Por sua vez, João Lourenço, em terra alheia e ao lado de dois Presidentes, já adjectivou, por duas vezes, concidadãos seus de "malandros" e de "marimbondos". A primeira foi em Março de 2017, na qualidade de vice-presidente do MPLA e de candidato do mesmo partido às eleições daquele ano durante um encontro com Filipe Nyusi, na sede da FRELIMO. A segunda foi em Novembro de 2018, durante uma conferência de imprensa no Palácio de Belém, com o seu homólogo português, Marcelo Rebelo de Sousa, na qual chamou os seus antigos companheiros de luta de "marimbondos". Falar mal de Angola e dos angolanos no exterior é algo que tem histórico e que tem origem em quem governa o País e que tem a missão de fazer diferente. Quando Presidentes recorrem a adjectivos pejorativos para qualificar cidadãos do seu país em terra alheia (sejam adversários políticos ou opositores internos), não é algo que nos deve alegrar, mas, sim, algo que nos deve preocupar. Hoje, estamos a ver o Presidente João Lourenço e a sua governação criticarem os angolanos que, segundo eles, lá fora falam mal de Angola. Infelizmente, temos junto da governação os seus auxiliares, assessores e em certos sectores da nossa vida pública e partidária sectores que lidam mal com certas liberdades e com o exercício de escrutínio que angolanos que vivem no exterior fazem ao Executivo. Criticar, usar a liberdade de expressão e de opinião, bem como escrutinar são actos tidos como "falar mal", criando depois um rótulo de que a nossa Diáspora não tem espírito patriótico e amor a terra. Todo o pronunciamento de líderes políticos que configure uma espécie de censura ou limitação de liberdades pode criar nos cidadãos uma ideia de ditadura velada. O Presidente não pode insurgir-se ou manifestar publicamente o seu descontentamento, sempre que, em nome do interesse público e no espaço público, cidadãos angolanos no País ou no exterior exerçam escrutínio sobre a sua governação, sempre que o critiquem, sempre que usem da sua liberdade de expressão e de opinião, liberdades essas que cabem a ele promover, estimular e defender. A governação está também nos detalhes, e os cidadãos hoje estão atentos e vão percebendo todos os sinais. Quando a negação e desvalorização do próximo é praticada ao mais alto nível (vejam os casos dos " pasquins", "frustrados", "malandros" e "marimbondos" a que faço aqui referência), isso não é um bom sinal. Hoje, o termo "marimbondos" é uma adjectivação pejorativa criada pelo próprio Presidente em terra alheia, e todos achamos tudo muito normal, e ninguém lhe disse que devia evitar situações do género no futuro. Já acham anormal quando cidadãos nacionais que vivem no estrangeiro criticam a sua governação? Dizemos que estão a "falar mal" porque não aceitamos, muitas vezes, que têm direito a uma opinião/visão diferente. Não aceitamos e negamos um direito que lhes confere. Estar fora de Angola faz destes cidadão menos angolanos e menos patriotas do que aqueles que aqui vivem? Todos eles, sem excepção, têm familiares que vivem fora do País e com visões diferentes de Angola e das suas lideranças, aliás, os nossos governantes enfrentam certa oposição já mesmo no seio das suas próprias famílias. Por que razão negar o que é óbvio? A negação, nestes casos, é um mecanismo de defesa contra factos demasiados reais e difíceis de suportar. Negamos o outro porque não concordamos com a sua opinião, mas, na maior parte dos casos, porque não reconhecemos ao próximo o direito de nos contrariar ou de tomar uma posição diferente da nossa. Hoje, temos uma coisa interessante a que se chama democracia e liberdade de expressão; hoje temos o direito à informação e o dever de informar. A qualidade da democracia está directamente relacionada com a qualidade da informação, da formação, da comunicação, da educação, da cultura cívica e política. Ao invés de criarem gabinetes e milícias digitais para a desinformação, aos invés da criação de gabinetes de ódio e promoção da intolerância, ao invés de estarem focados em atacar jornalistas e órgãos de comunicação privados por via do anonimato ou de um discurso vil e ignóbil, certas estruturas palacianas sediadas na Cidade Alta deviam usar melhor os recursos públicos, sua experiência e saber, para melhorar aquela que tem sido até hoje uma das maiores fraquezas e debilidades da governação do Presidente João Lourenço: a comunicação! A sua comunicação e a dos seus auxiliares. Uma comunicação fechada em si, distante, arrogante e autoritária não o ajuda em termos de carisma, aceitação e popularidade. Os cidadãos precisam de ser abordados de uma forma diferente e mais humana por parte do Poder. Quem auxilia e assessora um Presidente deve ter a liberdade e certa autoridade para o fazer perceber que a comunicação é algo muito mais complexo do que se imagina e que improvisos e atalhos em nada ajudam. Existem regras que devem ser observadas para a obtenção de bons resultados. É preciso que João Lourenço respeite e observe os "sinais de trânsito" e conduza dentro dos "limites de velocidade" nesta "via-expressa" que o povo lhe abriu a 26 de Setembro de 2017, caso contrário pode cair no "radar" e o seu partido receber uma multa pesada em 2027. Faço votos de que as coisas melhorem e que a sua governação encontre os melhores caminhos em termos de gestão e de comunicação. É um desejo legítimo e sincero de um filho desta Pátria. Afinal de contas, não temos outra Pátria. Esta é a Pátria que nos pariu!