Com cada vez mais homens em idade militar a fugirem do recrutamento obrigatório, o regime de Kiev viu-se obrigado a criar unidades militarizadas para capturar os jovens em plena rua ou nas suas casas, levando a confrontos com os populares que os tentam proteger.

Esta informação está disponível em todas as redes sociais, onde cada vez mais casos de violência aparecem registados em vídeo, seja no momento da captura de jovens para a recruta, seja porque os grupos de populares organizados nas localidades enfrentam as unidades de captura de recrutas.

Depois de meses em que este fenómeno cresce diariamente na Ucrânia, e a aumentar, com cada vez mais vídeos onde surgem corpos de jovens que morreram a tentar fugir da mobilização forçada para a Europa ocidental, o tema chega finalmente à imprensa ocidental.

Pela primeira vez, depois de meses em que o tema está a ser fortemente debatido nas redes sociais, a questão da mobilização forçada de jovens ucranianos que procuram fugir às trincheiras aparece nas páginas de um grande jornal europeu, o britânico The Guardian.

Também na Rússia, como foi repetidamente noticiado no início da invasão, a 24 de Fevereiro de 2022, milhares de jovens saíram do país, como todos os grandes canais de tv e jornais internacionais ocidentais noticiaram na altura.

Mas desta vez, quando o fenómeno decorre na Ucrânia, depois de o Governo de Kiev ter feito aprovar uma nova lei de mobilização forçada, por falta de voluntários e de escassez de recursos humanos para as trincheiras, para substituir as centenas de milhares de baixas, o tema tem sido sobejamente relatado nas redes sociais e nos media russos, mas nada de cobertura no ocidente.

Até hoje, com The Guardian, o mais relevante jornal britânico e um dos mais influentes no mundo, a trazer o assunto para as suas páginas, através de um longo artigo do seu correspondente em Kiev, Shaun Walker, que conta de força esmiuçada o dia a dia dos jovens que tentam escapar à morte nas trincheiras e os elementos das equipas de captura.

Conta o jornalista britânico que estas equipas de captura de recrutas em fuga, que não se apresentaram nos centros de recrutamento depois de emitido o aviso oficial, correm todo o país a identificar todos os potencialmente mobilizáveis.

Apesar de ser a primeira vez que este assunto chega com esta profundidade à imprensa ocidental, é aqui contada com suavidade e do lado dos elementos das unidades de recrutamento forçado, embora seja visível na reportagem o sofrimento de "presas" e "predadores".

Mas de fora deste trabalho jornalístico, que tem a virtude de pela primeira vez trazer o assunto para o público ocidental, ficam as imagens dos jovens mortos, da pressão feita pelo Exército para impedir a fuga, da forma como os guardas de fronteira da Roménia e da Polónia, ou da Hungria, já incluíram nas suas rotinas a procura de corpos de jovens ucranianos em fuga da guerra.

BIden, Macron e Zelensky "desembarcam" na Normandia... da Ucrânia

O momento das celebrações do 80º aniversário do Dia D, que assinala o desembarque das tropas aliadas no norte de França, nas famosas praias da Normandia, foi aproveitado pelos Presidente dos EUA, Joe Biden, da França, Emmanuel Macron, e da Ucrânia, Volodymyr

Joe Biden, num inflamado discurso perante milhares de pessoas e centenas de veteranos do desembarque aliado, a 06 de Junho de 1944, para expulsar as tropas da Alemanha nazi, disse que os EUA não vão abandonar a Ucrânia como não abandonaram a Europa ocupada por Hitler na II Guerra Mundial.

E Volodymyr Zelensky, que hoje, sexta-feira, 07, discursa na Assembleia Nacional francesa, disse no mesmo local onde Biden e Macron falaram, que se os aliados lutaram pela liberdade e pela democracia na II Guerra Mundial, os ucranianos estão a defender os mesmos valores ao combater os russos.

O Presidente ucraniano, num momento claramente preparado para as câmaras, em conversa com um veterano norte-americano do Dia D, ouviu deste que o considerava "um herói" e um "salvador do povo".

O momento foi retratado pelos media ocidentais como "muito emocional" embora tenha sido evidente que se tratou de um momento preparado para sevir as relações públicas de Kiev e do seu esforço de guerra contra a invasão russa.

O que não foi muito diferente do que fez Joe Biden ao dedicar o grosso do seu discurso à guerra na Ucrânia, reiterando que os Estados Unidos não vão abandonar os ucranianos até à derrota completa da Rússia.

"Rendermo-nos e vergarmo-nos a ditadores é absolutamente impensável", atirou Biden, justificando que tal cedência seria "esquecer completamente o que se passou nas praia da Normandia há 80 anos".

E repetiu a ideia de que Putin não parará na Ucrânia se vencer: Não deixaremos sozinhos os ucranianos, porque se o fizéssemos, seriam subjugados e os russos não iriam parar por ali", reiterando a ideia de que Moscovo tem planos para invadir a Europa Ocidental, possibilidade que o chefe do Kremlin já disse que "só alguém burro como uma mesa poderia ter essa ideia".

E sobre a repetição da acusação de ditador de Joe Biden a Vladimir Putin, que se tem vindo a repetir há anos, mesmo antes da invasão russa, o Kremlin já reagiu, pelo seu porta-voz Dmitri Peskov, que disse que o Presidente russo "nunca descerá ao nível" do americano.

"Peskov voltou a usar os mesmos termos a que recorreu já noutras ocasiões similares, como quando, em Fevereiro, disse que o chefe do Kremlin era um "maluco filho da p...", afirmando que "as declarações do Presidente dos EUA sobre Putin apenas afectam a sua própria reputação"

Também Macron aproveitou o momento das celebrações do Dia D para focar as atenções na Ucrânia, salientando a "coragem" dos ucranianos que lutam pela liberdade contra os russos: "Obrigado ao povo ucraniano pela sua bravura. Não seremos fracos perante os desafios".

A Federação Russa não foi convidada para estas celebrações mesmo sabendo-se que sem o seu esforço, mais de 30 milhões de mortos, segundo os últimos dados conhecidos, e a vitória sobre as forças nazis que invadiram a então URSS, e a conquista das vastas regiões do leste europeu até Berlin, não haveria sequer Dia D na Normandia.

Submarino nuclear na costa dos EUA...

Entretanto, depois de em Moscovo as autoridades russas, desde o ministro dos Negócios Estrangeiros, Sergei Lavrov, o mais respeitado politico russo depois do próprio Presidente Putin, que também o afirmou, terem avisado para uma possível resposta assimétrica à escalada ocidental na Ucrânia, uma poderosa frota nuclear russa estaciona a escassas milhas da costa dos EUA.

Um dos mais poderosos submarinos nucleares russos e três navios de superfície estão a chegar ao porto de Havana, Cuba, naquilo que o Governo cubano define como uma visita de rotina no contexto das boas relações entre os dois países.

Só que, se é verdade que Rússia e Cuba são dois velhos amigos, não é menos relevante que entre esta frota estarem navios com capacidade nuclear, incluindo o submarino nuclear Kazan, que alegadamente já dispõe, além dos convencionais Oniks e Kalibr, o míssil hipersónico Tsirkon, com capacidade de transportar ogivas nucleares.

E ainda igualmente relevante é que esta deslocação de uma importante frota para um porto que dista a menos de 200 kms da costa norte-americana ocorre quando a Rússia e os EUA estão no seu pior momento desde a Guerra Fria, tendo mesmo, recentemente, e pela primeira vez, o Kremlin tratado os norte-americanos como "inimigos".

Todavia, o ministro cubano dos Negócios Estrangeiros já veio a público garantir que nenhum dos navios que devem aportar a Havana entre 12 e 17 deste mês, transporta quaisquer armas nucleares, sejam misseis ou torpedos.

"É uma visita que corresponde à amizade histórica entre Cuba e a Rússia e tem total aderências aos regulamentos internacionais aplicáveis", disse Bruno Rodriguez Parrilla, acrescentando que a sua presença "não representa quaisquer riscos para a região".

Só que é difícil de ignorar que ainda esta semana o Presidente russo afirmou que a resposta de Moscovo à autorização dos EUA, Reino Unido e França de uso dos seus misseis para atacar alvos no interior da Rússia poderia ser "assimétrica", já depois de ter dito que interesses destes países, embora dirigindo-se especialmente aos britânicos, poderiam ser atingidos em qualquer parte do mundo.

Contexto da guerra na Ucrânia

A 24 de Fevereiro as forças russas iniciaram a invasão da Ucrânia por vários pontos, tendo o Presidente russo dito que se tratava de uma "operação militar especial", sublinhando que o objectivo não era a ocupação do país vizinho.

Condição que evoluiu depois para a anexação de territórios no Donbass mas também as regiões de Kherson e Zaporijia, mantendo como objectivos a desmilitarização e desnazificação da Ucrânia e assegurar que Kiev não insiste na adesão à NATO, o que Moscovo considera parte das suas garantias vitais de segurança nacional.

O Kremlin critica há vários anos fortemente o avanço da NATO para junto das suas fronteiras, agregando os antigos membros do Pacto de Varsóvia, organização que também colapsou com a extinção da URSS, em 1991.

Moscovo visa ainda garantir o reconhecimento de Kiev da soberania russa da Península da Crimeia, invadida e integrada na Rússia, depois de um referendo, em 2014, e ainda a independência das duas repúblicas do Donbass, a de Donetsk e de Lugansk, de maioria russófila, que o Kremlin já reconheceu em Fevereiro, tendo acrescido a esta reivindicação as províncias de Kherson e Zaporijia, depois da realização de referendos que a comunidade internacional, quase em uníssono, não reconhece.

Do lado ucraniano, a visão é totalmente distinta e Putin é acusado de estar a querer reintegrar a Ucrânia na Rússia como forma de reconstruir o "império soviético", que se desmoronou em 1991, com o colapso da União Soviética.

Kiev insiste que a Ucrânia é una e indivisível e que não haverá cedências territoriais como forma de acordar a paz com Moscovo, sendo, para o Presidente Volodymyr Zelensky, essencial o continuado apoio militar da NATO para expulsar as forças invasoras.

A organização militar da Aliança Atlântica está a ser, entretanto, acusada por Moscovo de estar a desenrolar uma guerra com a Rússia por procuração passada ao Exército ucraniano, o que eleva, segundo o ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Sergei Lavrov, o risco de se avançar para a III Guerra Mundial, com um confronto directo entre a Federação Russa e a NATO, que tanto o Presidente dos EUA, Joe Biden, como o Presidente Vladimir Putin, da Rússia, já admitiram que se isso acontecer é inevitável o recurso ao devastador arsenal nuclear dos dois lados desta barricada que levaria ao colapso da humanidade tal como a conhecemos.

Esta guerra na Ucrânia contou com a condenação generalizada da comunidade internacional, tendo a União Europeia e a NATO assumido a linha da frente da contestação à "operação especial" de Putin, que se materializou através de bombardeamentos das principais cidades, por meio de ataques aéreos, lançamento de misseis de cruzeiro e artilharia pesada, e com volumosas colunas militares a cercarem os grandes centros urbanos do país, mas que agora está concentrada no leste e sudeste da Ucrânia.

Na reacção, além da resistência ucraniana, Moscovo contou com o maior pacote de sanções aplicadas a um país, que está a causar danos avultados à sua economia, sendo disso exemplo a queda da sua moeda nacional, o rublo, que chegou a ser superior a 60%, embora já tenha, entretanto, recuperado.

Estas sanções, que já levaram as grandes marcas mundiais a deixar a Rússia, como as 850 lojas da McDonalds, a mais simbólica, abrangem ainda os seus desportistas, artistas, homens de negócios, a banca e grande parte das suas exportações, com destaque para o sector energético, do gás natural e petróleo...

Milhares de mortos e feridos e mais de 6,5 milhões de refugiados nos países vizinhos da Ucrânia são a parte visível deste desastre humanitário.