O autor da coluna Epístolas do Ocidente conta-nos que escreve, para o matutino angolano, textos com cerca de 700 palavras (esta crónica, por exemplo, tem 745 palavras) e, mesmo assim, recebe queixas de jovens leitores que os consideram longos. "Não demasiado difíceis. Apenas longos". A frase é sintomática. Mostra como o hábito da leitura tem vindo a desaparecer entre as novas gerações, mesmo entre as que se dizem motivadas e desejosas de seguir carreiras no jornalismo ou na comunicação estratégica (comunicação empresarial, se quisermos). O peso do livro, do parágrafo bem construído, da ideia encadeada tornou-se fardo num tempo em que reinaram os "reels", os "memes" e os "swipes" contínuos.
Essa constatação leva-nos a uma outra, igualmente séria: o empobrecimento da formação intelectual. Sousa Jamba traça um paralelo entre os seus anos de estudo em Inglaterra, onde "viver praticamente na biblioteca" era regra, e a experiência de ensino em Angola, onde muitos estudantes têm uma atitude de pânico quando confrontados com uma bibliografia densa. No Huambo, o ritual académico não era "ir à biblioteca", mas "ir à estufa" - memorizar para desembaular num teste e depois esquecer.
Convém, aqui, relacionar esta análise com um olhar histórico. O jornalismo em Angola teve um papel decisivo na vida intelectual do País. Desde a chegada da primeira prensa, em 1845, Angola conheceu, entre 1860 e 1900, cerca de cinquenta publicações. Era um tempo de intenso debate cultural, político e literário. Títulos como A Civilização da África Portuguesa, de 1886, e o Jornal de Luanda, de 1878, dirigido por Alfredo Troni, marcaram o surgimento de um jornalismo de tintas nacionalistas.
O Ecos de Angola, fundado em 1881, publicado durante vinte anos, foi o primeiro jornal dirigido por africanos no País. A imprensa não era apenas espaço de informação: era o único lugar de circulação de ideias, formação de opinião e consolidação de pensamento crítico. A leitura dos jornais era uma porta para a emancipação política e social. Um artigo não era um luxo intelectual; era um acto de resistência. Uma forma de entrar no mundo.
Sousa Jamba, ao insistir que continuará a escrever ensaios de 700 palavras, fá-lo por dever cívico e por coerência intelectual. A sua evocação dos mestres - David Cardiff, Colin Sparks, entre outros - é um tributo a uma geração de académicos que formava leitores antes de formar escritores. E essa é a diferença: só quem lê com profundidade escreve com densidade. O inverso não é verdadeiro. É esta a lição que muitos jovens, e demais faixas etárias, devem aprender.
Hoje, porém, é preciso reconhecer um novo cenário. Apesar da proliferação de redes sociais, a imprensa escrita continua a ser um dos poucos espaços onde se resiste ao empobrecimento do discurso. Em Angola, esse combate tem raízes antigas. Entre 1901 e 1902 surgem textos notáveis, como a colectânea Voz d"Angola - clamando no deserto e a revista Luz e Crença, que faziam apelos claros à emancipação política. O jornalismo angolano, mesmo sob censura, foi uma escola de pensamento.
Esse legado precisa de ser resgatado. A leitura de jornais - e, em particular, de artigos de opinião bem escritos - pode ter o mesmo efeito transformador que outrora tiveram as obras literárias ou os panfletos revolucionários. Os jovens, e não só, precisam de voltar a esses espaços. Não para acumular informação. Mas para exercitar a mente, formar espírito crítico, interrogar o mundo. A leitura deve voltar a ser um acto quotidiano, em todas as idades, e não uma excepção académica.
Em suma, não basta assistir ao desfile de becas. É preciso que as bibliotecas voltem a ser ocupadas. Que os jovens leiam, interroguem e reescrevam o País. A leitura é o primeiro passo para o pensamento livre. E um povo que não pensa livremente não se governa - apenas se obedece. Não há diploma que substitua um livro lido com atenção. Nem futuro que resista sem ideias.

*Mestre em Linguística pela Universidade Agostinho Neto