe ceifou a vida.
Descreveu o momento exaustivamente e o machado de guerra parecia mesmo enterrado, voltando à já estafada menção ao facto de poder não estar ali naquele momento se a vontade "providencial" do "Deus todo poderoso" não lhe tivesse forçado um ligeiro inclinar da cabeça para a tirar da linha de fogo, passando a bala de raspão na sua orelha direita.
Mas foi sol que pouco durou, porque de seguida passou à versão bem mais familiar, e menos trabalhosa para os jornalistas presentes, a quem os dedos teimavam em fugir das teclas que servem para escrever simpatia e cordialidade a sair da boca do antigo Presidente e agora candidato oficial dos republicanos.
Ainda tentou dizer que é o candidato "para todos os americanos, não para metade dos americanos", isto, porque o homem que mais se esforçou para dividir o país entende, afinal, que "não há vitória nenhuma em ganhar apenas metade do país".
Mas os 90 minutos de discurso tinham muito mais que este quase. quase novo homem saído do atentado falhado à sua vida no passado Sábado.
Antes de voltar ao momento em que chamou "maluca" a Nancy Pelosi, a antiga líder democrata na Câmara dos Representantes, a Câmara baixa do Congresso dos EUA, ou voltar a falar do "roubo" de que foi alvo nas eleições de 2020, se o leitor não se importar, vamos ao realmente importante nas suas palavras, que são as palavras não de Trump mas do próximo Presidente dos EUA, ou quase. quase Presidente dos Estados Unidos.
A guerra na Ucrânia e o conflito em Gaza, a partir de Janeiro de 2025, quando tomará posse se se confirmar a vitória nas eleições de 05 de Novembro, têm mesmo os dias contados... e nisso está certo, porque sem o dinheiro e as armas norte-americanas, nem ucranianos nem israelitas conseguem manter os esforços de guerra em curso.
"Vou acabar com todas as crises internacionais que Joe Biden permitiu, incluindo a guerra na Ucrânia, e a guerra causada pelo ataque a Israel, que jamais teriam acontecido se eu fosse presidente", garantiu.
Disse, como feroz apoiante de Israel, que este país sofreu um terrível ataque a 07 de Outubro de 2023, apontou o dedo à China, que tem Taiwan cercada e lembrou que os russos têm uma armada estacionada em Cuba, disparando, como tanto gosta, contra os jornalistas, que diz não estarem interessados em falar dos submarinos de Moscovo a pouco mais de 100 kms da costa dos EUA.
Ameaçou o Hamas para um castigo inimaginável se não soltarem os reféns israelitas em Gaza, mas reafirmou que a sua vitória significará o fim de anos de guerra, acabará a fraqueza dos EUA e o caos está condenado a extinguir-se.
Esta foi a parte do seu discurso dedicado ao resto do mundo, que não é pouca coisa, mesmo que nada tenha de novo.
Voltando à política interna dos EUA, Trump puxou a culatra atrás, apontou aos democratas, e, como nos tinha habituado durante anos a fio, disparou sem piedade, e sem vergonha, exigindo, provavelmente na condição de "renascido" após o atentado, comparando-se à figura de Cristo, que a actual Administração democrata, que diz ser uma vergonha, pugne pelo fim dos múltiplos processos judiciais que enfrenta.
Isto, como notou, "se é verdade que os democratas querem mesmo unificar o novo país".
Antes de subir ao púlpito, a informação que existia era que tinha, após o atentado, reescrito o discurso para esta noite, num tom mais cordato e simpático, mas pouco depois de ter começado, afastou-se do guião.
Chamou "maluca" à ex-líder dos Representantes, Nancy Pelosi, de 84 anos, reatou as acusações de que Joe Biden lhe roubou a vitória em 2020, prometendo que "isso não voltará a acontecer", dê por onde der, porque "eles" aproveitaram a pandemia de Covid "para a falcatrua eleitoral".
"Sou eu que vou salvar a democracia neste país, sou eu que vou salvar a democracia para o povo", disse, porque... emergindo da sua natureza truculenta não como uma Fénix, mas como o real Trump, atacou Biden com força: "Se pensarem nos dez piores Presidentes dos Estados Unidos, os dez piores de todos, todos eles juntos não fizeram tanto mal ao país como Joe Biden".
Como esperado nestas circunstâncias, neste discurso de entronização, e na condição de quase. quase Presidente eleito, como todas as sondagens apontam, especialmente depois do atentado falhado, Donald Trump passou em revista todos os seus grandes temas de eleição e confirmou o que já se sabia.
Vai acabar com a imigração ilegal, os EUA vão deixar cair todas as restrições à extracção de petróleo e gás, mesmo as que procuram limitar as mais poluentes, em Washington, as questões de política externa vão passar para segundo, ou terceiro, plano, havendo mesmo uma indicação que permite alimentar a ideia de um país fechado sobre si mesmo, ao dizer que vai erguer uma gigantesca "cúpula de ferro" anti-míssil em torno dos Estados Unidos para garantir a sua segurança.
E sobre aquilo que diz respeito a África, continente que voltou a estar no radar de Washington durante a Presidência de Joe Biden, com o regresso quase, quase certo de Trump à Casa Branca, deixará de estar... pelo menos na cabeça de Donald Trump já não está... porque nunca esteve.
O que está agora mas nunca esteve foi a aposta na menção a todas as etnias presentes na sociedade norte-americana, referindo que estará "com amizade" ao lado de asiáticos, afro-americanos, hispânicos... para erguer "uma América tão grande que o mundo nunca viu nada igual".