Este é o segundo ano em que festejo o Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas em Angola. Quase um ano depois da minha chegada a Angola, depois do primeiro 10 de Junho celebrado em pandemia, numa altura em que estávamos todos assustados, quase mesmo desorientados com os tempos que vivíamos, com um pesadelo que se instalou e que nos paralisava e adiava o presente, fui, como todos, apanhado de surpresa por esta pandemia da Covid-19, que continua presente entre nós e que a todos obrigou a adoptar novos comportamentos sociais e métodos de trabalho. Mas que não nos fez cruzar os braços.

No ano passado, a tradicional festa de Portugal, que mobiliza uma imensidão de portugueses, luso-angolanos e angolanos, que mobiliza também uma profusão de sentimentos, foi celebrada de uma forma simbólica com a oferta de mais do que uma tonelada de medicamentos e material de biossegurança, um sinal da solidariedade efectiva, real, concreta das empresas portuguesas, da comunidade portuguesa e de Portugal. Um importante resultado do esforço combinado de um conjunto alargado de empresas portuguesas e luso-angolanas presentes neste mercado nos mais diversos sectores de actividade. As mesmas que criam alianças e parcerias, as mesmas que criam milhares e milhares de empregos para angolanos, e cuja actividade vai mais além do que o mero negócio com os seus programas de responsabilidade social. Que fazem a diferença para milhares de angolanos e suas famílias.

Nunca é demais louvar as medidas de prevenção e combate à Covid-19, que o Executivo angolano tão bem tem conduzido, e reafirmar a esperança de que as campanhas de vacinação em curso sejam bem-sucedidas e abranjam o maior número possível de pessoas.

Sabendo da importância e urgência em se conseguir um maior equilíbrio na distribuição de vacinas a nível global, assim contribuindo para uma recuperação da crise pandémica e económica mais rápida e sincronizada, Portugal tem, incluindo no quadro da Presidência Portuguesa do Conselho da União Europeia, trabalhado afincadamente para este fim, para reforçar o compromisso europeu com os parceiros africanos nesta matéria. De resto, as autoridades portuguesas já anunciaram a nossa intenção de atribuir 5% das vacinas nacionais aos nossos parceiros de cooperação, sendo um dos principais Angola.

Um sinal de que, perante esta pandemia, que nos trouxe o medo e também a coragem de viver com esse medo, Portugal está sempre presente e atento aos países amigos. Porque essa é uma relação entre países, mas também entre cidadãos, que se conhecem e confiam.

O Dia de Portugal será sempre o nosso dia, com ou sem pandemia, na certeza de que somos um país com séculos de existência, com uma história e cultura partilhada com outros países. Celebrando Camões, celebramos um poeta maior, numa língua cada vez mais global e que atrai a atenção e interesse de tantos pelo mundo fora. Celebramos também a Comunidade portuguesa, aquela que, como os ventos, se espalha por todo o mundo, guardando a alma da portugalidade, ao mesmo tempo que se integram nas sociedades de acolhimento e partilham a criação de futuro nesses países.

Celebramos a Portugalidade nas suas mais diversas dimensões, sem visões redutoras, um Portugal que acolhe, integra e avança. Que convive com a sua dimensão europeia, com a sua dimensão africana, com a sua dimensão ibero-americana, que defende o multilateralismo, que defende os Direitos Humanos, a Democracia e o Estado de Direito. E Portugal, somos todos os que fazemos acontecer esta alma lusa, em que todos cabem, incluindo aqueles que escolhem o nosso país para viver.

E hoje é destes portugueses que falamos. Dos que vivem fora do seu país, mas que sabem que ele é seu, que fazem parcerias com os outros partilhando os projectos de desenvolvimento de futuro. Para os portugueses, assim são as heranças... que não devem ficar guardadas em gavetas, mas, sim, só fazem sentido quando essas mesmas heranças fazem parte de projectos de futuro. Só assim vale a pena!

Uma comunidade de que nos orgulhamos. Tanto em Luanda, como no resto do País, uma comunidade trabalhadora, dinâmica, resiliente e solidária. Assim tem sido, e assim se tem mostrado aos outros. Apesar de todos os condicionalismos da pandemia, mas também por causa deles, o Estado português, em estreita cooperação com as autoridades angolanas, foi ao encontro das expectativas de muitos concidadãos portugueses, com a recente inauguração de um Consulado Honorário no Lubango e que permitirá dar um apoio mais próximo aos portugueses residentes naquela região.

Este ano, marcamos de novo o 10 de Junho, vivendo tempos que nos desafiam a ser mais e melhores, mais atentos e mais criativos.

Vamos mais uma vez além das meras palavras protocolares, ao organizarmos, em parceria com o Instituto Nacional de Sangue de Angola, uma campanha de doação de sangue. Conscientes de que Angola necessita de 300 mil doações voluntárias por ano, queremos, com este gesto, contribuir para salvar vidas em Angola. Fazemo-lo em Luanda, mas também em Benguela e Lubango, nos respectivos Hospitais Centrais, numa parceria entre aqueles estabelecimentos hospitalares e o Consulado-Geral de Portugal em Benguela.

Que não restem dúvidas: Esta campanha de doação de sangue procura, de forma muito concreta, valorizar a cooperação entre os dois países e demonstrar a solidariedade dos portugueses para com o povo angolano e retribuir, mais uma vez, um pouco do tanto que este país nos tem dado.

Esta nossa relação, esta nossa cooperação é do tamanho e tem a ambição que ambos os países querem: assenta numa relação bilateral de cumplicidade e de excelência, em valores comuns e numa sólida amizade entre dois povos, e que se estende a todos os domínios de acção, como a saúde, educação, cultura, ambiente, segurança e defesa, justiça, economia, ensino superior, ciência e tecnologia, agricultura e pescas, energia, modernização administrativa, finanças, entre muitas outras. Esta é a riqueza da nossa relação que se tem vindo a aprofundar ainda mais nos últimos anos, numa lógica de interesses comuns e benefícios mútuos, sendo Portugal também um parceiro central na implementação de projectos de cooperação da União Europeia com Angola, nomeadamente em matéria de combate à fome, seca e alterações climáticas, mas também na área do combate ao desemprego e apoio à formação profissional.

Uma relação única que vai além da assinatura de mais de 35 instrumentos jurídicos de cooperação e da realização das três visitas de alto nível entre os dois países pouco antes de chegar a pandemia, o que só demonstra a densidade e o dinamismo do nosso relacionamento, cujos laços de cumplicidade irão perdurar para além de quaisquer vicissitudes. Um inequívoco sinal de confiança e de conhecimento mútuo.

Quero hoje aqui transmitir uma palavra de agradecimento e reconhecimento também a todos os profissionais de saúde que se encontram na linha da frente do combate à pandemia da Covid-19, médicos, enfermeiros, cuidadores, auxiliares e investigadores que, incluindo na Diáspora portuguesa e em Angola igualmente, têm sido incansáveis no seu esforço, a eles se devendo parte do caminho feito no regresso à normalidade.

Partilhar é sempre bom. Partilhar o que temos é sempre um sinal de amizade e, quando se trata de sangue, até de altruísmo. Esta é a verdade... para os portugueses quando se fala de Angola, "Apoiar, dar, partilhar" ... está-nos tudo no sangue.

*Embaixador de Portugal em Angola