Este é o momento em que a guerra comercial entre as duas mais pujantes economias planetárias entra na perigosa antecâmara daquilo que pode vir a ser uma guerra económica mundial com efeito bola de neve e onde Angola surge na lista daquelas que podem ser as maiores vítimas colaterais deste confronto entre colossos, fazendo lembrar um provérbio bem conhecido: quando os elefantes lutam, quem sofre é o capim.
Para já, um dos efeitos mais salientes da guerra das tarifas entre Pequim e Washington pode ser encontrado no comportamento das bolsas norte-americanas, onde, por exemplo, o índice Dow Jones, um dos mais importantes indicadores deste mercado, com 30 das mais importantes empresas da economia dos Estados Unidos, como a IBM, a Exxon ou a General Motors, deu um trambolhão de mais de 600 pontos de ontem para hoje.
Da Ásia à Europa, os estilhaços fizeram-se sentir de igual modo, porque, como notam alguns dos mais proeminentes analistas de Wall Street, citados pelas agências, o que está a corroer a confiança dos investidores é a impossibilidade de, com base em informações válidas, antever quando e como vai terminar este braço-de-ferro entre Donald Trump e o seu homólogo chinês, Xi Jinping.
E é por isso que as bolsas estão a ceder à pressão com fortes quedas, porque o dinheiro está a sair destas às golfadas para ser aplicado em soluções tradicionalmente mais seguras, como o ouro, por exemplo, porque, no limite, é impossível estas empresas poderem planear com tempo os seus investimentos futuros ou manter alguns dos que já estavam projectados, considerando que estamos perante os dois maiores importadores e exportadores do mundo, estando a definhar as margens de lucro para os accionistas ao mesmo tempo que faz crescer os custos da actividade.
E, claro, quando estas "guerras" estalam, os investidores e os governos, sejam de países produtores de petróleo - com receio de perdas de valor do barril, como é o caso de Angola -, ou de países consumidores - na expectativa de baixas vantajosas para a sua competitividade -, arregalam os olhos e as atenções para ver o balancear dos acontecimentos.
E vale a pena estar atento, porque, ao que tudo indica, nem Trump nem Jinping mostram sinais de que podem ceder e recuar nas suas posições.
Pior, o Presidente norte-americano disse mesmo que é melhor a China não avançar para o aumento de tarifas em retaliação ao aumento do lado americano, defendendo que Pequim deve comer e calar, porque, caso responda com agressividade - como foi, efectivamente, e isso ver-se-á já a 01 de Junho -, a contra-resposta de Washington será ainda mais demolidora para a economia chinesa que Trump garante ter mais a perder que a sua.
Agora, o que está na ponta da espada empunhada por Donald Trump é uma declaração de guerra comercial total, porque em cima da mesa da Casa Branca está uma escalada que prevê a possibilidade de levar as tarifas de 10% para 25% sobre a quase totalidade dos bens importados pelos EUA à China, o que soma mais ou menos 550 mil milhões USD/ano, dados de 2018.
Mas foi na rede social Twitter, o seu campo de batalha preferido, que Trump foi mais longe nas ameaças ao seu "amigo" Xi Jinping, ao dizer, num tweet: "Eu digo de forma aberta ao Presidente Xi & e a todos os meus amigos na China que a China será afectada de forma severa se não aceita um acordo, porque as empresas serão forçadas a deixar a China para outros países. Será muito caro comprar na China (...)".
E o petróleo aguenta-se...?
Parece que sim. Para já, o Brent londrino mostra-se bastante resiliente a esta tremideira global por causa do finca-pé sino-norte-americano, estando hoje, perto das 10:15 a subir 0,30%, para 70.45 USD por barril, embora mostrando sinais de poder resvalar ligeiramente para baixo da barreira dos 70 USD.
Os analistas consideram um dado muito importante, neste cenário global de maus indicadores e pressupostos negros para as economias exportadoras, como a chinesa e a dos EUA, que o petróleo tenha mantido a postura e não reagir histericamente às más notícias, embora exista uma razão válida para isso.
Razão essa que se deve igualmente a Donald Trump, porque enquanto mantém a pressão sobre a China - factor que pressiona o barril em baixa -, faz o mesmo com um dos maiores exportadores de petróleo do mudo, o Irão, através de severas sanções às suas exportações de crude - factor que pressiona o barril em alta -, devido ao acordo nuclear.
Duas possibilidades:
1 - O que se pode retirar disto, mesmo que a conclusão seja ligeiramente forçada, é que a Administração norte-americana pode ter alimentado artificialmente a crise com Teerão para garantir que a sua pressão sobre a China - que é, efectivamente, o que mais pesa na aposta de Trump e onde está o dinheiro mais graúdo em risco - não influísse com mais severidade sobre os mercados de crude, porque o barril a preços moderados é fundamental para a competitividade da economia dos Estados Unidos mas também para as questões de política interna, onde a gasolina muito barata tem influência nas opções dos eleitores.
2 - Ou então, em sentido contrário, que a crise com a China - cuja resolução pode ser conseguida em menos de uma semana - foi forjada artificialmente para manter a pressão em baixa sobre o petróleo para garantir que a estratégia de pressão sobre o regime do Irão - fundamental para a definição do xadrez político e económico do Médio Oriente, e de extrema relevância para os dois grandes aliados dos EUA e inimigos mortais do Irão nesta fulcral região, Israel e Arábia Saudita - não impactava de forma muito severa no preço do barril nos mercados internacionais, porque o barril a preços moderados é fundamental para a competitividade da economia dos Estados Unidos mas também para as questões de política interna, onde a gasolina muito barata tem influência nas opções dos eleitores.
O impacto de todo este turbilhão na economia angolana está bom de ver, porque se ganhar peso, neste periclitante equilíbrio, a guerra comercial, e isso afectar as duas maiores economias mundiais, a procura de crude vai baixar significativamente e o barril descerá em conformidade, retirando fluxo monetário para os cofres do Estado.
Até porque, como é sobejamente conhecido, as exportações de crude ainda representam mais de 90 por cento do total vendido no exterior, cabendo a este sector pelo menos 50 por cento do Orçamento Geral do Estado.
Isto, a par dos dados recentes que apontam para uma continuada diminuição da produção nacional, que tem vindo a descer mês após mês, estando as medidas entretanto tomadas para evitar essa perda, a revelar-se de escassa eficácia.
Este cenário deixa e mantém em aberto o prognóstico feito pela Agência Internacional de Energia que, em Março do ano passado, estimava que a produção de crude em Angola baixará até aos 1,29 milhões de barris por dia até 2023, devido aos efeitos nefastos da crise de 2014, que levou o barril de mais de 100 USD para escassos 29 em Março de 2016.
Essa situação levou a um quase total desinvestimento das majors internacionais na produção e exploração em Angola que, entretanto, como é o caso da Total e da ENI, estão a regressar de forma paulatina, com o voltar do valor do barril a preços interessantes, acima de 65 USD.
A esse propósito, citado pela Lusa, o novo director da Câmara de Energia Africana em Angola, Sergio Pugliese, defendeu que o país "precisa desesperadamente" de mais exploração de petróleo, incluindo nos poços marginais, para compensar o declínio dos poços mais antigos.
"Angola precisa desesperadamente de mais exploração, incluindo nos poços marginais, para compensar o declínio da produção petrolífera (...) que tem estado a decair há mais de uma década devido a falta de investimento".
Mas, no fim da linha, o que vai determinar se Angola precisa e vai ter esse investimento é o resultado da análise que as multinacionais vão fazer às crises globais, respondendo a duas questões simples: vai aumentar ou diminuir o consumo e a procura de petróleo? O valor do barril nos mercados internacionais vai subir ou descer?