Face à excruciante soma diária de mortos entre civis, já vai nos 33 mil, mais de 14 mil crianças, os aliados ocidentais de Israel, com os EUA à frente, têm aumentado o tom das críticas ao Governo de Benjamim Netanyhau, mas deixar de enviar armas é que parece ser mais difícil.
No entanto, o recente e indiscriminado ataque à equipa de voluntários da World Central Kitchen (WCK), a organização humanitária com sede nos EUA, que fornece milhares de refeições por dia à população esfomeada de Gaza, pode mudar de forma impactante esta realidade.
O Presidente norte-americano tem vindo a aumentar o volume das críticas a Benjamin Netanyhau mas sem que isso tenha sido sentido em Telavive porque a artilharia, os misseis e os aviões com que Israel devasta Gaza há seis meses são todos Made in USA...
"Israel não está a fazer o suficiente para proteger os trabalhadores das organizações humanitárias", avisou Joe Biden, que pede ainda uma "investigação rápida e independente" que determine a responsabilidade pela morte de sete voluntários na terça-feira.
A morte de trabalhadores voluntários em Gaza não é algo novo nestes seis meses de invasão militar israelita, porque só nas agências da ONU já foram mortos mais de 130 pessoas que se dedicavam a apoiar a população civil.
O que levou à alteração das reacções ocidentais foi o facto de entre os sete mortos estarem norte-americanos, australianos, britânicos, polacos e canadenses, o que levou os governos destes países a agudizarem as acusações a Telavive.
Alias, o volume das reacções foi de tal monta que em Israel nem foi preciso concluir o inquérito que tinha sido anunciado pelo primeiro-ministro Benjamin Netanyhau para que o comandante das Forças de Defesa de Israel (IDF) ter vindo a público admitir a autoria.
O general Herzi Halevi pediu "desculpa pelo trágico incidente" e admitiu que se tratou de um erro cometido em condições de guerra complexas e de noite, o que levou os autores do ataque a confundir os voluntários humanitários da World Central Kitchen com combatentes do Hamas.
Os sete voluntários da WCK foram mortos com um drone israelita, fazendo com que, finalmente, o Presidente dos EUA tenha vindo publicamente reconhecer que o conflito em Gaza está a ser um dos piores de sempre para os trabalhadores e voluntários humanitários.
London calling...
Outro dos maiores aliados de Israel, o Reino Unido, que fornece além de material militar, apoio diplomático ilimitado há décadas, também engrossou a voz para Benjamin Netanyhau, com o primeiro-ministro Rishi Sunak a exigir mais para proteger civis e equipas humanitárias.
Esta reacção não surge devido à insustentável mortandade entre voluntários e trabalhadores humanitários mortos nestes seis meses, que já são mais de 130, surge porque entre os sete mortos pelo drone israelita na caravana da WCK estão três britânicos.
Dizendo que ficou "horrorizado" com este ataque, Sunak sublinhou que a situação não pode continuar porque a densidade e volume das vítimas civis e entre os voluntários humanitários e trabalhadores deste sector "é insustentável".
"O Reino Unido espera ver imediatamente uma acção israelita no sentido de travar as restrições ao trabalho humanitário, das ONG"s e da ONU, proteger os civis e reparar as infra-estruturas vitais como hospitais e redes de saneamento e água", aponta o Governo de Londres.
Tensão cresce nas ruas... de Telavive
Este ataque sem justificação das IDF à caravana humanitária da WCK lançou novo ímpeto às manifestações que diariamente decorrem nas ruas de Telavive e de Jerusalém contra o Governo de Netanyhau, a ponto de a intelligentsia interna, o Shin Bet, recear situações descontroladas.
Após mais uma noite de intensas e agressivas manifestações nas imediações da casa de Netanyhau, o chefe deste serviço de segurança interna israelita sentiu-se na necessidade de vir a terreiro advertir para que a linha entre o protesto e o ataque ao primeiro-ministro é ténue mas clara.
"Os discursos violentos anti-Governo nas redes sociais e as cenas que foram vistas em Jerusalém e noutras cidades do país são muito para lá do razoável protesto e estão no círculo da desordem e da violência", avisou Ronen Bar.
Naquilo que é um claro alerta para a possibilidade de a situação ficar fora de controlo, até porque as manifestações populares em Israel, mesmo que não sejam noticiadas pelos media ocidentais, têm crescido em intensidade e número, Bar alertou que as forças da ordem vão agir em conformidade se os ânimos não amainarem.
WCK exige fim da mortandade
Também o líder da World Central Kitchen, o "chef" espanhol José Andrés, manifestou-se através de uma nota publicada nos media israelitas onde considera, ao contrário das chefias militares israelitas, que o ataque não foi "um infeliz erro".
"O ataque aéreo que devastou a nossa caravana não foi um infeliz erro provocado pelo nevoeiro da guerra. Foi um ataque directo a veículos que estavam identificados e num local sobre o qual as IDF tinham sido informados", enfatizou.
"É ainda o resultado directo da política do primeiro-ministro Benjamin Netanyhau para reduzir a ajuda humanitária para níveis desesperados", disse ainda José Andrés, dando assim corpo às acusações persistentes de que a fome é uma arma de guerra que está a ser usada por Israel.
E apontou, citado pela Al Jazeera, num ferrar claro na responsabilidade de Netanyhau e no seu agressivo elenco governativo, que é o mais radical de sempre, tanto ideologicamente como religiosamente: "Israel é melhor do que a forma como esta guerra está a ser conduzida".
"Israel é melhor que os bloqueios à ajuda alimentar e os medicamentos para os civis; é melhor que os que matam trabalhadores humanitários", acrescentou dizendo ainda que Israel "tem de abrir rotas humanitárias seguras imediatamente".
"Israel em de parar de matar civis e voluntários humanitários hoje. Tem de começar a caminhada para a paz, hoje!", concluiu o fundador da World Central Kitchen.