Mais de 11 milhões de documentos “escaparam” da firma Mossack Fonseca, com sede no Panamá, e foram parar às mãos do Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação (ICIJ – sigla em inglês), que, no Domingo, deu início à sua divulgação, como o online do Novo Jornal também noticiou logo que foi conhecido o escândalo, despoletando reacções em todo o mundo, incluindo alguns visados.

O jornal português Diário de Notícias refere que o ministro angolano dos Petróleos, Botelho de Vasconcelos, surge referenciado nos documentos divulgados no Domingo, embora sem especifiar pormenores sobre a sua utilização dos serviços da firma Mossack Fonseca. Angola, a par de Portugal, com o nome de um empresário, e o Brasil, com diversas figuras relacionadas com o caso Lava Jato, são os únicos países lusófonos apontados.

Já o francês Le Monde atribui a Vasconcelos a propriedde de uma empresa, a Medea Investments Limited, detentora de um milhão de dólares em acções ao portador, sem, contudo, referir qualquer origem do dinheiro, sublinhando, contudo, que as acções ao portador são, normalmente usadas para que não seja possível averiguar a propriedades destas.

O Le Monde diz ainda que tentou, sem sucesso, ouvir o governante angolano.

A Mossack Fonseca, firma panamiana, especialista na gestão de capitais e patrimónios, de onde partiu a fuga de informação, através do seu director, Ramon Fonseca, afirma tratar-se de "um crime, um delito e um ataque" contra o Panamá.

Para Fonseca, de 64 anos, "há duas maneiras de ver o mundo. A primeira é ser competitivo e a segunda criar mais impostos", acrescentando que “há uma guerra entre os países abertos, como o Panamá, e os países que cobram cada vez mais impostos às empresas e cidadãos".

De acordo com a imprensa, a Mossack Fonseca comunicou aos clientes ter sido alvo de um ataque informático, que poderá ter afectado os seus dados.

"Os documentos mostram que os bancos, as firmas de advogados e outros actores que operam em paraísos fiscais esquecem-se frequentemente da obrigação legal de verificar se os seus clientes não estão implicados em empresas criminais", afirmou o Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação que coordenou a investigação.

Também o Governo do Panamá reagiu, garantindo que "vai cooperar" com a justiça, em caso de abertura de processo judiciário, e vai "cooperar vigorosamente" com todos os Estados sempre que se detectarem provas legais de fuga ao fisco de qualquer um dos visados nos documentos, assegurando um "comprometimento total com a transparência" e "tolerância zero" para qualquer delito.

A França reage

A França é um dos países mais visados e o seu Presidente, François Hollande, assegurou hoje, segundo a Lusa, que as revelações de uma investigação internacional sobre os paraísos fiscais levarão à abertura de inquéritos em França e agradeceu aos denunciantes, congratulando-se com novas “receitas fiscais”.

“Todas as informações que forem entregues resultarão em inquéritos dos serviços fiscais e em processos judiciais”, declarou Hollande.

O presidente francês considerou ser “uma boa notícia” o “conhecimento dessas revelações” porque “dará ainda receitas fiscais por parte de quem tem defraudado”, sublinhando que em 2015 “20 mil milhões de euros foram notificados a quem defraudou” e que, deste total, o Estado “já recuperou 12 mil milhões de euros”.

“Por isso, agradeço aos denunciantes, agradeço à imprensa que se mobilizou e não tenho dúvidas de que os nossos investigadores estão prontos para estudar estes dossiers e casos em prol primeiro do que pensamos ser a moral e também em defesa das nossas finanças públicas”, disse ainda.

Hollande insistiu que os “denunciantes fazem um trabalho útil para a comunidade internacional” e “correm riscos”, pelo que “devem ser protegidos”.

A Bélgica, México e Costa Rica juntaram-se à Austrália e Panamá na intenção se verificar de existem delitos fiscais nos respectivos países no caso "Documentos do Panamá", na sequência de uma investigação jornalística internacional.

Em Bruxelas, o ministro das Finanças da Bélgica, Johan Van Overtveldt, assumiu estar "muito impressionado" com o "escândalo" e criou uma comissão especial para investigar eventuais fugas de impostos de pelo menos 732 cidadãos belgas.

Segundo o jornal Le Soir, entre os belgas mencionados figuram artistas, aristocratas e herdeiros de patrimónios familiares, médicos, farmacêuticos, contabilistas, líderes do setor têxtil, académicos e personalidades dos mundos da comunicação, negócio de diamantes e da indústria.

A maior investigação jornalística da história, dada a conhecer na noite de Domingo, envolvendo o ICIJ, com sede em Washington, destaca os nomes de 140 políticos e funcionários de todo o mundo, entre eles 12 antigos e atuais líderes mundiais.

A investigação juntou cerca de 11,5 milhões de documentos ligados a quase quatro décadas de actividade da empresa panamiana Mossack Fonseca, especializada na gestão de capitais e de património, com informações sobre mais de 214 mil empresas "offshore" em mais de 200 países e território.

Na Cidade do México, e num comunicado, o Governo mexicano indicou que vai investigar os dados de um número não avançado de personalidades e empresas mexicanas aparentemente envolvidas.

No entanto, sabe-se que, entre as personalidades mexicanas figuram Juan Armando Hinojosa, dono do Grupo Higa, e que também já esteve envolvido no escândalo do "Caso Casa Branca", que envolveu o presidente Enrique Pena e respectiva mulher, Angélica Rivera, bem como o presidente da TV Azteca, Ricardo Salinas.

Também o Governo da Costa Rica vai investigar os nomes de personalidades e de empresas costa-riquenhas que surgem na lista para determinar eventuais fugas de impostos, mas o número de envolvidos não foi adiantado.

Antes, a Austrália indicou estar a investigar 800 cidadãos por possíveis evasões tributárias após a divulgação da lista de nomes, alegadamente envolvidos em esquemas de corrupção com “offshores”.

Platini nega tudo

O presidente suspenso da UEFA, Michel Platini, apontado como proprietário de uma sociedade “offshore” no Panamá, garantiu hoje que tem a sua situação fiscal regularizada com o fisco suíço.

O nome de Platini, suspenso por seis anos de toda a actividade ligada ao futebol devido a um escândalo de corrupção, figura na lista divulgada no Domingo.

Os advogados do antigo futebolista francês garantiram, em comunicado, que “a totalidade de contas e bens” de Michel Platini “estão declarados à administração fiscal da Suíça, país no qual Platini tem residência fiscal desde 2007”.

Segundo o jornal Le Monde, Platini é o único administrador da Balney Entreprises Corporation, uma sociedade “offshore” criada em 2007, 11 meses depois de eleição de Platini para a presidência da UEFA, da qual está agora