Se os carros de combate pesados alemães Leopard-2 e os norte-americanos M1 Abrams estão na calha para chegar à frente de batalha na Ucrânia, com o objectivo de ajudar os ucranianos a expulsar os russos, a burocracia e a pesada logística que estas complexas máquinas exigem, estão a encalhar as suas lagartas na lama do leste europeu, tornando quase incompreensível a incapacidade que os membros da NATO estão a demonstrar para ultrapassar esses obstáculos.

No caso dos "tanques", o atraso no M1 Abrams pode chegar a 12 meses com os norte-americanos a justificar com a sua complexa tecnologia - este usa uma turbina de avião e não um normal motor a diesel - e exigência de treino, e no caso dos Leopard-2, dia após dia vão-se somando semanas de indecisão e problemas, como aquele que Berlim acaba de anunciar, que é a impossibilidade de cumprir prazos - previamente estabelecido em 4 a 6 semanas - porque está a ser difícil reunir veículos em número suficiente para os programados dois batalhões a enviar para a Ucrânia, com a participação de vários países, devido à dificuldade em operacionaliza-los devido à falta de peças e munições.

A piorar o cenário para Kiev, o Financial Times divulgou um artigo onde explica que o envio dos M1 Abrams para a Ucrânia é, em vez de um impulso na capacidade ucraniana, um entrave, porque vão exigir um enorme esforço em homens e meios apenas ara garantir a sua logística e operacionalidade, especialmente com a quase certa débil resposta no terreno às avarias que serão, seguramente, muitas, expondo estes veículos e as equipas humanas que os acompanham de perto, ao fogo inimigo...

O seu principal problema, sem a manutenção assegurada pelas equipas norte-americanas, é que o seu motor de avião, se por um lado garante maior velocidade ao veículo de 70 toneladas, por outro exige uma permanente revisão para não ficar atolado e em posição vulnerável às unidades "caça-tanques" russas.

Mas a este, soma-se outra situação onde as sonoras promessas de envio de armamento colidem com a falta de celeridade e eficácia na entrega, como é o caso dos roquetes com alcance de 150 kms norte-americanos, para usar no sistema de lançamento HIMARS, que, afinal, são uma arma nova, pouco testada e que ainda nem sequer saíram das fábricas aqueles que vão ser enviados para a Ucrânia no âmbito do último pacote de apoio militar de Washington no valor de 2,2 mil milhões USD.

Tudo isto, com as forças ucranianas a enfrentarem uma iminente ofensiva russa terrestre, sendo que esta já está, segundo vários analistas militares, a decorrer pelo ar, através do reforço dos ataques com misseis, artilharia pesada e aviação, especialmente no Donbass, onde Moscovo pretende assegurar nas próximas semanas a tomada de todo o território das províncias de Donetsk e Lugansk, estado o poder de fogo mais relevante concentrado na área de Bakhmut.

É igualmente facto que, como têm, curiosamente, e em contraste com a até aqui vangloria dos feitos ucranianos, noticiado alguns media ocidentais, como o NYT ou a Reuters, ou ainda o Washington Post, as forças ucranianas estão a sofrer revês atrás de revês, com alguns analistas citados a admitirem que as forças russas podem ter sido subavaliadas na sua capacidade combativa.

A isto soma-se ainda que o Governo de Kiev parece em dificuldades para se libertar da sombra da corrupção, com, depois do escândalo de há duas semanas, ter agora chegado a vez do ministro da Defesa, Aleksey Reznikov, ser afastado devido à sua ligação aos desvios apurados, embora os media ocidentais estejam a noticiar, citando um aliado de Zelensky, que este apenas mudará de pasta ministerial para amenizar o efeito devastador na imagem do Executivo de Kiev.

Mas não há, apesar de tudo indicar que se prepara um prolongamento extenuante deste conflito, quem avance com um mapa onde o "X" da paz esteja claramente marcado, sendo o mais parecido com isso a defesa ocidental, como é o caso da França, que, ainda hoje, 06, numa operação de comunicação de guerra, que envolveu os departamentos África do seu Ministério dos Negócios Estrangeiros, quando perguntados por um jornalista a partir de Hararé, no Zimbabué, sobre qual a saída diplomática defendida por Paris, ouviu como resposta que é o plano em 10 pontos para a paz anunciada há meses pelo Presidente Zelensky, onde se fixa como premissa inamovível a saída dos russos de todo o território ucraniano, incluindo a Crimeia e as províncias anexadas em Setembro do ano passado após referendo.

Ora, é dado como certo e seguro pela generalidade dos analistas que esta condição jamais será tomada em consideração pelo Kremlin, o que faz com que o "plano Zelensky" seja o mesmo que nada, e o mesmo que, quem o defende, dizer que a solução é derrotar no campo de batalha a Rússia, a maior potência nuclear do mundo, como, alias, defendem os lideres europeus da Comissão, Ursula Leyen, e o chefe da diplomacia de Bruxelas, Joseph Borrell, colocando o mais grave conflito na Europa desde o fim da II Guerra Mundial, em 1945, num beco sem saída e com a possibilidade cada vez mais efectiva de este evoluir para um confronto directo entre a NATO e a Federação Russa, a antecâmara de uma devastadora guerra nuclear global.

Wanted - dead or live

A palavra é bem conhecida dos filmes de "cow boys", os velhos westerns norte-americanos, onde em cartazes com as suas fotografias, os bandidos era procurados e atribuídas recompensas a quem os apanhasse, "dead or live - vivos ou mortos", técnica que agora os russos estão a usar para lidar com a ameaça dos blindados pesados alemães e norte-americanos, os Leopard-2 e os M1 Abrams Made in USA.

Depois de uma empresa privada ter dito que pagaria 70 mil euros a quem fizer arder o primeiro tanque ocidental, e 7 mil euros por cada um dos restantes, também as autoridades russas locais, como o Governador de Zabaikalsky, Alexander Osipov, que assinou um decreto onde garante o pagamento aos seus militares que capturarem um dos tanques e 14 mil a quem destruir um Leopard-2 ou um M1 Abrams.

Face a esta estratégia de recompensa pelo "abate" dos tanques ocidentais, o Kremlin, segundo o seu porta-voz Dmitri Peskov, mostra-se em completo acordo porque isso "demonstra unidade e entusiasmo" em levar a cabo com sucesso esta operação militar na Ucrânia.

Contexto da guerra na Ucrânia

A 24 de Fevereiro de 2022 as forças russas iniciaram a invasão da Ucrânia por vários pontos, tendo o Presidente russo dito que se tratava de uma "operação militar especial", sublinhando que o objectivo não era (é) a ocupação do país vizinho, condição que evoluiu depois para a anexação de territórios no Donbass mas também as regiões de Kherson e Zaporijia, mas sim a sua desmilitarização e desnazificação e assegurar que Kiev não insiste na adesão à NATO, o que Moscovo considera parte das suas garantias vitais de segurança nacional.

O Kremlin critica há vários anos fortemente o avanço da NATO para junto das suas fronteiras, agregando os antigos membros do Pacto de Varsóvia, organização que também colapsou com a extinção da URSS, em 1991.

Moscovo visa ainda garantir o reconhecimento de Kiev da soberania russa da Península da Crimeia, invadida e integrada na Rússia, depois de um referendo, em 2014, e ainda a independência das duas repúblicas do Donbass, a de Donetsk e de Lugansk, de maioria russófila, que o Kremlin já reconheceu em Fevereiro, tendo acrescido a esta reivindicação as províncias de Kherson e Zaporijia, depois da realização de referendos que a comunidade internacional, quase em uníssono, não reconhece.

Do lado ucraniano, a visão é totalmente distinta e Putin é acusado de estar a querer reintegrar a Ucrânia na Rússia como forma de reconstruir o "império soviético", que se desmoronou em 1991, com o colapso da União Soviética.

Kiev insiste que a Ucrânia é una e indivisível e que não haverá cedências territoriais como forma de acordar a paz com Moscovo, sendo, para o Presidente Volodymyr Zelensky, essencial o continuado apoio militar da NATO para expulsar as forças invasoras.

A organização militar da Aliança Atlântica está a ser, entretanto, acusada por Moscovo de estar a desenrolar uma guerra com a Rússia por procuração passada ao Exército ucraniano, o que eleva, segundo o ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Sergei Lavrov, o risco de se avançar para a III Guerra Mundial, com um confronto directo entre a Federação Russa e a NATO, que tanto o Presidente dos EUA, Joe Biden, como o Presidente Vladimir Putin, da Rússia, já admitiram que se isso acontecer é inevitável o recurso ao devastador arsenal nuclear dos dois lados desta barricada que levaria ao colapso da humanidade tal como a conhecemos.

Esta guerra na Ucrânia contou com a condenação generalizada da comunidade internacional, tendo a União Europeia e a NATO assumido a linha da frente da contestação à "operação especial" de Putin, que se materializou através de bombardeamentos das principais cidades, por meio de ataques aéreos, lançamento de misseis de cruzeiro e artilharia pesada, e com volumosas colunas militares a cercarem os grandes centros urbanos do país, mas que agora está concentrada no leste e sudeste da Ucrânia.

Na reacção, além da resistência ucraniana, Moscovo contou com o maior pacote de sanções aplicadas a um país, que está a causar danos avultados à sua economia, sendo disso exemplo a queda da sua moeda nacional, o rublo, que chegou a ser superior a 60%, embora já tenha, entretanto, recuperado.

Estas sanções, que já levaram as grandes marcas mundiais a deixar a Rússia, como as 850 lojas da McDonalds, a mais simbólica, abrangem ainda os seus desportistas, artistas, homens de negócios, a banca e grande parte das suas exportações, ficando apenas de fora o sector energético, do gás natural e em pate do petróleo...

Milhares de mortos e feridos e mais de 5,5 milhões de refugiados nos países vizinhos da Ucrânia são a parte visível deste desastre humanitário.

O histórico recente desta crise no leste europeu pode ser revisitado nos links colocados em baixo, nesta página.