Depois de, como o Novo Jornal noticiou na segunda-feira, o think thank (grupo de reflexão estratégica sobre defesa e segurança) mais influente junto das chefias militares norte-americanas, a RAND Corporation, ter divulgado um documento que esbarra de frente, inesperada e com estrondo, com a visão da Casa Branca, onde defende que o prolongamento no tempo da guerra na Ucrânia contraria fortemente os interesses dos Estados Unidos da América, o Presidente Joe Biden foi contundente sobre uma das questões mais badaladas actualmente pelos media ocidentais, que é a resposta ao pedido do Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, para que Washington envie caças F-16 para combater os russos.
"No!", respondeu, de forma seca e contundente, Joe Biden quando, à saída da Casa Branca, confrontado com um grupo de jornalistas sobre se os EUA iam enviar F-16 para a Ucrânia, como KIev estava a pedir.
Mas esta resposta, que parece definitiva pela forma quase ríspida com que Biden procurou encerrar um assunto que saltou para as capas dos jornais depois de Volodymyr Zelensky ter colocado como prioridade para derrotar as forças russas o envio de aviões de guerra Made in USA F-16, dos mais usados pelas forças aéreas no ocidente, e mísseis de longo alcance, pode não ser bem assim, porque o inquilino da Casa Branca também tinha dito que não iria autorizar o envio de tanques pesados M1 Abrams para não escalar a guerra e aproximá-la de um conflito directo entre a NATO e a Federação Russa e há uma semana mudou de ideias.
Mas, para já, naquilo que muitos analistas militares consideram que seria atravessar a mais vermelha das linhas vermelhas e levaria o conflito para um patamar onde tudo estaria em cima da mesa, incluindo o recurso aos arsenais nucleares, o Presidente dos EUA parece estar consciente de que tal decisão não deve ser tomada... pelo menos para já!
Alias, esse entendimento, ainda segundo especialistas em conflitos militares, parece não ter sido totalmente obliterado com a autorização de envio dos M1 Abrams, os mais avançados e poderosos carros de combate dos Estados Unidos, porque as condições colocadas são que estes só vão chegar ao campo de batalha no final de 2023 ou início de 2024, o que, segundo as teses mais optimistas, a guerra já terá conhecido uma saída, seja pela derrota de um dos lados, seja pela via negociada.
Os EUA terão apenas colocado o relógio a contar para o envio dos tanques para desatar o nó na Europa, onde os alemães tinham como condição para permitir o envio dos seus Leopard-2 e a reexportação destes por países terceiros que os norte-americanos também o fizessem...
Neste momento, com o calendário demasiado alargado pelos Estados Unidos para que os seus M1 Abrams cheguem à Ucrânia, propositadamente, até porque uma das suas Brigadas estacionadas na Polónia, no âmbito da NATO, está a fazer agora a sua rotação calendarizada e poderiam deixar alguns dos seus blindados M1 já no terreno e não o vão fazer, os analistas admitem que também os alemães possam encontrar mecanismos para atrasar a chegada dos seus Leoprd-2 ao leste ucraniano onde se travam as batalhas.
Lula avança na arena internacional
Entretanto, o Brasil, com o novo0 Presidente há apenas um mês no cargo, parece querer tomar um lugar de destaque entre as potências mundiais, apontando como caminho para encontrar uma solução negociada para a guerra na Ucrânia, a criação de um grupo alargado de Estados para contactos permanentes no sentido de proporcionar um entendimento entre os beligerantes.
Após um encontro com o chanceler alemão, Olaf Scholz, em Brasília, Lula sugeriu que esse grupo de países comece por se sentar com russos e ucranianos e evoluir a partir daí para um encontro entre todos até que isso possa conduzir a que Kiev e Moscovo se entendam por si na elaboração de um acordo que permita acabar com as hostilidades e chegar depois à paz.
"A minha sugestão é que a gente crie um grupo de países, que tente sentar à mesa com a Ucrânia e com a Rússia para tentar encontrar a paz", disse Lula, citado pela brasileira Gazeta do Povo, acrescentado que esse foi um dos motes da conversa com o líder alemão.
"A gente tenta criar um clube ecológico, e a gente cria o clube das pessoas que vão querer construir a paz no planeta", disse ainda Lula, lembrando que também já tinha colocado esta ideia ao Presidente francês, Emmanuel Macron, apontando como próximo receptáculo para este seu plano o Presidente norte-americano, Joe Biden, bem como o seu homólogo chinês, Xi Jinping, quando for a Pequim, em Março próximo, porque "os amigos chineses têm um papel muito importante" e está na hora deles "meterem a mão na massa".
Para já, sobre a posição do Brasil quanto ao conflito no leste da Europa, Lula aposta na continuidade da equidistância relativa, embora tenha agora admitido que existe uma responsabilidade de Moscovo no início do conflito.
Manteve, porém, a condição de não fornecedor de armamento a nenhum dos lados, inclusive munições para os Leoprd-2, como a Alemanha está a pedir que faça.
"O Brasil não tem interesse em passar as munições para que elas sejam utilizadas na guerra entre Ucrânia e Rússia. O Brasil é um país de paz, o último contencioso nosso foi a guerra do Paraguai. E, portanto, o Brasil não quer ter qualquer participação, mesmo que indirecta", afirmou, ainda citado pela Gazeta do Povo, lamentando que o mundo esteja a ouvir falar muito de envio de armas e pouco de esforços para a paz.
Esta posição de Lula da Silva parece, para já, estar a merecer alguma atenção em Moscovo, porque os media russos públicos, como o Russia Today, noticiou a iniciativa de Lula da Silva com algum destaque, dando maior relevo à criação de um grupo de países "forte, respeitado por ambos os lados e empenhado na criação de condições para uma paz negociada" e com a missão de proporcionar encontros com ambos os lados do conflito.
Alemanha não permitirá guerra aberta entre Rússia e NATO
Depois da polémica trapalhada da sua ministra dos Negócios Estrangeiros, Annalena Baerbock, onde esta, no Parlamento Europeu admite, claramente, que a Alemanha e a União Europeia estão em guerra com a Rússia, o seu chefe, o chanceler Olaf Scholz veio a público metê-la no lugar, afirmando que a posição oficial de Berlim é que não será tolerada a eclosão de uma guerra com os russos.
"A Alemanha não permitirá que a guerra na Ucrânia se transforme num conflito entre a Rússia e a NATO", disse Scholz, acrescentando mesmo que o seu Governo, pelo contrário, contribuiu para que uma guerra não ocorresse entre a União Europeia e a Federação Russa.
"Uma guerra entre a Rússia a NATO não irá acontecer, porque nós vamos impedir que isso suceda com todo o nosso empenho", garantiu o chanceler, colocando na corda bamba a sua ministra chefe da diplomacia alemã.
Entretanto, com a cabeça a prémio...
... e com recompensa milionária, não no oeste selvagem mas no leste em guerra, são os carros de combate norte-americanos M1 Abrams e os alemães Leopar-2, cuja destruição garante ao autor do disparo uma recompensa milionária que vai se paga por uma empresa privada russa.
O primeiro destes tanques que for destruído garante ao autor do feito 70 mil dólares, sendo que os restantes que forem destruídos passam a valer "apenas" sete mil USD a quem fizer ir pelos ares um destes veículos, cujo custo de produção vai dos seis milhões USD (Lepard-2) aos 10 milhões USD para o M1 Abrams, se se incluírem os extras normais, como treino de tripulações e manutenção de rotina.
Os prémios pagos pela Fores, uma empresa ligada ao sector petroquímico russo, vai ainda mais longe e, se um dia os caças norte-americanos F-16 chegarem aos céus deste conflito, o que é altamente improvável porque isso seria o mesmo que inaugurar uma guerra entre a NATO e a Rússia, o primeiro que for abatido garante ao autor do "abate" mais de 200 mil USD, passando os restantes a valer por asa no chão 12 mil dólares.
Segundo o site da Russia Today, um canal público russo, também um conhecido actor russo, Ivan Okhlobystin, publicou nas redes sociais que cada tanque norte-americano M1 Abrams garante ao autor do disparo certeiro 1º milhões de rublos, o equivalente a 144 mil dólares.
Entre as ofertas já dadas como certas estão os 31 M1 dos EUA, mas que só devem chegar à Ucrânia em finais deste ano, enquanto a Alemanha, a Polónia e os Paises Baixos garantem 14 Leopar-2 cada um, entre outros envios de menor quantidade, como oito noruegueses, quatro do Canadá...
Isto, quando na frente de batalha mais intensa, na província de Donetsk, diariamente morrem centenas de militares de um e do outro lado, com os russos a conseguirem ligeiros ganhos de território, empurrando os ucranianos cada vez para mais perto do Rio Dniepre, o que seria uma etapa importante desta guerra, porque esse curso de água permitiria a Moscovo assegurar mais facilmente as suas posições mais avançadas.
Contexto da guerra na Ucrânia
A 24 de Fevereiro de 2022 as forças russas iniciaram a invasão da Ucrânia por vários pontos, tendo o Presidente russo dito que se tratava de uma "operação militar especial", sublinhando que o objectivo não era (é) a ocupação do país vizinho, condição que evoluiu depois para a anexação de territórios no Donbass mas também as regiões de Kherson e Zaporijia, mas sim a sua desmilitarização e desnazificação e assegurar que Kiev não insiste na adesão à NATO, o que Moscovo considera parte das suas garantias vitais de segurança nacional.
O Kremlin critica há vários anos fortemente o avanço da NATO para junto das suas fronteiras, agregando os antigos membros do Pacto de Varsóvia, organização que também colapsou com a extinção da URSS, em 1991.
Moscovo visa ainda garantir o reconhecimento de Kiev da soberania russa da Península da Crimeia, invadida e integrada na Rússia, depois de um referendo, em 2014, e ainda a independência das duas repúblicas do Donbass, a de Donetsk e de Lugansk, de maioria russófila, que o Kremlin já reconheceu em Fevereiro, tendo acrescido a esta reivindicação as províncias de Kherson e Zaporijia, depois da realização de referendos que a comunidade internacional, quase em uníssono, não reconhece.
Do lado ucraniano, a visão é totalmente distinta e Putin é acusado de estar a querer reintegrar a Ucrânia na Rússia como forma de reconstruir o "império soviético", que se desmoronou em 1991, com o colapso da União Soviética.
Kiev insiste que a Ucrânia é una e indivisível e que não haverá cedências territoriais como forma de acordar a paz com Moscovo, sendo, para o Presidente Volodymyr Zelensky, essencial o continuado apoio militar da NATO para expulsar as forças invasoras.
A organização militar da Aliança Atlântica está a ser, entretanto, acusada por Moscovo de estar a desenrolar uma guerra com a Rússia por procuração passada ao Exército ucraniano, o que eleva, segundo o ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Sergei Lavrov, o risco de se avançar para a III Guerra Mundial, com um confronto directo entre a Federação Russa e a NATO, que tanto o Presidente dos EUA, Joe Biden, como o Presidente Vladimir Putin, da Rússia, já admitiram que se isso acontecer é inevitável o recurso ao devastador arsenal nuclear dos dois lados desta barricada que levaria ao colapso da humanidade tal como a conhecemos.
Esta guerra na Ucrânia contou com a condenação generalizada da comunidade internacional, tendo a União Europeia e a NATO assumido a linha da frente da contestação à "operação especial" de Putin, que se materializou através de bombardeamentos das principais cidades, por meio de ataques aéreos, lançamento de misseis de cruzeiro e artilharia pesada, e com volumosas colunas militares a cercarem os grandes centros urbanos do país, mas que agora está concentrada no leste e sudeste da Ucrânia.
Na reacção, além da resistência ucraniana, Moscovo contou com o maior pacote de sanções aplicadas a um país, que está a causar danos avultados à sua economia, sendo disso exemplo a queda da sua moeda nacional, o rublo, que chegou a ser superior a 60%, embora já tenha, entretanto, recuperado.
Estas sanções, que já levaram as grandes marcas mundiais a deixar a Rússia, como as 850 lojas da McDonalds, a mais simbólica, abrangem ainda os seus desportistas, artistas, homens de negócios, a banca e grande parte das suas exportações, ficando apenas de fora o sector energético, do gás natural e em pate do petróleo...
Milhares de mortos e feridos e mais de 5,5 milhões de refugiados nos países vizinhos da Ucrânia são a parte visível deste desastre humanitário.
O histórico recente desta crise no leste europeu pode ser revisitado nos links colocados em baixo, nesta página.