O memorando de entendimento com a Sonangol para a construção de uma base logística de armazenamento de derivados do petróleo na Barra do Dande foi assinado a 7 de Novembro de 2019, num investimento estimado em 600 milhões de dólares.
A construção da infraestrutura, anteriormente estimada em 1.500 milhões de dólares, iria ser desenvolvida pela Atlantic Ventures, uma empresa associada a Isabel dos Santos, que viu o contrato ser revogado em 2018 e avançou, na altura, com um processo contra o Estado.
Depois, este projecto foi adjudicado pelo Presidente da República em Dezembro de 2020, por cerca de metade do valor previsto no contrato atribuído por José Eduardo dos Santos à empresa da sua filha Isabel, logo após as eleições gerais, num decreto depois revogado por João Lourenço. Mas o procedimento de Dezembro foi também por ajuste directo pelo critério material. Isto apesar das críticas feitas pelo actual Presidente ao seu antecessor, que acusou de entregar "de bandeja" um projecto "de tão grande dimensão" a um empresário "sem concurso público".
Agora, o ministro Diamantino Pedro, que falava durante um encontro com jornalistas, confirmou que não houve entendimento com o xeque Ahmed Dalmook Al-Maktoum, do Dubai, relativamente à construção da base logística de armazenamento de produtos petrolíferos da Barra do Dande, informação que tinha sido avançada pelo 'site' Maka Angola.
"O memorando de entendimento não é um contrato, é um documento de intenção que pode ser transformado num contrato, num instrumento jurídico mais forte, ou não. Neste caso, ficámos pelo memorando e, após algum tempo de trabalho, achámos que não havia condições para avançar com o projeto porque não houve entendimento", afirmou o ministro.
Sem detalhar os motivos, Diamantino de Azevedo disse que "a outra parte tinha uma posição diferente" da parte angolana, por isso, "não houve um final feliz, o namoro não deu em casamento".
O responsável que tutela os sectores dos Recursos Minerais e Petróleos adiantou que as autoridades angolanas estão "à procura de outras alternativas para levar esse projecto em frente".
Segundo o presidente da Sonangol, Gaspar Martins, "o projecto não parou" e a "a relação terminou de forma amigável", salientando que o xeque tem outros investimentos em curso em Angola.
"Fizemos os esclarecimentos necessários e estamos a fazer a continuidade do projecto. Entendemos que as condições em que se pretendia cooperar connosco não eram as mais adequadas", justificou.
Os ajustes directos para avançar com projecto
O procedimento de contratação simplificada era justificado "por motivos de urgência imperiosa" para "dotar o País de infra-estruturas em terra para o armazenamento de produtos refinados de petróleo para atender às necessidades de consumo nacional, criação de reservas estratégicas e de segurança de produtos refinados, optimizar a eficiência da logística nacional de distribuição dos citados produtos e potencializar o País como um hub regional de armazenamento de derivados de petróleo".
No mesmo mês, João Lourenço aprovou, também por ajuste directo, mais 2,35 mil milhões de kwanzas, o equivalente a 2,9 milhões de dólares, para o Terminal Oceânico da Barra do Dande, desta vez para consultoria especializada para a realização de estudos de viabilidade económica e financeira do projecto e execução de serviços de manutenção e preservação das infra-estruturas existentes.
O valor mais alto deste ajuste directo (1,8 mil milhões de kwanzas) será para execução de serviços de manutenção e preservação das infra-estruturas existentes no Terminal Oceânico da Barra do Dande, enquanto o restante (496 mil milhões kz) servirá para a realização de estudos de viabilidade económica e financeira do projecto.
A justificação contida no decreto presidencial 177/20 para o procedimento de contratação simplificada em função do critério material é "por motivos de urgência imperiosa", tendo em conta "a necessidade urgente de dotar o País de infra-estruturas em terra para o armazenamento de produtos derivados do petróleo para atender às necessidades de consumo nacional, criação de reservas estratégicas, e segurança de produtos refinados", bem como "optimizar a eficiência da logística nacional de distribuição dos citados produtos e potencializar o País como um hub regional de armazenamento de derivados do petróleo".
A anulação da ordem de José Eduardo dos Santos
O projecto do porto da Barra do Dande esteve entregue à Atlantic Ventures, empresa detida por Isabel dos Santos, mas o Presidente João Lourenço revogou o decreto assinado pelo anterior chefe de Estado, José Eduardo dos Santos, que aprovou a adjudicação por 1.500 milhões de dólares já depois das eleições gerais de 2017.
O despacho criava uma comissão de avaliação do procedimento coordenada pelo director geral do Instituto Marítimo e Portuário de Angola, Victor Alexandre de Carvalho e integrada pelo assessor principal do gabinete jurídico do Ministério dos Transportes, Raul Campos, bem como um representante do Ministério das Finanças e da Construção e Obras Públicas.
O Presidente da República, João Lourenço, num dos seus discursos havia criticado a forma como foi atribuída a construção do novo Porto da Barra do Dande.
"Vamos procurar rever todo o processo no sentido de, enquanto é tempo, e porque o projecto não começou ainda a ser executado, corrigirmos aquilo que nos parece ferir a transparência, na medida em que um projecto de tão grande dimensão quanto este, que envolve biliões, com garantia soberana do Estado, não pode ser entregue de bandeja, como se diz, a um empresário, sem concurso público", disse João Lourenço.
A empresa garantia que a ruptura foi "infundada", contestando a alegação, apresentada pelo Presidente da República, de que a empreitada deveria ter sido sujeita a um concurso público.
A firma detida por Isabel dos Santos sublinhava ainda que a ruptura do compromisso implicava "uma perda de credibilidade de Angola nos mercados internacionais e uma maior dificuldade em encontrar soluções de financiamento mais sofisticadas e menos pesadas para o Tesouro público, no que se refere a grandes projectos".
Em causa, apontava o comunicado, está o facto de o projecto ter sido estruturado com base num modelo recomendado pelo Banco Mundial, "que mobilizou financiamentos junto da banca nacional e internacional para, sem recorrer ao Orçamento Geral do Estado, suportar um investimento de longo prazo, assegurado por privados, para a construção de infra-estruturas".