Há um modelo primário que serve de base para os demais e depois tudo funciona em cadeia, seguindo orientações dimanadas pelas diferentes estruturas. Quando hoje as pessoas chamam a TV Zimbo de TPA 3, não é feito de forma inocente, é porque passam a ter a percepção de que a "televisão que veio para mudar a televisão em Angola", desde que passou para a esfera do Estado, se tornou numa réplica da principal estação pública de televisão.

A máquina e a mobilização mediática, bem como os excessivos tempos de antena em torno de um cidadão que pretende saber junto da PGR se a sua queixa-crime tinha ou não "pernas para andar" são bem reveladores de um sistema que vai clonando certas "ovelhas", criando o seu próprio rebanho e dando-lhes um bom pasto. Esta aritmética de clones é revelador de um sistema que quer controlar e "clonar" a comunicação/informação, mas é ele próprio o elo mais fraco de todo um sistema de governação. Percebe-se de que faz falta um "comando único" na coordenação.


Existem diferentes estruturas que interferem na estratégia de comunicação, sendo que algumas parecem agir em função de agendas e interesses muito próprios, sendo clones que não muito bem alinhados. Ministério da Comunicação Social, Cidade Alta, DIP do Partido, "Laboratório Central", Inteligências e Turma do Tavares agem, na maior parte das vezes, com agendas muito próprias em torno de um objectivo muito comum: a preservação da imagem e figura do Chefe Máximo e a manutenção do poder. A manutenção do poder (por todos os meios necessários) é a grande prioridade.


É preciso que haja coragem para reconhecer que as nossas prioridades estão muitas vezes invertidas. Temos dificuldades em avaliar o que fazemos e em verificar o que não fazemos. Faz-nos falta uma cultura de avaliação e escrutínio dos políticos e da actividade governativa. Somos seres inquietos por natureza, porque queremos saber o que está para além de nós. É a tal transcendência que devemos desafiar os cidadãos a experimentar. Sair de si, sair das amarras da formatação política e do fundamentalismo ideológico e olhar para além do óbvio, olhar e pensar o País. Se queremos cidadãos com sentido crítico, lúcidos e esclarecidos, que encarem o debate de ideias e a liberdade de expressão como elementos de afirmação democrática, temos de promover e de estimular a aceitação da crítica de diferentes pontos de vista. O desprezo e a desvalorização do pensamento diferente e da opinião divergente são uma trágica realidade que há muitos confortam. É proibido questionar, é proibido escrutinar, é proibido indagar estratégias e prioridades.

A metáfora da "Cabeça de Pobre" do Bispo de Cabinda, Dom Belmiro Chissengueti, é parte integrante da sua missão de auscultar, escrutinar e questionar. As desigualdades, as injustiças e a inversão de prioridades existem e são evidentes aos olhos de todos. O problema é quando as diferenças se tornam desigualdades, e como pode um bispo ficar alheio a tudo isso? E deve ser combatido por isso? Deve ser atacado, rotulado e adjectivado como temos visto nas redes sociais por certos indivíduos e páginas oficiais de estruturas partidárias. Vai funcionando também aqui uma aritmética de clones que, agindo, por um lado, como "virgens ofendidas" e, por outro, em defesa da honra do convento, vão destilando o seu fel contra o agora "bispo maldito, subversivo e hostil ao Regime".


O estado natural do ser humano não é a generosidade, não é o altruísmo, não é o outro. Não! O estado natural é pensar em si primeiro, pensar na sua sobrevivência e na manutenção da espécie. Isso de elevarmo-nos, de sairmos do nosso Eu para ir ao encontro do outro não nos é natural. Esse gesto, essa caminhada em direcção ao outro, a elevação de olhar para o outro como um fim em si mesmo e não como um meio para atingir um fim é onde reside a tal transcendência. É a dimensão da espiritualidade, o desejo de nos transcendermos de alguma forma. Tirando alguma "incontinência verbal", é bom quando certas figuras da sociedade e autoridades morais decidem usar da sua liberdade de expressão para criticar o que está mal e elogiar o que está bem. Toda a crítica surge de uma inquietação profunda, surge da percepção de realidades e factos objectivos. Das delegações governamentais numerosas e dispendiosas, ao custo das ajudas de custo, aos esbanjamentos à custa do Estado até à necessidade de mudarmos o chip (entenda-se paradigma) da governação, Dom Belmiro esteve bem na metáfora da "Cabeça de Pobre".


Ostentamos e esbanjamos, mas somos de uma grande pobreza intelectual, cultural e espiritual. E é que, ao invés de invertermos o cenário, ainda estamos a replicar a "espécie" por via de uma estranha e nociva aritmética dos clones que apenas promove a boçalidade, a mediocridade e a formatação do pensamento.