"O pagamento previsto de 547 milhões de dólares [464 milhões de euros] a Angola como parte do programa de 3,7 mil milhões de dólares [3,1 mil milhões de euros] está provavelmente a ser adiado devido à incerteza relativamente às negociações de reestruturação da dívida de Angola à China", escreve o director do departamento africano da consultora Eurasia.
Na nota enviada aos investidores, e a que a Lusa teve acesso, Darias Jonker considera que "o pedido para aumentar o programa em 740 milhões de dólares [627 milhões de euros] deverá ser aprovado, já que esta subida ainda está dentro da alocação de Angola dos direitos especiais de saque no Fundo".
O FMI devia ter enviado uma nova tranche do empréstimo acordado no final de 2018 até 30 de Julho, mas argumentou com as férias na primeira quinzena deste mês para justificar não ter enviado as verbas.
"Este adiamento da decisão do conselho de administração e o aumento da dotação total do programa aconteceu provavelmente devido aos receios de alguns dos administradores, e do próprio FMI, sobre as conversações de reestruturação da dívida com a China", escreve o analista.
Do ponto de vista da Eurasia, as relações entre o FMI e Angola são "muitos estáveis na Presidência de João Lourenço, que encara o programa como o caminho mais sustentável para conseguir sustentar o crescimento e as reformas económicas".
O Governo quer evitar a reestruturação dos Eurobonds, "já que terá um efeito particularmente negativo na opinião da qualidade do crédito soberano, o que por sua vez teria um efeito fragilizador no sector bancário", continua o analista, vincando que "não será necessário reestruturar os títulos de dívida por agora, mas isso continua a ser uma opção se os riscos descendentes se materializarem".
Angola deve cerca de 22 mil milhões de dólares [18,6 mil milhões de euros] à China em empréstimos de dois grandes bancos, o Banco de Exportações e Importações da China (Exim Bank) e o Banco de Desenvolvimento da China (BDC), para além do banco comercial ICBC, havendo notícias de que as negociações com o BDC estão avançadas, ao contrário das negociações com o Exim Bank, segundo a Eurasia.
A parceria estratégica entre os dois países não está em causa, considera o analista na nota enviada aos clientes, mas os contornos das negociações terão importantes consequências para ambos os países.
"Devido à dívida extremamente alta de Angola, que vai passar os 120% do PIB [Produto Interno Bruto] este ano, e os riscos relacionados com a pandemia [de covid-19], um acordo com os três maiores bancos credores chineses que contemple mais do que uma simples extensão da maturidade dos empréstimos é visto por alguns administradores do FMI como essencial para resolver o problema da sustentabilidade da dívida de Angola", segundo a nota.
Para além disso, conclui Darias Jonker, "a transparência sobre estes acordos, que ainda continuam por revelar, representa um precedente importante para futuros acordos ao abrigo da DSSI [Iniciativa de Suspensão do Serviço da Dívida], já que até agora a contribuição da China neste âmbito foi limitada a empréstimos sem juros a países em desenvolvimento, e quando houver mais clareza relativamente à reestruturação da dívida angolana, a aprovação do FMI deverá ser rápida".