A embaixadora Lynne Tracy foi chamada de urgência ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, depois do ministro Sergei Lavrov ter dito que a responsabilidade do ataque na praia da Crimeia era totalmente dos EUA, porque os ATACMS só podem ser disparados com suporte técnico norte-americano, o que pode ser subentendido como uma situação de pré-confronto.

Não se sabe o que foi dito em concreto à diplomata norte-americana, mas o comunicado desse encontro disponibilizado pelos russos é claro no sublinhado de que se tratou de uma conversa tensa e rara em severidade no âmbito das relações entre as duas maiores potências militares globais.

Nas redes e canais russos alinhados com o Kremlin, como nunca sucedeu em mais de dois anos de guerra, surgiram vozes a insistir na necessidade de responder aos americanos com intensidade suficiente para perceberem que não podem atravessar as linhas vermelhas de Moscovo.

E três dias depois, o britânico The Guardian noticia que o secretário da Defesa norte-americano, Lloyd Austin, pegou no telefone e ligou para o seu homólogo russo, o ministro da Defesa Andrei Belousov, o que por si só é um momento extraordinário, visto que os dois "chefes" da Defesa russa e norte-americana não falavam há mais de um ano.

Neste espaço de tempo, as relações entre Washington e Moscovo desceram ao seu nível mais baixo de sempre, e mais perigoso, como frisou várias vezes o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, a "voz" mais respeitada do Presidente Vladimir Putin quando este não fala.

E há mesmo analistas que sublinham que o mundo não estava tão próximo de uma guerra devastadora nuclear desde a crise dos misseis de Cuba, em 1962, especialmente depois de o Presidente norte-americano, Joe Biden, ter autorizado os ucranianos a usarem os misseis ATACMS para atingir alvos nos territórios russos fora do contexto da guerra.

Há ainda quem defenda que a pressão colocada por Moscovo sobre Washington no âmbito da tragédia sobre a praia da Crimeia, onde morreram quatro pessoas, três crianças, e 150 ficaram feridas pelos estilhaços das explosões geradas pela ogiva de fragmentação, totalmente proibida no uso sobre civis pelas leis internacionais que regem os conflitos, foi uma jogada de "xadrez" do Kremlin para forçar os americanos a conversarem com Moscovo.

Isto, porque Putin já disse que em Kiev, o Presidente Zelensky não é interlocutor capaz e com capacidade de decisão pelo facto de estar totalmente dependente dos seus aliados ocidentais, especialmente dos Estados Unidos.

Nesta conversa entre Austin e Belousov, segundo alguns media, o russo fez questão de falar do "risco de escalada para um patamar limite num contexto de crescente apoio militar dos EUA à Ucrânia".

Além desta frase de Belousov, citada pelos media russos, pouco mais se sabe da conversa, além de que "trocaram pontos de vista sobre a situação em curso", mas sabe-se algo mais relevante que o conteúdo em si da chamada telefónica: Em Washington ninguém quer que a situação deixe de estar num patamar controlável.

Se esta conversa vai ou não ter continuidade, nenhum dos lados adiantou informação, mas sabe-se que no momento em que Lloyd Austin ligou para Andrei Belousov, ficou claro que tanto em Washington como em Moscovo não vale tudo e que ambos os lados não pretendem incendiar o mundo num Armagedão nuclear.