Quando comecei a dedicar-me a questões do desenvolvimento agrícola ou do desenvolvimento em geral, e principalmente quando percebi o modo como se tem encarado o desenvolvimento depois da independência, concluí que a Lei de Liebig se aplicava ao seu equacionamento como uma luva.

Na verdade, a atracção pela modernização acelerada da economia e da sociedade - que haveria de se revelar fatal e explicar a situação que vivemos -, tanto no tempo em que se pretendia construir o socialismo, como mais tarde no capitalismo adoptado, teve como vector comum a ideia de projecto grandioso ao estilo "soviético" que serviu de referência nos primeiros tempos e que não mais seria abandonado. Obras de infra-estrutura grandiosas e vistosas, para as quais não havia capacidade de gestão e de manutenção. Complexos agrários, fábricas, o Mausoléu de Agostinho Neto, na primeira fase, centralidades, aeroportos, pólos industriais e agro-industriais, mais recentemente, todos tiveram em comum dificuldades de gestão e de manutenção e, na maior parte dos casos, tiveram efeitos perversos e entraram em decadência e falência.

Este desejo de modernização acelerada não é domínio exclusivo da classe governante e política. Ela atravessa praticamente toda a sociedade. Daí que não se notem críticas nesse sentido por parte da oposição nem da maioria dos analistas, mesmo quando se manifestam contra políticas ou medidas adoptadas ou implementadas pelo Executivo.

Isto resulta da concepção errada de desenvolvimento que predomina no País e tem duas origens: uma de carácter endógeno, que reflecte um preconceito comum aos países africanos no pós-colonialismo, o de julgarem possível atingir, em pouco tempo, os considerados "níveis de desenvolvimento" das antigas metrópoles ou potências coloniais; outra de carácter exógeno, induzido pela ideia de construção do socialismo, tomando como referência o modelo em vigor na antiga União Soviética e seus aliados, e, mais tarde, na China, depois da ascensão de Deng Xiao Ping ao poder.

De acordo com essa concepção de desenvolvimento, que não difere do paradigma da pobreza em que se basearam os modelos produtivistas dos anos 60 e 70, que faliram em África e noutros continentes ainda nos anos 80, sendo substituídos por outros (como os que inspiraram os ajustamentos estruturais então impostos a muitos países africanos) que não tiveram melhor sorte, o "desenvolvimento" é uma meta, pode (e em casos extremos há quem defenda que deve) ser transmitido por especialistas (o que explica o recurso exagerado a expatriados), é feito para o povo, ou para o "nosso povo", como dizem os governantes angolanos, tem no projecto, e isso é fundamental, a sua chave (daí derivam as dispendiosas consultorias e as dependências em relação às agência internacionais e o aumento da dívida externa) e a participação das pessoas ou cidadãos não passa de um meio, ou de um artifício, para se conseguir o projecto ou prometer o seu sucesso.

Este entendimento de desenvolvimento merece ser analisado à luz da Lei de Liebieg ou do Mínimo. Um projecto pode ter quase tudo para dar certo, desde o financiamento (interno ou externo), know how (de expatriados ou nacionais), mas, se faltar um factor, um só, não vai ter sucesso. Por exemplo, o Executivo pode fornecer os 500 tractores aos antigos combatentes, mas não pode garantir os outros factores necessários para que os tractores tenham eficácia e muito menos eficiência. Não existem terrenos desmatados em quantidade suficiente, não pode garantir combustível (atenção à esperada subida do seu preço), nem tractoristas, nem peças de reposição, nem mecânicos, nem organização, nem capacidade para resolver eventuais conflitos de gestão que emergem nessas circunstâncias, como são as "invejas", entre outros, tal como já está a acontecer. Isto é, neste caso são vários os factores que podem actuar como limitantes do projecto.

Tal raciocínio pode ser aplicado, igualmente, ao projectado metro de superfície para a solução do problema da mobilidade na cidade de Luanda. Pergunto-me se os projectistas consideraram um factor limitante de peso: os comportamentos dos futuros utentes e de uma parte da população que actua na envolvente da futura infra-estrutura. Com demasiada frequência, ouvimos notícias sobre roubos e sabotagens de cabos eléctricos de transporte de energia ou de material dos carris das linhas férreas ou de carruagens. Esses problemas, tal como outros de que se queixam os empresários, como roubos nas fazendas e não só, ou queimadas, não constituem meros casos de polícia, antes são reflexo das péssimas políticas sociais ao longo de todos estes anos, que fazem aumentar a pobreza, as desigualdades e os preconceitos raciais.

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