As chamadas florestas subterrâneas da família "Geoxyle" (geoxilas), ou também chamadas Anharas de Ongote, e as zonas húmidas adjacentes estão localizadas no centro de Angola e sofrem, neste momento, um grande impacto, devido ao aumento da produção agrícola na área. Essas evoluíram para árvores subterrâneas devido ao impacto de incêndios e de frio intenso ocorrido ao longo de milhares de anos, realocando os seus caules e galhos subterraneamente, e estando apenas as folhas, flores e frutos acima do solo. Muitas espécies seguiram este caminho evolutivo, particularmente em Angola, levando, assim, a paisagens abertas com uma diversidade e densidade excepcionalmente altas de geóxilos, ou seja, paisagens com florestas subterrâneas (como demonstra a figura 1).
Durante vários anos, uma equipa composta por cientistas angolanos e alemães estudou a ecologia e a evolução das Anharas de Ongote na zona do Chitembo no Bié e, este ano, observou que os agricultores têm utilizado tratores para arar vários campos com florestas de geoxilas nos locais de estudo. Contudo, isso tem impacto negativo bastante alto para estas florestas, pois a aragem com um tractor acaba por destruir todas as raízes e caules, não permitindo a regeneração destas árvores novamente. Ainda mais preocupante do que matar estas plantas é a quantidade de carbono libertado através da sua biomassa, carbono esse que foi acumulado durante milhares de anos.
Com a utilização de imagens de satélite, foi estimado que 444 hectares da área de pastagem arada nos vales ao longo da estrada de Menongue a Cachingues libertaram 36063 toneladas de dióxido de carbono - isto é, uma média do que comparativamente 35 mil angolanos emitiram apenas em 2017, de acordo com estudos.
O efeito deste carbono, agora libertado, só será sentido dentro de alguns anos, assim como estamos agora a viver o efeito do carbono libertado nas últimas décadas. Isso influencia bastante as alterações climáticas, podendo facilitar ainda mais o aumento de eventos climáticos mais extremos e imprevisíveis, como secas, inundações e tempestades.
A maioria das áreas perturbadas, que foram estudadas, apresenta uma grande perda da sua biodiversidade e será menos eficiente na filtragem e drenagem da chuva, o que reduz a quantidade de água limpa que entrará nos rios adjacentes.
A aragem feita com tractores em pastos e pântanos nos vales do planalto do Bié também é prejudicial, pois esses ecossistemas filtram e armazenam a chuva e descarregam água potável ao longo do ano, nos rios do planalto. Por isso, é extremamente importante que as camadas de vegetação e solo estejam intactas, porque agem como filtros naturais para a água que milhares de angolanos consomem, particularmente as comunidades localizadas ao longo do rio Cubango, Cuito e do Cuanza.
A utilização de tractores nesta localidade é conveniente porque os solos têm baixa fertilidade, e os agricultores precisam de campos mais extensos para poder ter uma produção maior, utilizando mais espaço. Mas, pela sua baixa fertilidade, esses solos são abandonados depois de alguns anos, visto que os seus poucos nutrientes se esgotam rapidamente, acabando por abrir a necessidade de se arar mais campos e estender estas áreas. Este cultivo itinerante ocorre em regiões tropicais em todo o mundo e, em baixas densidades populacionais, é sustentável. No entanto, a população angolana tem crescido rapidamente nas últimas décadas e coloca uma pressão crescente sobre a natureza, reivindicando cada vez mais terras intactas para o uso agrícola. Por isso, é urgente que entendamos que arar um campo com plantas geoxilas é irreversível, já que nenhuma geoxila conseguirá nascer ali durante muitos anos (como demonstra a figura 2).
É necessário advocar para que soluções mais sustentáveis sejam implementadas, chamar por acção social, pela responsabilidade das entidades agrícolas privadas e também a acção governamental. É preciso instruir aos agricultores as formas de produção mais eficazes e menos impactantes a estes ecossistemas e, ao mesmo tempo, envolver e informar as comunidades, especialmente os Sobas, sobre como as anharas são importantes para as gerações futuras.
É fundamental que sejam criados locais de conservação sem haver pressão de produção agrícola, particularmente a agricultura feita em grande escala.
Se não houver acção para o controlo do crescimento agrícola e das práticas insustentáveis nesta região e em outras áreas com ecossistemas similares, poderá haver efeitos devastadores para as comunidades em Angola e para a natureza, dentre eles: não ter acesso à água potável, a aceleração das alterações climáticas (influenciando o aumento de temperatura), secas e eventos climáticos extremos. Esse pode ser o pior cenário, mas não precisa de acontecer.
É necessário promover práticas agrícolas mais sustentáveis e que possam ser mantidas a longo-prazo, senão os ecossistemas primitivos e que são ecologicamente muito valiosos continuarão a ser destruídos, sem que as pessoas realmente se beneficiem deles. Em vez disso, haverá consequências negativas a longo-prazo: mudanças climáticas aceleradas, a perda de água potável e a perda de uma biodiversidade única. A própria conservação dessa biodiversidade, no entanto, pode ter grande valor económico no futuro, oferecendo possibilidades para o ecoturismo e a participação em programas internacionais que premeiem financeiramente a proteção da natureza.
Acima de tudo, é primordial que estejamos conscientes de que dependemos de muitos destes ecossistemas intactos. Se forem criadas políticas que influenciem a utilização destes recursos de forma sustentável, protegendo a natureza e as pessoas, as futuras gerações, com certeza, terão as mesmas oportunidades de também poder explorar estes recursos. Mas para que tal aconteça, precisamos de agir agora.

(Pela relevância do seu conteúdo para a classe académica e não só, o Novo Jornal apadrinha a publicação mensal de uma série de cinco artigos científicos de biólogos angolanos ligados à Faculdade de Ciências da Universidade Agostinho Neto (UAN) e Instituições de pesquisa.)

*Autora principal: Paulina Meller
Mestre em Ciência
Ocupação actual: Bióloga, doutoranda em Geoxyles em Angola, na Universidade de Hamburgo, Alemanha.

*Segundo autor: Érica Tavares
Bacharelato em Ciência

Ocupação actual: Bióloga e ecologista, co-fundadora da EcoAngola.