No artigo 4.º do referido DLP - Classificação dos institutos públicos, tem-se que "os institutos públicos assumem uma das seguintes formas no momento da sua criação: a) Serviços Personalizados, sempre que se tratar de serviços públicos administrativos dotados de personalidade jurídica e autonomia administrativa como forma de melhor assegurar a prossecução das atribuições do órgão da administração directa do Estado em que se insere; b) Estabelecimentos Públicos, sempre que se tratar de instituições públicas administrativas abertas ao público dotadas de personalidade jurídica, autonomia administrativa, financeira e patrimonial vocacionadas a prestar serviços sociais individuais ou colectivos, mediante contraprestação, comparticipação ou de forma gratuita, nos domínios do ensino, saúde, arte, desporto, assistência às pessoas com deficiência, formação profissional, protecção dos consumidores, apoio às vítimas, famílias, crianças e jovens, dentre outros; c) Fundações Públicas, sempre que se tratar de patrimónios públicos autónomos, dotados de personalidade jurídica, autonomia administrativa, financeira e patrimonial, para a prossecução de fins específicos de natureza social, nomeadamente, nos domínios da educação, investigação científica, saúde, cultura, assistência social e preservação ambiental; d) Fundos Públicos, sempre que se tratar de patrimónios públicos autónomos, dotados de personalidade jurídica, autonomia administrativa, financeira e patrimonial especificamente criados para prossecução de determinados fins públicos de natureza económica, nomeadamente nos domínios do fomento do desenvolvimento económico e social, manutenção e conservação de infra-estruturas e da estabilização económica".


Acontece que os fundos públicos que se constituem especificamente para a prossecução de fins públicos de natureza económica, como a promoção e o fomento de actividades económicas no âmbito de políticas públicas, porque tendem a criar valor e, consequentemente, a reproduzir-se, deveriam - por regra e no rigor da gestão financeira pública, tal como o capital do Estado em empresas - ser tratados como Aplicações Financeiras do Estado. E, enquanto fundos, não era suposto que fossem personalizados e se constituíssem como entes da administração indirecta do Estado enquadrados no sector público administrativo. Por isso, para a sua governação, seria de se considerar órgãos não próprios constituídos por representantes do Ministério das Finanças, do Ministério da Economia e Planeamento e de demais entidades da administração central directa e indirecta do Estado eventualmente ligados aos fins dos mesmos, enquanto para a gestão executiva e operacional se requereria terceirização para entidades profissionais especializadas (entidades gestoras). Na circunstância em que se entendesse conferir-lhes personalidade jurídica, passariam a ser entidades empresariais do sector financeiro e, naturalmente, com órgãos de governação próprios.


Deste modo, o enquadramento de tais Fundos Públicos no domínio dos institutos públicos enquanto entidades da administração indirecta do Estado, feito no DLP citado, mostra-se, do ponto de vista da gestão financeira pública e da sua requerida racionalização, eficácia e eficiência, inadequado. O facto, entretanto, é que tal enquadramento parece ter resultado de uma má cópia da legislação portuguesa, designadamente a sua Lei n.º 3/2004, de 15 de Janeiro - Lei Quadro dos Institutos Públicos. A má qualidade da cópia decorre de se ter eventualmente perdido de vista que nessa lei portuguesa são apenas considerados fundos públicos personalizados, tidos, por isso, como "fundações públicas", sendo que os instrumentos de promoção e fomento da actividade económica do Estado português ou são considerados "entidades públicas empresariais" e, por isso, regulados pelo Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro, ou, no caso de fundos, não são personalizados, tendo sido geridos, até Novembro de 2020, por sociedades de investimento ou financeiras públicas constituídas como entidades públicas empresariais (especificamente a PME Investimentos - Sociedade de Investimento S.A., a IFD - Instituição Financeira de Desenvolvimento S.A. e a SPGM - Sociedade de Investimento S.A.) e daí em diante passaram a ser geridos pelo novel Banco Português de Fomento, S.A., no qual aquelas sociedades se fundiram por incorporação. E o Banco Português de Fomento actua como um grupo, detendo 79,9% da Portugal Capital Ventures - Sociedade de Capital de Risco S.A., 53,2% da TF Turismo Fundos - Sociedade Gestora de Organismos de Investimento Imobiliário S.A., assim como o capital das Sociedades de Garantia Mútua Agrogarante (12,33%), Garval (13,28%), Lisgarante (10,81%) e Norgarante (8,83%).


No âmbito da Disposições Transitórias e Finais do DLP em referência, dispôs-se, no artigo 53.º - Avaliação dos institutos existentes, o como os institutos públicos existentes à data de entrada em vigor do diploma deveriam ser avaliados nos termos dos requisitos nele previstos com vista à sua eventual reestruturação, adequação dos estatutos, fusão, cisão ou extinção. E reservou-se à Casa Civil do Presidente da República a competência de executar tal missão com a participação de entidades especializadas, apresentando os resultados ao Titular do Poder Executivo para decisão, após o parecer da Comissão Interministerial para Reforma do Estado. Passado mais de um ano da entrada em vigor do diploma, sabe-se de alguns desenvolvimentos nesse sentido em relação a alguns Serviços Personalizados e Estabelecimentos Públicos, mas nenhum em relação a Fundações Públicas e muito menos a Fundos Públicos. Apresenta-se, por isso, uma oportunidade para se "corrigir o que está mal" no Decreto Legislativo Presidencial n.º 2/20, de 19 de Fevereiro, permitindo-se que os fundos públicos que se constituíram especificamente para a prossecução de fins públicos de natureza económica, como a promoção e o fomento de actividades económicas, sejam regulados por normas mais consentâneas com a sua natureza e fins. Daí deveria avançar-se para a reestruturação de todo o sistema público de apoio financeiro ao desenvolvimento de actividades económicas no âmbito das políticas públicas de promoção e fomento - em que se incluem as instituições financeiras como o Banco de Desenvolvimento de Angola (BDA) e todos os fundos - na prossecução da sua racionalização, eficácia e eficiência.

E isso mostra-se urgente, pois não reza a história sobre o contributo à diversificação da economia até hoje aportado, por exemplo, pelos "eternos" Fundo de Apoio ao Desenvolvimento Agrícola (FADA), Fundo de Apoio ao Desenvolvimento da Indústria Pesqueira (FADEPA), Fundo de Desenvolvimento do Café (FDC) e Fundo do Projecto Coca-Cola (FPCC) (e, já agora, por que se insistirá que um fundo público publicite uma marca comercial privada?) ou pelos mais recentes Fundo Nacional de Desenvolvimento (FND), Fundo Activo de Capital de Risco Angolano (FACRA) e Fundo de Garantia de Crédito (FGC)... De resto, o tratamento distinto dos fluxos financeiros do Tesouro Nacional com fundos de natureza semelhante no OGE (exclui-se os fundos com natureza de fundação) releva essa necessidade: é que, sem embargo do que o citado DLP estabelece, de um lado estão o Fundo de Fomento Habitacional (FFH), o Fundo de Apoio ao Desenvolvimento da Indústria Pesqueira (FADEPA), o Fundo de Desenvolvimento do Café e o Fundo do Projecto Coca-Cola (FPCC), que figuram como Unidades Orçamentais e, consequentemente, com dotações de recursos como entidades do sector público administrativo, e, do outro, estão o Fundo de Apoio ao Desenvolvimento Agrícola (FADA), o Fundo de Garantia de Crédito (FGC), o Fundo Activo de Capital de Risco Angolano (FACRA), o Fundo Nacional de Desenvolvimento (FND) e o Fundo Soberano de Angola (FSDEA), que não estão tratados como tal...

*Economista