Para ter uma noção clara desta realidade, basta ler os media ocidentais "aliados" da Ucrânia dos últimos dias, onde sobressai a ideia única de que quanto mais depressa o conflito for levado para negociações, menos Kiev perderá.
O próprio Presidente ucraniano voltou, nas últimas horas, a dizer que a guerra vai terminar em negociações no próximo ano, em 2025, alterando a base dos seus "planos de vitória" ou "fórmula de paz" para "a paz pela força".
Com isso, Zelensky quer dizer que quer estar em posição de força quando for o momento de se sentar à mesa com o Presidente russo, Vladimir Putin, o que só pode suceder depois de anular o decreto Presidencial onde se proíbe a si mesmo de negociar com o chefe do Kremlin.
Ao que tudo indica, a Zelensky resta a "força" da comunicação, porque no terreno de batalha, as suas forças estão claramente em perda, a Rússia avança em todas as frentes, e até a incursão de Agosto deste ano na região russa de Kursk está a chegar ao fim, com as unidades ucranianas em retrocesso acelerado, tendo já perdido 50% dos territórios conquistados.
E o efeito Donald Trump é já mais ruidoso e explosivo que todos os misseis russos, incluindo o novo e surpreendente Oreshnik (ver links em baixo) com a consolidação da ideia de que o apoio militar e financeiro americano a Kiev tem prazo de validade curto.
Que é 20 de Janeiro, a data da tomada de posse do Presidente-eleito, como é já evidente, a não ser que Donald Trump volte a surpreender, o que não parece exequível, considerando que o seu próprio filho, Trump Jr., visto como o seu porta-voz oficioso antes de voltar fisicamente à Casa Branca, tem afirmado a ideia de que o apoio a Kiev sofrerá uma mudança esmagadora.
Face a este cenário, aos aliados europeus, que acabam de sofrer novo revês, com a vitória, na 1ª volta das eleições Presidenciais na Roménia, de Calin Georgescu, um professor universitário que defende o fim do apoio a Kiev, resta pouco mais que manter o bluff enquanto for possível.
E a última evidência desse bluff aconteceu já nesta segunda-feira, com o regresso de notícias de que a França, a Polónia e o Reino Unido estão a ponderar o envio de forças militares para ajudar no combate aos russos no leste ucraniano.
Ora, se tal cenário se viesse a materializar, estes países estariam em guerra aberta e directa com a Federação Russa, o que é o mesmo que dizer que o passo seguinte seria a entrada da NATO na guerra, o que seria, inevitavelmente, a antecâmara de uma catastrófica guerra nuclear.
Portanto, estas notícias só podem ser encaixáveis numa espécie de jogo de póquer, em que alguns dos aliados europeus de Kiev procuram, num bluff arriscado, levar Vladimir Putin a ser menos exigente nas condições mínimas para aceitar o início de negociações de paz com a Ucrânia antes da chegada de Trump à Casa Branca, altura em que acaba o... jogo.
Outra questão que joga contra Zelensky e as suas manobras de última hora é a tentativa de procurar sensibilizar Trump para a sua causa ao falar de "paz em força", porque o Presidente ucraniano e os seus conselheiros estão convencidos de que o próximo Presidente dos EUA é receptivo a esse tipo de discurso musculado.
Ora, revisitando as declarações de Trump nos últimos meses, incluindo na campanha eleitoral das Presidenciais nos EUA, onde se referiu a Zelensky como uma espécie de caixeiro-viajante capaz de vender qualquer coisa...
... e as declarações dos elementos da sua futura Administração, além do que já disse o seu filho, Donald Trump Jr, o Presidente ucraniano vai apenas conseguir enfurecer Trump com esta jogada para o sensibilizar apelando ao seu gosto por demonstrações de força.
Face à realidade actual, Zelensky e os seus aliados, incluindo o ainda Presidente dos EUA até 20 de Janeiro, Joe Biden, procuram com redobrado empenho escalar o conflito de forma a dificultar a vida a Donald Trump quando este assumir o poder e procurar acabar, como prometeu, com esta guerra rapidamente, usando mesmo a expressão simbólica das "24 horas".
O que estão a tentar fazer com a surpreendente autorização de uso de misseis norte-americanos, britânicos e franceses, para a Ucrânia atacar a Federação Russa em profundidade, além da geografia em disputa neste conflito que já dura há quase três anos.
Essa utilização dos ATACMS norte-americanos ou Storm Shadow britânicos contra a profundidade russa era uma das linhas vermelhas mais carregadas desenhadas no mapa desta guerra por Vladimir Putin, porque, alega há muito o senhor do Kremlin, estas armas só são possíveis de usar com equipas ocidentais no terreno, o que faz destes países co-beligerantes.
Naturalmente que existe uma exígua possibilidade de não se estar perante um arriscado bluff mas sim uma disponibilidade "insana", como a ela se refere o major-general Agostinho Costa, analista militar nos media portugueses, de escalar a guerra para uma catástrofe nunca vista.
E há alguns exemplos dessa insanidade, que pode, na melhor das possibilidades, ser uma espécie de "insanidade estratégica" que fará, se assim for, parte do bluff ocidental para ajudar Kiev a chegar fortalecido à mesa das negociações.
O almirante Rob Bauer, um holandês que preside ao Comité Militar da NATO, veio recentemente admitir que a NATO está a analisar ma eventual mudança de abordagem na qual está em equação uma ataque preventivo contra a Rússia, ao mesmo tempo que pede aos países-membros para se prepararem para "tempos de guerra".
A juntar a esta declaração explosiva, e à equação de franceses, polacos e britânicos de envuar tropa para combater ao lado dos ucranianos, como cereja no topo do bolo, dos EUA chegaram, nas últimas horas, declarações no mínimo bizarras.
Primeiro, foi o porta-voz do Comando Estratégico norte-americano, o contra-almirante Thomas R. Buchanan, a vir a público dizer que os Estados Unidos estão prontos para uma guerra nuclear com a Rússia e que esse cenário está a ser equacionado.
E, citado esta terça-feira, 26, pela Newsweek, o secretário para a Força Aérea dos EUA, Frank Kendall, veio dizer que uma guerra com a Rússia "não está afastada" e "pode acontecer a qualquer momento".
Estas declarações, segundo a revista, foram produzidas a 12 deste mês, mas já dentro deste quadro incandescente de subida de tensões, mas, curiosamente, antes de o Presidente Joe Biden, ter autorizado o uso pela Ucrânia dos ATACMS contra a profundidade russa.
Este cenário deve ser analisado sob a perspectiva de esforço de última hora para ajudar Kiev a chegar robustecido à mesa das negociações com a Rússia, sendo igualmente claro para os analistas do Kremlin que só pode ser "bluff", de contrário, o mundo estaria mesmo à beira do precipício nuclear.