Os dois lideres, turco e russo, que se vão encontrar à margem da Cimeira tripartida que tem a Síria como motivo, têm na agenda que foi divulgada pelos seus serviços de imprensa, a questão dos cereais ucranianos prontos para serem exportados e assim diluir a pressão da fome que se espalha um pouco por todo o mundo mas que tem em África as consequências mais devastadoras.

Em cima da mesa está a questão que há largas semanas mantém ocupadas as instituições internacionais, como as agências da ONU e as organizações regionais, como a União Africana, que é o impedimento por detrás da saída de milhões de toneladas de cereais ucranianos dos portos do sul deste país que está em guerra com a Rússia desde 24 de Fevereiro.

Se, por um lado, Kiev, acusa os russos de estarem a impedir a saída dos navios com os cereais, devido ao bloqueio naval existente, Moscovo refuta a acusação e diz que são as minas navais dispersas pelo Mar Negro pelas forças ucranianas que estão a impedir a circulação marítima na região, mantendo-se um impasse há semanas que, agora, com o Presidente turco na condição de mediador, as partes procuram ultrapassar, sendo este encontro de Teerão considerado pelos analistas como excepcionalmente importante e decisivo para Recep Eddogan que precisa de um sucesso internacional para aumentar o seu prestígio enquanto líder internacional.

Uma das indicações de que podem haver resultados palpáveis deste encontro está nas palavras do ministro russo dos Negócios Estrangeiros, Srrgei Lavrov, que disse estar em curos um trabalho de "desmontagem de mitos" em torno da questão dos cereais ucranianos que é a ideia de que é Moscovo que "está deliberadamente a impedir a saída dos cereais".

O outro mito é que são os cereais ucranianos em falta no mercado global que estão a gerar insegurança alimentar no mundo, quando dados da ONU apontam para que anualmente o mundo produza 800 milhões de toneladas de grãos e que a Ucrânia produza para exportação apenas 20 milhões de toneladas de um total de 33 milhões, o que Moscovo sublinha não poderem resolver o problema como os media ocidentais insistem em divulgar como facto.

Estas questões estão hoje em cima da mesa em Teerão.

E a guerra na Ucrânia não sairá do ecrã

Isso mesmo ficou claro nas declarações recentes do líder do Partido Liberal Democrático da Rússia (LDPR), Leonid Slutsky, um extremista de direita que integra a delegação russa nas negociações com a Ucrânia, ao sublinhar que, quando as partes voltarem à mesa das negociações, as exigências de Moscovo vão ser "muito mais duras" em termos de substância e de tempo.

O político, considerado um radical mas com peso político devido à forte presença do seu partido nos corredores da política russa, e porque está alinhado com a parte mais dura da comitiva enviada pelo Kremlin, sublinhou que Moscovo vai exigir não só uma célere desmilitarização da Ucrânia como também uma total limpeza de nazis no regime de Kiev.

Apesar destas declarações, não são conhecidas novas movimentações diplomáticas que visem a reactivação das negociações entre as delegações russa e ucraniana.

Enquanto isso, o ministro da Agricultura da Alemanha, Cem Özdemir, disse na segunda-feira que não acredita minimamente na palavra do Presidente Russo, Vladimir Putin, quanto a uma possibilidade de abrir um corredor no Mar Negro para a saída dos cereais ucranianos, tendo mesmo sublinhado que acreditar na palavra do senhor do Kremlin é o mesmo que acreditar no pai natal ou no coelho da Páscoa.

Cem Özdemir, de origem turca, fez estas declarações pouco amistosas sobre o líder russo a propósito da sua deslocação a Teerão onde se vai encontrar com o Presidente turco, Erdogan, e com o iraniano Ebrahim Raisi, para discutir precisamente a questão do alegado bloqueio marítimo aos grãos ucranianos.

"A palavra de Putin não vale o papel em que está escrita", disse Özdemir em Bruxelas entes de entrar para uma reunião dos ministros da agricultura da União Europeia.

Mais sanções de Bruxelas contra Moscovo

Entretanto, de Bruxelas chegam novas sanções à Rússia devido à invasão da Ucrânia, juntando-se este pacote renovado às largas centenas de sanções aplicadas ao regime de Moscovo, às suas empresas, especialmente do sector financeiro, e figuras gradas do Kremlin, numa demonstração de que a União Europeia está apostada em reforçar a sua disponibilidade em apoiar os Estados Unidos em enfraquecer a Rússia como pediu de forma evidente a ministração de Joe Biden, nomeadamente por Lloyid Austin, Secretário da Defesa, e ANtony Blinken, Secretário de Estado.

Neste pacote de sanções o destaque vai para a UMMC, o gigante russo do zinco e do cobre, e o Sberbank, o maior banco russo, que estava fora da lista dos sancionados devido à sua importância estratégica para a efectivação dos pagamentos das importações europeias de gás e petróleo.

Juntam-se ainda mais 48 nomes de figuras próximas de Putin e nove entidades acusadas de apoiar o esforço de guerra russo na Ucrânia.

Um dos motivos cimentos destas sanções é isolar a Rússia no mundo, o que Vladimir Putin tem insistido ser uma impossibilidade, o que alguns analistas corroboram sublinhando que Moscovo manteve, apesar dos esforços de Washington, Londres e Bruxelas para o impedir, ligações diplomáticas e comerciais intensas com dois terços do mundo, sendo apenas excepção o ocidente liderado pelos Estados Unidos.

Sublinhe-se que este novo pacote de sanções abrangendo o Sberbank impede a totalidade das transacções com o Ocidente, excepto alimentos e fertilizantes, o que deverá levar Moscovo a agir, provavelmente, como está a fazer com o gás natural, antecipando-se às medidas anunciadas pelo bloco europeu e fechando a torneira para a Europa ocidental, o que está a gerar pânico em algumas economias, como a alemã, que tem os seus industriais a admitir um colapso da economia germânica se esta ficar desprovida do fornecimento de energia russa de um dia para o outro no próximo Inverno.

Contexto da guerra na Ucrânia

A 24 de Fevereiro as forças russas iniciaram a invasão da Ucrânia por vários pontos, tendo o Presidente russo dito que se tratava de uma "operação militar especial", sublinhando que o objectivo não é a ocupação do país vizinho mas sim a sua desmilitarização e desnazificação e assegurar que Kiev não insiste na adesão à NATO, o que Moscovo considera parte das suas garantias vitais de segurança nacional.

O Kremlin critica há vários anos fortemente o avanço da NATO para junto das suas fronteiras, agregando os antigos membros do Pacto de Varsóvia, organização que também colapsou com a extinção da URSS, em 1991.

Moscovo visa ainda garantir o reconhecimento de Kiev da soberania russa da Península da Crimeia, invadida e integrada na Rússia, depois de um referendo, em 2014, e ainda a independência das duas repúblicas do Donbass, a de Donetsk e de Lugansk, de maioria russófila, que o Kremlin já reconheceu em Fevereiro.

Do lado ucraniano, a visão é totalmente distinta e Putin é acusado de estar a querer reintegrar a Ucrânia na Rússia como forma de reconstruir o "império soviético", que se desmoronou em 1991, com o colapso da União Soviética.

Kiev insiste que a Ucrânia é una e indivisível e que não haverá cedências territoriais como forma de acordar a paz com Moscovo, sendo, para o Presidente Volodymyr Zelensky, essencial o continuado apoio militar da NATO para expulsar as forças invasoras.

A organização militar da Aliança Atlântica está a ser, entretanto, acusada por Moscovo de estar a desenrolar uma guerra com a Rússia por procuração passada ao Exército ucraniano, o que eleva, segundo o ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Sergei Lavrov, o risco de se avançar para a III Guerra Mundial, com um confronto directo entre a Federação Russa e a NATO, que tanto o Presidente dos EUA, Joe Biden, como o Presidente Vladimir Putin, da Rússia, já admitiram que se isso acontecer é inevitável o recurso ao devastador arsenal nuclear dos dois lados desta barricada que levaria ao colapso da humanidade tal como a conhecemos.

Esta guerra na Ucrânia contou com a condenação generalizada da comunidade internacional, tendo a União Europeia e a NATO assumido a linha da frente da contestação à "operação especial" de Putin, que se materializou através de bombardeamentos das principais cidades, por meio de ataques aéreos, lançamento de misseis de cruzeiro e artilharia pesada, e com volumosas colunas militares a cercarem os grandes centros urbanos do país, mas que agora está concentrada no leste e sudeste da Ucrânia.

Na reacção, além da resistência ucraniana, Moscovo contou com o maior pacote de sanções aplicadas a um país, que está a causar danos avultados à sua economia, sendo disso exemplo a queda da sua moeda nacional, o rublo, que chegou a ser superior a 60%, embora já tenha, entretanto, recuperado.

Estas sanções, que já levaram as grandes marcas mundiais a deixar a Rússia, como as 850 lojas da McDonalds, a mais simbólica, abrangem ainda os seus desportistas, artistas, homens de negócios, a banca e grande parte das suas exportações, ficando apenas de fora o sector energético, do gás natural e em pate do petróleo...

Milhares de mortos e feridos e mais de 5,5 milhões de refugiados nos países vizinhos da Ucrânia são a parte visível deste desastre humanitário.

O histórico recente desta crise no leste europeu pode ser revisitado nos links colocados em baixo, nesta página.