Por detrás da diluição da oferta, que é a razão presente para que a procura supere o que está disponível, é a, mais uma, quebra no fornecimento na Líbia, país do norte de África que vive desde 2011, ano em que foi destituído Muammar Khadaffi, em permanente instabilidade decorrente de uma guerra civil entre duas forças apoiadas por potências estrangeiras.

Mas também persiste a já conhecida dificuldade dos países-membros da OPEP+, organização que desde 2017 agrega os 13 exportadores da OPEP e 10 desalinhados encabeçados pela Rússia, em cumprir com as quotas atribuídas internamente para somar os quase 200 mil barris por dia ao programa de recuperação de produção subtraída durante a crise global da pandemia da Covid-19 que estava em 432 mil barris por dia.

Segundo dados da Agência Internacional de Energia (AIE), a produção do cartel que reúne os países OPEP e a Rússia com os seus aliados subiu ligeiramente de Abril para Maio mas ainda está muito longe dos valores referentes às quotas atribuídas.

Em números, isto quer dizer, segundo a S&P Global Commodity Insights, que os 13 da OPEP produziram, em média diária do mês de Maio28,62 milhões de barris por dia (mbpd), menos 180 mil que em Abril, devido a quebras acentuadas na Líbia e na Nigéria.

Mas, no computo geral, a OPEP+ acaba por ver a sua produção aumentar, embora modestamente, 120 mil bpd, em Maio porque os 10 produtores liderados pela Rússia, produziram mais 300 mil bpd, para um total de 13,08 mbpd, com os ganhos a saírem das produções da Rússia, curiosamente e apesar das sanções/embargos aplicadas pelos EUA e União Europeia ao crude russo, e do Cazaquistão.

Mas, no que diz respeito aos valores de hoje, 14 de Junho, o que está a sobressair é que o Brent recuperou de forma fulgurante das perdas de segunda-feira, voltando a abeirar-se dos 124 USD por barril, estando, perto das 10:00, hora de Luanda, a valer 123,24 USD, enquanto em Nova Iorque o WTI, à mesma hora, valia 121, 68 USD, com uma recuperação similar à do Brent de Londres.

Com a gestão ao barril que está a ser feita pela OPEP+, que todos os meses se reúne para analisar os mercados, é ainda o fornecimento do "cartel" que determina em primeiro lugar o valor diário do barril, mas em pano de fundo está ainda a guerra na Ucrânia, cujo maior impacto vem das sanções aplicadas à Rússia, o segundo maior exportador do mundo, por Bruxelas e por Washington, e pela resistência do vírus da Covid-19 em ceder às medidas draconianas do Governo de Pequim, com várias cidades chinesas a observarem novos confinamentos.

Se a questão dos embargos ao crude russo pelos EUA e pela União Europeia não estão a obter os resultados esperados, havendo mesmo notícias não desmentidas de que os Estados Unidos em vez de diminuírem as compras à Rússia, aumentaram-nas em perto de 27%, e na Europa ocidental, o embargo que visa 75% do total comprado a Moscovo, está a ser absorvido por clientes importantes na Ásia, como a Índia e a China, como apontam os dados da S&P Global Commodity Insights, já o retorno aos confinamentos na China são como fogo na palha seca para os mercados, porque os dados mostram que a economia chinesa trava a fundo nas importações de petróleo com as notícias de novos confinamentos, o que ali representa meter milhões de pessoas de uma só vez fechadas em casa.

Citado pela Reuters, um analista sénior da OANDA, Jeffrey Halley, defende que o afunilamento da oferta global de refinados, gasolina e gasóleo, bem como a falta de investimentos exigidos para trazer mais crude dos países OPEP para os mercados, significam que as perdas russas não estão a ser compensadas e os mais de 100 mil barris/dia perdidos na Lìbia também estão a impactar na sensibilidade dos mercados.

A par desta realidade, os analistas esperam uma queda significativa dos dados referentes aos stocks norte-americanos pelo API e pela agência que gere a informação do sector energético sobre combustíveis e crude, muito porque esta é a época do ano de maior consumo de gasolina devido às férias de Verão.

Mas...

... o que pode fazer implodir este cenário promissor para os países exportadores, como Angola, que estão a viver dias de grandes ganhos, como já não sucedia há mais de uma década, bastando recordar que a 09 de Março o barril chegou aos 139 USD, apenas a oito dólares do seu recorde de sempre, em Junho de 2008, quando chegou aos 147 USD, é a crise económica de grande amplitude que se adivinha no horizonte.

Se na Europa ocidental é o desemprego, a inflação e o aumento dos juros bancários, nos Estados Unidos, além disso emerge um problema de distribuição de bens, especialmente os alimentares, e ainda o surgimento de crises inesperadas, como a dificuldade enfrentada pela Administração Biden em garantir o fornecimento de energia eléctrica aos seus 300 milhões de cidadãos.

No mundo, se o problema mais grave e a mais violenta frente de batalha da guerra na Ucrânia está longe das fronteiras daquele país do leste europeu, no oriente africano e no Médio Oriente, face à escassez de cereais no mercado internacional depois da interrupção das exportações da Ucrânia e da Rússia, os dois maiores fornecedores mundiais de grãos, o que emerge desta crise é o prognóstico negativo tanto do FMI como do Banco Mundial para a economia planetária que não pára de perder viço e porosidade e isso é um mau indicador para o consumo de energia global.

A emergência americana

Para responder a esse perigoso "cisne negro", o Presidente dos EUA, Joe Biden, mandou publicar uma declaração de emergência para evitar falhas no fornecimento de energia eléctrica no país devido às consequências da guerra na Ucrânia.

Na declaração onde Joe Biden acusa a Rússia pela situação que se vive no seu país, é explicado que esta medida visa facilitar a importação de equipamentos da Ásia para as unidades nacionais de produção de energia solar.

Esta ordem Presidencial cria um espaço temporal onde são levantadas as taxas de importação de células solares como forma de aumentar a resposta solar ao défice de energia que o país atravessa e que, no Inverno, deverá ser ainda mais grave.

Os dois principais motivos para as disrupções que os EUA estão a observar no sistema de distribuição de energia eléctrica são a questão da guerra na Ucrânia e os fenómenos meteorológicos extremos devido às alterações climáticas.

Porém, recorde-se, também por determinação de Biden, os EUA proibiram totalmente as importações de carvão, gás e crude russos e os media norte-americanos divulgaram notícias sobre um alegado esquema que mostra que esta decisão pode ter sido irreflectida porque os EUA estarão a comprar crude russo na forma de refinados na Índia, país que aumentou de forma intensa as compras a Moscovo.

E isso só pode ter uma interpretação: o mundo tem dificuldades sérias em substituir as exportações russas de petróleo porque as infra-estruturas produtivas sofreram rudes golpes devido ao desinvestimento dos últimos anos, especialmente desde 2014, por causa das abruptas perdas de valor da matéria-prima, que, recorde-se, chegou a valer menos de 30 USD no início de 2016 depois de ter estado durante anos acima dos 100 dólares entre 2007 e 2014.

Há ainda, segundo alguns especialistas no sector, a questão das centrais nucleares, fundamentais no sistema de produção de electricidade nos EUA, que são alimentadas em grande medida por urânio fornecido pela Rússia e não se sabe se Moscovo interrompeu ou não o envio deste material radioactivo para os EUA, o país que mais alimenta em verbas e material militar o esforço de guerra da Ucrânia.

E o Governo russo acusa mesmo Washington de hipocrisia porque, segundo dados do Departamento de Energia dos EUA, entre Fevereiro, mês em que começou a guerra, e Março, já depois de Joe Biden proibir as importações de crude russo, estas aumentaram levando mesmo a Rússia a passar de 10º para 6º maior fornecedor de petróleo aos Estados Unidos.

De acordo com esses dados, as importações de crude russo pelos EUA subiram de 2,325 milhões em Fevereiro para mais de 4,2 milhões de barris em Março, isto, apesar de se tratar do maior produtor de crude do mundo e ter um excedente de produção, em teoria.

Depois do início da invasão russa, há 3 meses, os EUA são o 3º país a avançar com medidas radicais para esbater os efeitos secundários do conflito no leste europeu, depois de a Alemanha ter aconselhado os seus cidadãos a manter reservas alimentares para 10 dias e o Governo da Polónia ter dado autorização extraordinária aos seus cidadãos para se abastecerem de madeira em todas as florestas do país como forma de garantir reservas para o aquecimento no tempo mais frio.

Barril a caminho dos 150?

O CEO da Trafigura, um dos maiores negociantes globais de commodities, estimava, ainda na passada semana, que o barril pode chegar aos 150 USD este ano devido a um aumento da procura, como o atesta o facto de a maior parte das refinarias de referência em todo o mundo estarem à beira da sua capacidade máxima face a uma procura galopante de combustíveis devido especialmente ao fade out da pandemia que o mundo vive.

A isso acrescenta-se, como, segundo a Reuters, avança o JP Morgan, a Rússia está a retirar de circulação entre 500 mil a 700 mil barris por dia por falta de compradores devido às sanções aplicadas pelos países ocidentais no âmbito da invasão ucraniana.

Na mesma nota, a JP Morgan adianta que se não suceder uma súbita revolução na produção dos países do Médio Oriente, respondendo à crescente demanda, ou se a China, que, graças aos confinamentos, viu aumentar os seus stocks, não retirar as restrições à exportação de produtos limpos ou se o fizer de forma parcial apenas, o cenário só vai piorar, especialmente neste período de forte consumo de refinados com a eclosão do Verão no Hemisfério Norte.

Um dos sinais de que existem problemas sérios de oferta é a recente decisão dos sauditas em aumentar os preços médios da venda das suas ramas, o que coincide com uma decisão inesperada no seio da OPEP+, organismo que desde 2017 agrega os 13 Países Exportadores (OPEP) e 10 desalinhados encabeçados pela Rússia, de aumentar aos esperados 432 mil bpd, para Julho e Agosto, mais perto de 200 mil barris por dia, ou seja, para 648 mil, num claro sinal de que se está perante um afunilamento do espaço entre a oferta e a procura.

Porém, esta nova incandescência nos mercados levou, recorde-se, num claro volte-face histórico, e fruto da guerra na Ucrânia, os Estados Unidos, que mantêm há anos a Venezuela sob fortes sanções, confrontados com a necessidade de escolher entre "inimigos", escolheram manter a pressão sobre Moscovo e permitir a Caracas que volte a exportar crude em quantidades assinaláveis, através das petrolíferas europeias Repsol e ENI, como forma de aliviar o problema das sanções europeias a Moscovo.

Sendo que, no imediato, a Venezuela não estará em condições de fazer uma diferença substantiva porque, apesar de ter as maiores reservas do mundo, mais de 300 mil milhões de barris, a sua infra-estrutura extractiva está profundamente deteriorada por anos a fio de desinvestimento e sanções de Washington.

Mas, enquanto os mercados não encontram o equilíbrio, Angola é um dos países exportadores mais beneficiados porque o petróleo representa cerca de 95% do total das exportações nacionais, mais de 35% do seu PIB e até 60% das receitas fiscais que garantem o funcionamento do Estado.