Esta extensão do programa de cortes, anunciada na segunda-feira, ao final da tarde, por mais nove meses - o anterior acordo, de seis meses, iniciado a 01 de Janeiro último, terminava este mês - tem como objectivo quase único impulsionar o preço do barril apesar de a economia mundial estar longe de atravessar um bom período.
Para que este acordo tivesse sucesso, como relataram as agências que em Viena de Áustria cobrem a reunião da OPEP e OPEP+, os membros tiveram de ultrapassar algumas divergências de fundo em nome de um objectivo comum, que é garantir melhores preços para o seu petróleo, que, para quase todos, é a principal fonte de rendimento.
Apesar deste anúncio já ser esperado, como o NJOnline resumia na segunda-feira (ver notícias relacionadas em baixo), a sua confirmação oficial é, ainda assim, um dado importante porque permite perceber que este conjunto de países produtores, que é responsável cerca de 40 por cento da produção mundial com o agregado OPEP e Rússia, está disponível para assumir um conjunto de sacrifícios para o futuro, ultrapassando divergências importantes, como, por exemplo, o Irão discordar severamente da negociação muitas vezes a dois entre a Rússia e a Arábia Saudita, dois dos três maiores produtores do planeta, se sobrepor às decisões colegiais.
Mercados estão avisados
E isso é um aviso claro aos mercados de que este conjunto alargado de produtores não vai abdicar da sua capacidade de influenciar a relação oferta/procura que determina o preço do barril nos mercados internacionais e também uma mensagem directa ao Presidente dos EUA, Donald Trump, que tem exercido uma forte influência junto dos seus aliados no Golfo Pérsico - Arábia Saudita e Kuwait, por exemplo - para que aumentem a produção de forma a não deixar que os preços aumentem em excesso.
Alias, a par dessa influência junto dos aliados, os EUA, que são actualmente o maior produtor global por causa dos cortes dos sauditas, por causa da sua aposta gigantesca na produção do chamado petróleo de xisto, ou fracking, - explosão de rocha a grandes profundidades -, o que permitiu que os Estados Unidos tenham conseguido chegar ao patamar de produzir tudo o que consome - é o maior consumidor mundial, com quase 12 mbpd - , podendo mesmo passar para o clube dos países exportadores em breve.
Embora, hoje, após se saber oficialmente deste desfecho em Viena de Áustria, o Brent, em Londres, que determina o valor médio das ramas angolanas, ter iniciado o dia ligeiramente em baixa ligeira, estando, cerca das 09:45 o barril a valer 65,06 USD, com tendência para aumentar.
O barril aumentou quase 25% este ano, à medida em que os membros da OPEP+ foram consolidando a sua "união" e os EUA impuseram sanções aos seus "inimigos", como a Venezuela e o Irão, dois dos maiores produtores do "cartel", que, por isso, viram as suas exportações baixar substancialmente.
Um processo que vem de longe
Alias, este encontro de Viena é a confirmação de um longo processo de concertação entre os membros da OPEP e da Rússia que vem já desde Novembro de 2016, quando, confrontados com o descalabro no preço do barril - entre 2014 e 2016 passou de mais de 100 USD para menos de 30 USD - resolveram tomar medidas radicais, retirando do mercado, a partir de 01 de Janeiro de 2017, mais de 1,8 milhões de barris por dia.
A próxima reunião do "cartel" está agendada para Dezembro, onde os membros vão analisar a situação e decidir se voltam a prolongar os cortes para lá de Março de 2020.
Todavia, 2020 tende a ser um ano de transição na forma como o petróleo impacta a vida das pessoas e das economias.
Por causa de questões como as alterações no consumo dos veículos ligeiros com a chegada em massa dos carros eléctricos, até à proibição total do Instituto Marítimo Internacional (IMO), a agência da ONU que regula os transportes marítimos globais, de uso de combustíveis pesados (com elevados níveis de enxofre) nos motores dos grandes navios que cruzam os mares, dos petroleiros aos navios de cruzeiros turísticos - que são os maiores poluidores em cena -, o sector petrolífero nunca mais será o mesmo (ver notícias relacionadas em baixo).
Mas, com esta decisão e com a expectativa sólida de tréguas, para já, e da paz definitiva nos próximos meses, na guerra comercial entre os EUA e a China, que tem mantido o crescimento da economia mundial abaixo do seu potencial há quase um ano, o consumo deve disparar, levando a que os preços do barril subam.
Pelo menos é isso que a Arábia Saudita crê que vai acontecer, como o seu ministro da Energia, Khalid Al-Falih, não se tem cansado de dizer que o seu objectivo é consolidar os preços acima dos 70 USD, embora alguns analistas estimem que este país, que atravessa um mau momento nas suas contas públicas, precisa com urgência de ver o barril nos 80USD para equilibrar as suas contas públicas.
O que ganha Angola?
Essa necessidade saudita, enquanto maior produtor e o país com maior capacidade de influência inter pares, é uma bênção para países como Angola, que, apesar de semelhante dependência das suas exportações de crude, não tem, nem de perto nem de longe, a mesma capacidade negocial, aplicando-se o mesmo a outros produtores, como a Nigéria, a Venezuela ou o Irão e Iraque, os outros grandes exportadores do Médio Oriente.
Mas o que vai, efectivamente, suceder, podendo isso colocar em causa esta estratégia, é que a OPEP+ vai ter de ser capaz de resistir à esperada ofensiva dos Estados Unidos, onde Donald Trump tem eleições em 2020 e quer ser reeleito.
O que defendeu Angola?
O ministro dos Recursos Minerais e Petróleos, Diamantino Azevedo, esteve em Viena e explicou aos jornalistas que Angola defendeu na reunião a extensão do programa de cortes por nove meses em detrimento da outra possibilidade, que era apenas cinco meses, até Dezembro.
O governante aproveitou a passagem por Viena para reafirmar a vontade de Angola apostar forte no downstream, com a abertura, por exemplo, de novas refinarias e equipamento de armazenamento de petróleo.
Diamantino Azevedo, face aos dados mais recentes de organismos internacionais, que apontam para uma diminuição substancial da capacidade produtiva angolana, lembrou que estão em preparação leilões de novos blocos e que o desfecho deste processo vai depender do interesse das petrolíferas, que, recorde-se, a BP, por exemplo, já manifestou interesse.
Trump, o candidato do crude barato
O problema é que, para ser reeleito, Trump sabe que precisa urgentemente de petróleo barato para poder manter o preço da gasolina barata para os seus eleitores que gostam de carros de grande cilindrada e que são dos mais gastadores de gasolina em todo o mundo, para poder manter em linha com o resto do mundo uma boa parte da sua indústria pesada, bastante obsoleta apesar de os EUA serem a maior economia global...
Como vai fazê-lo, ninguém sabe, mas sabe-se como fez em 2019 para vergar a Arábia Saudita e obrigar este país a voltar a produzir mais, muito mais, alias, que o que tinha acordado com os seus parceiros da OPEP+, em Julho desse ano.
Trump e a sua Administração, aproveitaram o caso Jamal Kashoggi, o jornalista saudita, "inimigo" da Casa Saud, que foi morto por um comando enviado por Riade a Istambul, na Turquia, em Outubro de 2018, tendo a CIA produzido um relatório "secreto" que ligava esta morte ao Príncipe Herdeiro, Mohammad bin Salman Al Saud, o que serviu para que fosse feita, como a imprensa norte-americana e europeia noticiaram, chantagem sobre o Governo saudita, que, em Julho de 2019, voltou a produzir em excesso, aumentando a oferta global em mais de 1, 3 mbpd, como forma de Donald Trump melhor lidar com as eleições intercalares desse ano.
A grande questão agora é: Se Trump conseguiu dobrar os sauditas em vésperas de eleições intercalares - para o Congresso, com a eleição de Representantes e Senadores -, o que se poderá esperar quando é a eleição do próprio Presidente dos Estados Unidos da América que está em causa quando os mais de 200 milhões de eleitores norte-americanos forem às urnas em 2020.