O foco principal dos Chefes de Estado e de Governo da Namíbia, África do Sul, Zâmbia, Swazilândia, da RDC e do Lesoto, estes dois últimos enquanto convidados, vai ser a instabilidade que o Lesoto e a República Democrática do Congo (RDC) atravessam.

O primeiro-ministro do Lesoto, Thomas Thabane, e o Presidente da RDC, Joseph Kabila, estarão em Luanda na qualidade de convidados porque os seus países são os sujeitos principais da preocupação dos líderes da SADC, o Presidente sul-africano, Cyril Ramaphosa, e pelo Órgão de Cooperação Política, Defesa e Segurança (OCPDS), o Presidente João Lourenço.

De acordo com uma nota do Ministério das Relações Exteriores angolano (MIREX), para além das crises da RDC e do Lesoto, o encontro terá ainda em cima da mesa a questão mais abrangente da consolidação da democracia nos países-membros da SADC.

Lesoto, a terrível herança da instabilidade permanente

No que diz respeito ao Lesoto, este pequeno reino, encravado entre montanhas no nordeste da África do Sul, vive desde Setembro do ano passado mais uma grave crise político-militar depois do assassinato do seu comandante militar, general Khoantle Matsomotso, por oficiais rivais, numa disputa pelo poder, que por lá, é tradição ser definido através da força pelas chefias militares.

Actualmente, Angola mantém cerca de duas centenas de elementos, militares e de segurança, no contingente da SADC no Lesoto, que inicialmente deveria chegar aos mil elementos, incluindo especialistas civis na resolução de conflitos, sendo, por isso, uma peça-chave para conduzir este processo a bom porto.

Num recente encontro em Luanda com o Presidente João Lourenço, o primeiro-ministro do Lesoto, Thomas Thabane, defendeu que "só a paz é a solução, a guerra e as matanças só deram e vão continuar a dar má fama ao continente africano".

Antes de deixar Angola, garantiu o empenho do seu Governo numa transição sólida, com a realização de eleições democráticas e com a consolidação das suas instituições, especialmente a militar, que tem sido o foco principal da instabilidade naquele país durante as últimas décadas.

Mas só a forte presença do contingente regional é possível impor essa solução, estando as FAA a liderar essa influência no terreno.

O Lesoto, independente do Reino Unido desde 1966, vive há décadas, praticamente desde que se libertou do comando de Londres, em crises sucessivas, quase todas de origem militar, numa perpétua luta pelo poder que, apesar de ser um reino e ter um governo formal, é literalmente comandado pelas chefias militares, condição que a SADC procura agora, de forma definitiva, transformar, retirando poder aos militares.

Para se perceber a grande complexidade deste pequeno país, basta ter em conta que, desde 1986 com maior amplitude, mas não menos instabilidade antes, Maseru assitiu a múltiplas crises, desde logo com o golpe do general Justin Lekhanya, em 1986, que assume o poder, destitui o rei Moshoeshoe II e coloca no trono o seu filho, Letsie.

Mas o velho rei volta ao poder em 1991 devido a novo golpe militar e o seu filho regressa ao trono com a morte do pai, em 1996, desta feita com o título de Letsie III.

Em 1998 realizam-se eleições e o Congresso para a Democracia de Lesoto (LCD) ganha e Bethuel Pakalitha Mosisili assume o cargo de primeiro-ministro, apesar da forte contestação da oposição que alega uma evidente fraude.

A crise assume proporções gigantescas e a África do Sul e o Botsuana enviam tropas para o país, a pedido do primeiro-ministro, conseguindo controlar a situação mas a custo de mais de uma centena de mortos.

E este é o contexto geral do Lesoto, acrescido da morte do comandante das forças militares em Setembro de 2017, que a SADC e o seu OCPDS querem acabar de uma vez por todas, estando Angola e a África do Sul, que lideram estas duas organizações, a gerir a situação e os planos em curso para isso, incluindo a presença militar no reino.

RDC, o gigante das crises permanente

Em Kinshasa, desde a independência do Congo, em 1961, só no período da ditadura feroz de Mobutu Sese Seko, entre 1965 e 1997, se viveram alguns anos de condicionada estabilidade política.

Deste a queda do tirano Sese Seko que a RDC não conhece a estabilidade políticas, apesar dos dois mandatos cumpridos, desde 2001, por Joseph Kabila, o actual Presidente que ocupa o cargo interinamente devido... à instabilidade.

Kabila terminou o seu segundo e último mandato permitido pela Constituição em Dezembro de 2016, mas, através de vários expedientes conseguiu manter-se no poder até às eleições previstas, mas não garantidas ainda, de 23 de Dezembro próximo.

Desde Janeiro de 2015 que, primeiro pela tentativa de alterar a Constituição para se poder recandidatar, e depois, especialmente entre Setembro e Dezembro de 2016, pelo adiamento do processo eleitoral, centenas de pessoas morreram nas ruas das principais cidades congolesas em confrontos entre as forças de segurança e manifestantes da oposição que exigiam eleições e a saída do Presidente.

Com a forte pressão internacional, desde os EUA à ONU, passando pelas exigências internas, os últimos dois anos, foram igualmente violentos, envolvendo mesmo a igreja católica, sempre pela exigência de eleições e a saída de Kabila do poder.

E é esta situação na RDC, sem esquecer o constante constrangimento provocado pelas guerrilhas internas e externas, que os Chefes de Estado e de Governo da SADC vão ter para analisar no encontro de amanhã, terça-feira, em Luanda.

E a tornar a situação quase insustentável está a contínua pilhagem das riquezas do país, que despertam séria cobiça do vizinhos e de grupos poderosos internacionais.