O ritmo é frenético. Uns correm para apanhar mais clientes, outros estão encostados às suas motorizadas. O cenário é visível em diversas zonas de Luanda, mas sobretudo em Cacuaco e Viana. Colocam a conversa em dia enquanto aguardam pelos clientes que chegam a conta-gotas naquela manhã de terça-feira.

"É água, é água…", grita um jovem que se mistura entre a multidão à procura de clientes para o seu precioso líquido. Junto à ponte, mesmo à entrada de Viana, estão homens e mulheres que conversam descontraidamente numa língua que rapidamente se percebe ser o lingala, falada na República Democrática do Congo.

Estas pessoas comercializam os mais diversos produtos, desde telefones celulares, água, roupa, até frutas. Tentamos vislumbrar entre aquele amontoado de gente um rosto que nos parecesse menos familiar, se calhar, que não tivesse uma pitada mwangolé. Numa primeira ronda ficámos com a sensação de que a história que nos tinha sido contada não era real. Que não havia, afinal, em Viana, jovens estrangeiros oriundos de países do Oeste africano e até chineses a fazerem serviço de kupapata.

Junto à ponte onde se contam às dezenas os jovens que, na estação de comboio do Kapalanga, em Viana, fazem o serviço de moto-táxi, metemos conversa na tentativa de encontrar um estrangeiro que acedesse falar à nossa reportagem. "Não, nunca ouvi falar", dizem-nos os primeiros kupapatas com quem conversamos. "Eric, Eric...", grita um dos motoqueiros para um jovem que se aproxima do grupo a passos lentos, mas com um sorriso tímido no rosto.

Eric, mal se apercebe da presença de estranhos, dá meia volta e zarpa a todo gás com a sua motorizada. "Este é da Guiné Conacry. Chegou aqui há pouco tempo, não sabemos bem como, até porque o português dele é "arranhado". E só sabe rir quando falamos com ele", conta outro kupapata, que logo tratou de denunciar os colegas estrangeiros.

Voltamos a conversar com os jovens angolanos vindos das várias províncias do país, com destaque para Benguela, sobre os seus colegas do Oeste africano. Sobre os chineses, nem rasto, e nenhum dos jovens com quem conversamos, tanto em Cacuaco como em Viana, disseram-nos ter visto os asiáticos a praticarem o serviço de moto-táxi.

Pouco tempo depois de Eric chega Djaló. Apesar da dificuldade na língua, o jovem que nos diz ser senegalês está a fazer serviço de kupapata para arranjar mais uns trocos. A cantina onde trabalhava encerrou. "Não falo bem português", diz timidamente o senegalês sentado na moto, enquanto aguarda por outro cliente que não tarda em chegar. "Tenho de ir", diz o jovem que se recusa a falar mais.

Não aceita fazer fotografias. John é o terceiro estrangeiro que conhecemos. Chega satisfeito à paragem do Kapalanga, próximo de Viana, em Luanda. Também Senegalês de nacionalidade, abre um enorme sorriso quando o abordamos.

Diz estar a fazer serviço de moto-táxi porque lhe parece um serviço normal, como qualquer outro, que está ali como qualquer outro kupapata a fazer o seu serviço para ganhar dinheiro. "As cantinas estão a ser assaltadas e às vezes eles são feridos. Mas também há quem entre eles diga que sempre ganha mais trabalhando durante o dia aqui, como kupapata, enquanto outro mantém a cantina aberta", diz João António.

João António, lobitanga em Luanda há mais de dois anos, mostra-se desconfiado com a presença da equipa do Novo Jornal. "Eles agora são muitos, esperem só uns minutos que foram levar clientes e daqui a bocado estão aqui", diz João António, que pede a ajuda dos colegas para mostrar à nossa reportagem quem são os estrangeiros.

Gonçalves é kupapata há mais de sete anos e sempre na zona de Viana. Questionado sobre a existência de estrangeiros a praticarem serviços de kupapata, Gonçalves explica que conhece alguns mas que naquele momento não estavam por lá. "Estão aqui às dezenas. São malianos, e senegaleses, na sua maioria, mas também tem do Benin e da Guiné- Conacry", esclarece Gonçalves.

Gonçalves e outros kupapatas contam à reportagem do Novo Jornal que a chegada dos estrangeiros à estação do Kapalanga é, segundo o que contam os seus amigos estrangeiros, resultado dos vários roubos em cantinas que têm se registado naquele município de Luanda. "Eu estou em Angola desde 2010. Já trabalhei em cantinas mas os roubos são quase diários.

Não vemos o dinheiro do nosso trabalho. Aqui as coisas são mais facilitadas porque todos nos conhecemos e não estou sozinho numa loja, onde os gatunos entram, me espancam e levam todo o meu dinheiro", diz John, que recusa-se também a fazer fotografias.

Através de John conseguimos saber que o grupo é grande e tende a aumentar. "Já são muitos os estrangeiros que estão a aderir a este serviço. Eu tenho aqui muitos amigos. Nem todos são senegaleses, há também beninenses e colegas da Guiné Conacry", conta John.

Apesar do à vontade com que fala para a nossa reportagem, John mostra-se atento aos possíveis clientes - que não param de chegar. Na zona de Cacuaco a reportagem do Novo Jornal conversou com vários kupapatas. Não foi possível confirmar a presença de trabalhadores vindos de outros países. "Aqui não temos estrangeiros a fazerem serviço de táxi embora tenhamos visto, de vez em quando, chineses a transportar outros chineses.

Mas não temos como confirmar se estão a trabalhar, uma vez que eles não ficam nas paragens nem levam os passageiros angolanos. Viajam sempre com chineses ou vietnamitas - já há muitos aqui na zona", conta o mais velho Simão Caxito.