Esta expulsão das unidades das Forças Armadas da RDC (FARDC) que estavam no local com apoio de unidades da missão da ONU no país, a MONUSCO, segundo o site AfricaNews, sucedeu na segunda-feira e foi confirmada por fontes no local.

Com o assalto a Bunagana dos guerrilheiros do M23, perto de 150 elementos das forças de segurança congoleses, entre militares e agentes da polícia, fugiram para o Uganda, forçando a passagem na fronteira para se entregarem às forças ugandesas, porque, segundo um oficial ugandês citado pela AFP, esta foi a única forma que viram para poderem salvar as suas vidas.

Nos últimos meses, os guerrilheiros do M23, um grupo formado em 2012 por elementos da minoria Tutsi do Ruanda, tem vindo a espalhar violência na província do Kivu Norte, especialmente na região de Rutshuru, cidade situada a norte de Goma, com um registo de centenas de mortos e feridos entre as populações camponesas e entre as forças de defesa da RDC presentes no local.

Este recrudescer dos ataques deste grupo levou a um elevar perigoso da tensão entre a RDC e o Ruanda, que, nas últimas duas semanas conduziu o Governo do Presidente Felix Tshisekedi, em Kinshasa, a acusar o Ruanda de estar a apoiar os terroristas do M23, e mandou, por isso, chamar o embaixador ruandês ao mesmo tempo que proibiu o uso do seu espaço aéreo pela companhia de bandeira RwandAir.

Do outro lado, o Ministério dos Negócios Estrangeiros ruandês, a partir de Kigali, acusou as forças militares congolesas de flagelarem o seu território com artilharia e o Presidente Paul Kagame ordenou o reforço das patrulhas fronteiriças, o que levou a algumas escaramuças e à detenção de dois soldados do Ruanda pelas FARDC.

Quando existia, de facto, um risco de que esta tensão fosse elevada até a um ponto em que os dois exércitos se confrontassem, como milhares de pessoas nas ruas de Kinshasa exigiam depois de a imprensa do país incendiar os ânimos contra o país vizinho, entrou em cena o lider da Conferência Internacional para a Região dos Grandes Lagos (CIRGL), o Presidente angolano, João Lourenço, e o Presidente da União Africana, o senegalês Macky Sall.

Depois de uma visita de algumas horas a Luanda do líder pan-africano, Macky Sall, a 24 de Maio, para conversações com João Lourenço, onde o tema da tensão no leste da RDC esteve no topo da agenda, o Palácio da Cidade Alta recebeu, logo a seguir o Presidente congolês, Tshisekedi, para falar também sobre esta incandescente tensão.

Nesse mesmo dia, como o Novo Jornal noticiou aqui, o Chefe de Estado angolano esteve ao telefone com o Presidente do Ruanda e ficou marcada uma Cimeira Tripartida, ainda com data por marcar, com a presença do anfitrião, Kagame e Tshisekedi, de forma a encontrar uma solução para este problema gerado pela vaga de ataques dos guerrilheiros do M23, aparentemente fortalecidos em homens e equipamento capaz de derrotar as FARDC em combate directo.

Este recrudescer dos ataques do M23 já levou largos milhares de pessoas a deixar a região de Bunanaga para procurar refúgio no Uganda e em Rutshuru, aumentando o j+a de grande dimensão universo de refugiados no leste da RDC, onde há décadas vários grupos de guerrilha atormentam as populações locais, como a Aliança das Forças Democráticas (ADF), com origem no Uganda e hoje uma conhecida extensão dos jihadistas do estado islâmico, e a Frente Democrática de Libertação do Ruanda (FDLR), além do M23 e de várias milícias locais armadas.

O que querem estes grupos violentos?

A generalidade dos grupos de guerrilha que têm o seu vasto campo de actuação no leste do Congo procuram vantagens na exploração dos imensos recursos existentes nas províncias dos Kivu, Norte e Sul, e Ituri, onde abundam os diamantes, mas também o cobalto e o coltão, estes essenciais para a indústria das novas tecnologias e, especialmente, o coltão, com escassa presença em todo o mundo mas em quantidades generosas nesta parte de África, sendo a RDC o país com as maiores reservas do mundo, mais de 80% do que se estima existir no planeta.

Num país onde o Estado tem dificuldade em impor-se, é a violência protagonizada pelas guerrilhas que mantém as áreas de mineração seguras para o negócio, que envolve milhares de crianças exploradas severamente em trabalho forçado, árduo e mal pago.

A RDC e o Ruanda estão no topo dos exportadores globais de cobalto, mas, como algumas organizações não-governamentais têm alertado, as reservas existentes no país não justificam a liderança da lista dos exportadores deste raro mineral, o que deixa a pairar a possibilidade de a origem do coltão exportado por Kigali estar fora das suas fronteiras.

Desde os diamantes ao coltão, que é um mineral formado por dois elementos, a columbite e a tantalite, essencial, por exemplo, para a produção de smartphones, tablets, laptops, etc, passando pelo cobalto, fundamental para as ligas usadas na indústria aeronáutica, a RDC está entre os países com mais reservas conhecidas.

Mas isso pouco serve às suas populações, que estão entre as mais pobres do mundo... e a presença das guerrilhas, que exploram estes vastos recurso há décadas, envolvendo a corrupção de governantes locais e a exploração de trabalho forçado, é uma das razões para que estes recursos não sirvam para melhorar a vida das populações locais, martirizadas em permanência pelas guerrilhas e milícias agressivas.

Por detrás deste fenómeno do regresso do M23 podem estar subjacentes razões ligadas à exploração dos vastos recursos do leste congolês, mas essa ligação, embora tenha sido no passado estabelecida por diversos organismos internacionais, desta feita ainda não foi estabelecida, embora seja provável.

O facto é que Kinshasa acusa o Ruanda de apoiar o M23 fornecendo apoio logístico e território como base e estes guerrilheiros actuam numa região onde a exploração do subsolo tem uma importância estratégica global...

E a expulsão das populações camponesas é uma das estratégias mais comuns por estes grupos que exploram recursos naturais nesta área dos Grandes Lagos, e, para já, estão a ser bem sucedidos, porque só nos últimos três meses os homens do M23 já obrigaram mais de 50 mil pessoas a passarem a fronteira para o Uganda, sendo que largos milhares de outros optaram por deixar a área para procurarem refúgio mais a sul, fora da área de acção do Movimento 23 de Março.

Para a Cimeira de Luanda que está a ser preparada pela Presidência angolana e da CIRGL, este caso está a ganhar maior gravidade à medida que o tempo passa, como o atesta o facto de as FARDC estarem a acusar directamente o Exército ruandês de estar a actuar no leste da RDC e, em Goma, a capital do Kivu Norte, o general congolês Sylvain Ekenge, porta-voz do governador provincial, acusou directamente as forças ruandesas de estarem a intervir directamente nos combates que opõem as FARDC e o M23 "violando as fronteiras e a integridade do território da RDC".

Entretanto, em comunicado, o M23 já veio assumir oficialmente o controlo da cidade de Bunagana.

O presidente da Comissão Africana da União Africana, Moussa Faki Mahamat, exigiu, no Domingo, um imediato cessar-fogo e que os dois países enveredem por procurra uma solução negociada e pacífica.

Apesar de pressionado pelas eleições gerais de 24 de Agosto, o Presidente angolano terá uma palavra a dizer neste processo de evitar um agravamento da situação no país vizinho, com quem Angola tem mais de 2.500 kms de fronteira comum.