Para criticar as diferentes lideranças, denunciar perseguições e exclusões, nepotismo, falta de lisura ou de transparência em certos processos eleitorais, seja no Facebook, Instagram, WhatsApp ou Twitter, os críticos internos usam as plataformas virtuais, a fim de lamentar situações reais do seu "Glorioso MPLA". Trata-se de um debate ideológico com recurso a meios tecnológicos, que vai crescendo nas redes sociais e acaba por colocar dois lados em confronto: O MPLA real versus o MPLA virtual! Esses últimos alegam que as estruturas do partido não permitem abertura suficiente para o debate de ideias, projectos ou alternativas. Não cria vasos comunicantes, não estabelece espaços para debater o contraditório, sendo as redes sociais a alternativa ou espaço de excelência para manifestarem o descontentamento ou discordância em relação às actuais lideranças.

As conferências provinciais do MPLA em Luanda, Kwanza-Sul, Kuando-Kubango e Malanje são exemplos práticos de que agora é no meio virtual onde muitos militantes encontraram o seu "muro das lamentações", na ausência de espaços nos órgãos ou nas estruturas internas que deviam "provocar", estimular e promover o debate real e a liberdade de expressão. Verdade seja dita, também muitos desses "lamentos" acabam em debates sem elevação, com muitos insultos, pouco equilibrado, até certo ponto intolerante e muito para os extremos.


O partido que governa o País há 46 anos tem, perante si, um novo desafio em termos de disciplina partidária. Desde que as redes sociais surgiram, muitas das suas estruturas e lideranças partidárias passaram a ter dificuldades em compreendê-las e em lidar com elas. Há sectores dentro do partido que olham para as redes sociais como um inimigo das ideologias e da disciplina partidária. Dentro de certas estruturas do MPLA, as redes sociais sempre foram vistas não como um espaço de liberdade, mas, sim, como um espaço com certa libertinagem, com poucas regras, pouco disciplinado e difícil de controlar.

O partido no poder passou a estabelecer uma relação agridoce com este mundo virtual. Quando teve de as aceitar como facto incontornável, em resultado das novas dinâmicas comunicacionais, do seu poder e alcance, acabou também por criar milícias para vigiar, controlar e seguir os seus militantes nas redes sociais, fazendo o mesmo com os seus adversários políticos. Uma vaga de "milícias digitais" e "CAP`s virtuais" surgiram para cumprir com zelo e fidelidade canina todas as orientações para rastrear, acompanhar e controlar tudo quanto era publicado, comentado e debatido. E foi aqui onde muitos militantes encontraram um espaço para quebrar regras ou protocolos, a fim de desafiar estatutos e até colocar em xeque a então rígida disciplina partidária.


Este aviso à navegação virtual que João Lourenço fez numa das reuniões extraordinárias do Comité Central do MPLA, em inícios de 2019, e que cito no início deste texto, demonstra uma preocupação antiga com os "revus virtuais", que se movem livremente por um espaço difícil de controlar, demasiado solto, fazendo opinião, debatendo publicamente assuntos internos do partido, desafiando as lideranças, questionando as suas políticas e revelando estratégias internas perante milhares de seguidores que têm hoje nas plataformas digitais.


É preciso, também, que o MPLA perceba que há uma nova geração de militantes que vai mostrando alguma resistência em aceitar o funcionamento da sua maquina partidária (e esse já vem desde os tempos da liderança de José Eduardo dos Santos), que reage de forma activa à ausência de espaços de liberdade de expressão no interior das estruturas partidárias, que recusa certas formatações, que recusa certos fanatismos, não é muita, dada as ideologias utópicas e que já não alinha em certos cultos de personalidade. É essa geração que, quando não encontra espaços ou liberdades no interior das estruturas partidárias, acaba por criar espaços, canais e alternativas neste novo mundo virtual para questionar o poder real. Faz das redes sociais o seu novo muro das lamentações.


Quanto mais a política partidária for um palco de vaidades, de combate de egos, de intolerância democrática, de radicalismos e de afirmação do poder pelo poder, de afirmação de interesses de grupos, de ausências de estruturas internas para o debate de ideias e do contraditório, enquanto for tudo isso e mais alguma coisa, mais espaço vai-se criando para que as redes sociais se tornem o verdadeiro muro das lamentações dos seus militantes. Nos últimos tempos, as redes sociais têm sido também o muro das lamentações para dirigentes, militantes e simpatizantes da UNITA numa guerra de argumentos e discursos inflamados para enfrentar a crise de liderança e confrontos de correntes internas.

É claro que tudo isso é revelador de certa fragilidade estrutural, de níveis muito baixos de cultura democrática e de canais adequados para a expressão de liberdade de expressão e de opinião na nossa política partidária. Enquanto isso, as redes sociais vão sendo o novo muro das lamentações.