João Lourenço afirmou, no seu discurso de abertura, que com esta revisão pretende a " clarificação do modelo de relacionamento institucional entre o PR enquanto titular do poder executivo e a Assembleia Nacional no que respeita à fiscalização política.

A eliminação do princípio do gradualismo como um princípio constitucional condutor do processo de institucionalização efectiva das autarquias locais e a constitucionalização de um período fixo para a realização das eleições gerais são outros pontos da proposta que começa a ser apreciada pelo Conselho de Ministros a partir desta terça-feira, 02 de Março.

"São ainda apresentadas propostas de inclusão de novas matérias, assim como julgamos também oportuno clarificar diferentes aspectos da nossa Constituição. Os detalhes das propostas, o seu sentido, alcance e fundamentos serão apresentados publicamente", afirmou o Presidente, que declarou que com esta proposta de revisão pontual da Constituição "pretende-se preservar a estabilidade dos seus princípios fundamentais, adaptar algumas das suas normas à realidade vigente, mantendo-a ajustada ao contexto político, social e económico, clarificar os mecanismos de fiscalização política e melhorar o relacionamento institucional entre os órgãos de soberania, bem como corrigir algumas insuficiências".

"Pretende-se, com isto, ter uma melhor Constituição, para que continue a ser o principal instrumento de estruturação da sociedade angolana, capaz de congregar os angolanos em torno do nosso projecto comum de sociedade, a construção de uma sociedade de paz, justiça e progresso social", lê-se ainda no discurso escrito a que o Novo Jornal teve acesso.

João Lourenço abordou, igualmente, "o atentado de Cafunfo", ocorrido em Janeiro, e condenou com veemência "todos os actos que visam dividir o Estado".

"O país foi surpreendido na madrugada do passado dia 30 de Janeiro com um acto de rebelião armada na vila de Cafunfo, na Lunda Norte, protagonizado por um grupo de cidadãos nacionais e estrangeiros que atacaram, com armas de diferentes tipos, uma esquadra policial", lê-se no discurso do Presidente, que, embora lamente "a perda de vidas humanas 19 anos depois do calar definitivo das armas no país e do restabelecimento da paz e da reconciliação nacional entre os angolanos", condena "energicamente esta acção" e desencoraja "a prática de todos aqueles actos que atentam contra a segurança e a soberania nacional, contra a Constituição e a lei, como a tentativa de divisão e desmembramento do território nacional".

E lembra o número 6 do artigo 5° da Constituição: "o território angolano é indivisível, inviolável e inalienável, sendo energicamente combatida qualquer acção de desmembramento ou de separação de suas parcelas, não podendo ser alienada parte alguma do território nacional ou dos direitos de soberania que sobre ele o Estado exerce".

Lourenço, que critica "as vozes que se apressaram a condenar a Polícia Nacional que frustrou a acção criminosa e não os actores do atentado contra o Estado angolano", vem em defesa da Polícia Nacional.

"Para estas pessoas e organizações, criminosa é a Polícia porque, no seu entender, os que à madrugada atacaram com armas a esquadra policial são pacatos cidadãos que realizavam uma simples manifestação, reivindicando por melhores condições de vida. Entre elas (...) partidos políticos com assento parlamentar, cujos deputados juraram cumprir e fazer cumprir a Constituição e a lei".

"Passado cerca de um mês desde esses tristes acontecimentos, aguardamos pelas conclusões do inquérito em curso e a responsabilização criminal dos agentes da Polícia Nacional que terão praticado actos considerados desumanos, desonrando a farda que envergam", continua o discurso, em que condena "veementemente esse tipo de práticas, que em nada dignificam a corporação".

O Presidente da República refere também no seu discurso a recente polémica em torno da nacionalidade de Adalberto Costa Júnior, líder político da UNITA.

"Acompanhámos ultimamente com muita atenção os debates públicos à volta da nacionalidade adquirida por dirigentes de partidos políticos e a probabilidade desses aspirarem a concorrer, algum dia, ao cargo da mais alta magistratura da Nação", afirma, para acrescentar que "aanálise sobre o objectivo do debate vem sendo manipulada e deturpada por conveniência de uns poucos, como se o assunto se tratasse da dupla nacionalidade para a generalidade dos cidadãos, condição que hoje não está vedada a nenhum angolano, salvo a excepção prevista na Constituição".

Lourenço, que considera "infundados e irrealistas os receios de alguns analistas da política nacional, que apontam para o surgimento de uma campanha de incitação ao racismo e à xenofobia", afirma que "o barulho à volta deste falso problema procura, sobretudo, fomentar a divisão entre os angolanos, entre as diferentes regiões do país, entre as diferentes tribos e etnias que compõem o rico e vasto mosaico cultural, e que sempre viveram e continuarão a viver em perfeita harmonia".

De recordar que para a revisão da Constituição bastarão os votos da bancada do MPLA , partido que tem assegurada, no Parlamento, uma maioria de dois terços.

Promulgada a 5 de Fevereiro de 2010, a Constituição da República de Angola tem sido muito criticada por especialistas do direito constitucional angolano, que a consideram "demasiado presidencialista".