Nesta fase, as sanções não incidem directamente, ainda, nas exportações petrolíferas, cingindo-se aos automóveis, aviação comercial, aço, transacções financeiras entre outros, mas os efeitos vão ser mais abrangentes porque o estender das sanções ao petróleo, a grande fonte de receitas do Irão, está já marcado para Novembro. Os efeitos psicológicos foram imediatos.
Isto, porque, segundo os cálculos dos analistas dos mercados petrolíferos, a oferta diária no negócio global do crude pode sofrer uma forte redução, tendo em conta que o Irão é, segundo dados do mês de Julho, responsável por cerca de 3 milhões de barris colocados diariamente nos mercados.
No cenário mais consensual, com a reintrodução das sanções norte-americanas às exportações iranianas, entre 600 mil e 1,5 milhões de barris por dia (mbpd) deixarão de estar disponíveis no curto prazo, podendo os danos ser mais abrangentes porque Donald Trump tem como objectivo reduzir as vendas de Teerão a zero.
Essa restrição pode anular o efeito do recente aumento de produção, cerca de 1 milhão de barris por dia, acordado no seio da Organização de Países Exportadores de Petróleo (OPEP) e da Rússia, para controlar os preços em clara ascensão, depois de em Janeiro de 2017 terem diminuído a sua produção em 1,8 mbpd como forma de aumentar os preços do barril, que estavam historicamente baixos desde 2014, tanto no Brent londrino como no WTI de Nova Iorque.
Incerteza, incerteza...
Todavia, o mercado global de crude atravessa um período de forte incerteza, porque, se por um lado existe a perspectiva de as sanções levaram à diminuição da oferta iraniana, por outro, a inflamada "guerra" comercial decretada pelos EUA à China e à Europa, com imposição de taxas elevadas num conjunto de produtos importados, e o contra-ataque chinês e europeu, pode levar a um forte abrandamento da actividade económica com evidentes repercussões no consumo de petróleo nas três maiores economias mundiais.
E, recorde-se, existe ainda o efeito já visível da incapacidade de alguns produtores em não conseguirem corresponder às quotas acordadas para o aumento da produção, sendo os casos mais evidentes os da Venezuela, devido à profunda crise social, económica e política, que levou ao quase colapso da estrutura produtiva, de alguns países africanos, como Angola e a Nigéria, ou ainda a própria Arábia Saudita, o maior exportador do mundo, que tem diminuído globalmente o fluxo de crude para os mercados.
É neste jogo complexo de equilíbrios delicados que os mercados vão absorvendo os elementos que utilizam para determinar os preços diários do barril, estando neste momento a "ganhar" a ideia, tendo em conta os recentes aumentos observados, de que a procura, muito por causa do bom momento que, como tem referido o FMI, a economia mundial regista, se vai manter acima da oferta, pressionando em alta os preços.
A "vingança" de Washington
Com as sanções dos EUA, que Trump garante serem "as mais severas de sempre", a serem contestadas pelos restantes co-signatários do acordo nuclear com o Irão, assinado pelo antecessor de Donald Trump na casa Branca, Barack Obama - a Rússia, Alemanha, França, China e a União Europeia -, poder-se-ia esperar que o seu efeito fosse ligeiro, até porque os EUA não importam petróleo do Irão. Mas não é bem assim.
Isto, porque Donald Trump já veio a público lembrar, na rede social Twitter, que os EUA vão accionar sanções também contra as empresas e países terceiros que mantiverem negócios com o Irão, o que pode levar estes países e empresas, se não quiserem ver fechadas as portas do mercado norte-americano, a sair do mercado iraniano e a deixar de importar, ou diminuir fortemente, as suas importações de crude daquele país.
O que já foi feito, por exemplo, por empresas francesas, que anunciaram estar de saída do Irão, como os gigantes Alstom (transportes ferroviários) ou a PSA, que fabrica a Citroen e a Peugeot, mas também alemãs, como a Daimler, que tinha aem curso a construção de uma fábrica de veículos pesados Mercedes no Irão, britânicas e Italianas.
A União Europeia já disse que vai agir judicialmente e com sanções contra os EUA para defender as suas empresas da "vingança" de Washington, mas o interesse imediato das multinacionais europeias, que têm nos EUA uma forte presença, estão a desistir dos projectos elaborados para e com o Irão após o levantamento das sanções em 2015.
No entanto, é a China e a Índia, as duas maiores economias emergentes do mundo, que mais petróleo iraniano importam, e vai depender destes países o sucesso ou insucesso da atitude unilateral de Donald Trump, que já deixou saber que o objectivo é reduzir as exportações de Teerão para "o mais próximo possível do zero".
O apoio da Arábia Saudita a Trump
Para já, segundo revelaram alguns jornais norte-americanos e europeus, a aparente incapacidade da Arábia Saudita para responder ao aumento de produção decidido em Junho pela OPEP+Rússia não é outra coisa senão uma estratégia de produzir reservas, criar um stock de crude gigante, que permita, quando as sanções contra o Irão entrarem em vigor, no que toca ao crude, colocarem estas quantidades nos mercados de forma a minimizar o impacto das sanções no preço do barril, porque os EUA, especialmente a aproximar-se um período eleitoral, vivem de combustíveis baratos e sem oscilações, às quais os eleitores são extremamente sensíveis.
É de ter em conta que a Arábia Saudita é o grande aliado dos EUA no Médio Oriente e o Irão é o principal inimigo da Arábia Saudita na região, muito por razões religiosas. Mas também de ambição de domínio regional e influência económica e cultural e religiosa naquele lado do mundo.
Até Novembro, quando o petróleo do Irão passar a estar sob as sanções de Washington, o barril de petróleo vai valer mais ou menos em função de diversos factores, sendo, para os principais analistas, questões prementes o eventual colapso completo da produção venezuelana, a diminuição da capacidade de alguns membros da OPEP em responder positivamente ao desafio de aumentar a produção - recorde-se que a Agência Internacional de Energia prevê, por exemplo, que Angola passe em menos de cinco anos de 1,6 mbpd actuais para menos de 1,3 mbpd - e ainda, entre outras, as questões climáticas, porque a vaga de calor extremo que varre o hemisfério norte está a pressionar muito a procura devido à necessidade de gastar energia para arrefecer os edifícios.
Para Angola, que é quase totalmente dependente das exportações de crude, o futuro imediato vai depender destes finos equilíbrios globais, naturalmente, beneficiando com o aumento dos preços e sofrendo fortes consequências da sua diminuição, como se viu quando o barril baixou drasticamente em meados de 2014, gerando umas das maiores crises económicas de sempre no país.