O "cartel" que junta quase 50% do crude produzido diariamente em todo o mundo, liderado pela Rússia e pela Arábia Saudita, está sob fogo cerrado dos Estados Unidos para aumentar a produção, fazer descer os preços e ajudar Joe Biden nas eleições de Novembro.

Os 12 membros dos Países Exportadores (OPEP) e os nove desalinhados encimados pela Rússia, que vão reunir esta quarta-feira para análise dos mercados, como sucede todos os inícios de mês, deverão fazer, não o contrário do esperado nos EUA, mas aquilo que melhor os serve.

E, como tem sido repetidamente feito nos últimos meses, sempre que o mercado dá sinais de ceder à pressão dos Estados Unidos e aliados ocidentais, o "cartel", primeiro ameaça rever a quota da produção e, depois, anuncia a extensão do calendário dos cortes em vigor...

Os mercados também respondem sempre da mesma forma: de mansinho, corrigem a trajectória e o barril volta a valorizar ou, no mínimo, a travar as quedas.

E basta olhar para o primeiro parágrafo da notícia da Reuters sobre os mercados nesta segunda-feira, 01 de Abril, para perceber isso mesmo... ali surge em destaque a ligeira subida, na primeira hora de negociações, depois mudou para o vermelho pouco carregado.

Diz a agência que os preços do crude subiam um bocadinho face à expectativa de aperto na produção da OPEP+ e a extensão dos cortes para Junho, aos ataques ucranianos às refinarias russas e aos dados positivos da produção fabril chinesa.

Isto, depois de um Março inteiro, como tinham já sido Janeiro e Fevereiro, com os mercados a subirem com fulgor, tanto no Brent, em Londres, a referência maior para as ramas exportadas por Angola, como no WTI de Nova Iorque, onde as razões pouco mudaram, incluindo o conflito em Gaza e os ataques Houthis no Mar Vermelho/Canal do Suez.

Há, porém, um dado que tem ficado de fora dos sumários das principais agências, tanto a Reuters como a Bloomberg, que são os ataques, inclusive com os seus misseis hipersónicos Khinzal, aos gigantescos depósitos subterrâneos de gás natural no oeste da Ucrânia, que eram reservas geridas pelos países da Europa ocidental.

E com estas perdas, as compras de energia entre o bloco ocidental europeu tende a subir, como, de resto, está em evidência nas notícias desta segunda-feira, 01, com uma subida de mais de cem mil barris por dia em Fevereiro, que a Reuters especifica que é largamente mais que o esperado, especialmente depois da quebra de 200 mil bpd que se estimava para este ano.

A alinhar com esta triangulação de efeitos e causas, eis que dos EUA chegam notícias pouco animadoras para as próprias expectativas da Administração Biden, que é uma quebra inesperada de 6% na produção do maior extractor de crude do mundo entre Dezembro de 2023 e Fevereiro deste ano.

A crescente subida dos resultados da actividade industrial chinesa é, no entanto, o elemento mais estrutural de todos os que têm estado a realinhar os gráficos nos mercados, e que, nos essenciais deste negócio, é o que mais conta para projecções de longo termo.

Alias, como o Novo Jornal sublinhava aqui, os grandes do mundo financeiro estão, em geral, alinhados na ideia de que o petróleo vai continuar a subir até 2025, admitindo-se que passe em alta os 100 USD ainda este ano, o que é uma grande notícia para a economia angolana.

E a razão para isso é simples de explicar...

Nesta segunda-feira, perto das 13:00, hora de Luanda, o barril de Brent estava a valer 86,35 USD, perdendo escassos 0,2% face ao fecho de sexta-feira última, mas os dados estão lançados e o advir será sempre a subir... se nada de estranho suceder, o que não seria nada de extraordinário neste negócio que vive essencialmente de surpresas, reais ou ficcionadas...

Apesar de ter abandonado a OPEP recentemente, Angola, que é um dos produtores e exportadores que mais dependem da matéria-prima em todo o mundo, devido à escassa diversificação económica, ter o Brent nos 86 USD permite, embora não seja o antidoto definitivo, diluir alguns dos efeitos devastadores da crise cambial e inflacionista, até porque o país enfrenta também o problema da persistente redução da produção diária.

Com OGE 2024 elaborado com um valor de referência médio para o barril de 65 USD, estes valores actuais permitem um relativo optimismo, mas aumentar a produção é o factor-chave, o que ficou mais fácil depois de Angola ter, em Dezembro passado, anunciado a saída de membro da OPEP, o que deixa um eventual acréscimo da produção fora dos limites impostos pelo cartel aos seus membros como forma de manter os mercados equilibrados entre oferta e procura.

O crude ainda responde por cerca de 90% das exportações angolanas, 35% do PIB nacional e 60% das receitas fiscais do país, o que faz deste sector não apenas importante mas estratégico para o Executivo.

O Presidente da República, João Lourenço, deposita esperança, no curto e médio prazo, de conseguir o objectivo de aumentar a produção nacional, actualmente perto dos de 1,12 mbpd, gerando mais receita no sector de forma a, como, por exemplo, está a ser feito há anos em países como a Arábia Saudita ou os EAU, usar o dinheiro do petróleo para libertar a economia nacional da dependência do... petróleo.

O aumento da produção nacional não está a ser travada por falta de potencial, porque as reservas estimadas são de nove mil milhões de barris e já foi superior a 1,8 mbpd há pouco mais de uma década, o problema é claramente o desinvestimento das majors a operar no país.

Aliás, o Governo de João Lourenço tem ainda como motivo de preocupação uma continuada e prevista redução da produção de petróleo, que se estima que seja na ordem dos 20% na próxima década, estando actualmente pouco acima dos 1,1 milhões de barris por dia (mbpd), muito longe do seu máximo histórico de 1,8 mbpd em 2008.

Por detrás desta quebra, entre outros factores, o desinvestimento em toda a extensão do sector, deste a pesquisa à manutenção, quando se sabe que o offshore nacional, com os campos a funcionar, está em declínio há vários anos devido ao seu envelhecimento, ou seja, devido à sua perda de crude para extrair e as multinacionais não estão a demonstrar o interesse das últimas décadas em apostar no país.

A questão da urgente transição energética, devido às alterações climáticas, com os combustíveis fosseis a serem os maus da fita, é outro factor que está a esfumar a importância do sector petrolífero em Angola.