A esse propósito, há alguns aspectos importantes da economia angolana que importa reter: (i) a capacidade de produção interna é reduzida e quase não existem capacidades ociosas, pelo que as importações têm grande rigidez; (ii) as importações do Governo não se mostram sensíveis às depreciações da taxa de câmbio, dado que perto de 60% das suas receitas são denominadas em moeda estrangeira; e (iii) o desenvolvimento da actividade económica interna está constrangido por uma elevada carga burocrática, além de problemas estruturais como é o caso da baixa qualidade das infra-estruturas e da qualificação da mão-de-obra, cuja solução é de médio e longo prazos. Deste modo, a imposição de restrições administrativas na importação de bens de consumo como feita através do Decreto Presidencial n.º 23/19, de 14 de Janeiro, que aprova o "Regulamento da Cadeia Comercial de Oferta de Bens da Cesta Básica e Outros Bens Prioritários de Origem Nacional" contribui para a redução da oferta de tais bens, gerando, no curto prazo, pressões para o aumento dos correspondentes preços. Por outro lado, na circunstância de ocorrência de aumento da oferta monetária que ocasiona um aumento da procura agregada na economia, da limitada capacidade de produção interna, da falta de capacidade ociosa e do condicionamento das importações - o que se traduz em relativa rigidez da oferta -, emergem, no que aos bens de consumo alimentares diz respeito, pressões inflacionistas.
Ora, calcula-se que, entre o 1.º trimestre de 2018 e o 1.º trimestre de 2021, a taxa de crescimento homóloga trimestral média da produção Agro-pecuária, Silvícola e Pesqueira foi de 3,1%, enquanto a taxa média homóloga trimestral de variação das importações de Bens Alimentares foi de uma redução de 18,1%. E nesse período a taxa de inflação homóloga passou de 20,9%, no 1.º trimestre de 2018, para 24,8%, no 1.º trimestre de 2021, com uma média homóloga trimestral de 20,7%. A Base Monetária nesse período aumentou em 47,1%, tendo a média trimestral homóloga sido de um aumento de 22,4%. O coeficiente de correlação calculado entre a Taxa de Inflação Homóloga e a Taxa de Variação da Base Monetária trimestral homóloga (com desfasamento de 3 trimestres) foi de 71,6%. Portanto, os crescentes níveis de inflação homóloga que se registam sobretudo a partir do 3.º trimestre de 2019, com incidência sobre bens de consumo final e alimentares, estarão associados a uma expansão da Base Monetária e a limitações de oferta.
Assim, o principal problema que se apresenta para as famílias está na erosão contínua do poder de compra dos seus rendimentos pelos elevados níveis de inflação. Deste modo, a suspensão da cobrança dos direitos aduaneiros sobre os produtos ora identificados - um evento único - não constituirá solução para o problema da inflação. E deste modo, é grande o risco de o montante que o Estado deixará de arrecadar de direitos aduaneiros virem a constituir margem adicional a ser capturada pelos comerciantes tendo em atenção o preço de equilíbrio de mercado que poderá não variar...
Nota: os pontos de vista expressos neste artigo engajam apenas o seu autor.