O resultado deste encontro de Domingo, 28, em Washington, não podia ser diferente de todos os encontros realizados nos últimos meses entre o Presidente ucraniano e o Presidente norte-americano (ver links em baixo), que é, com poucas diferenças, que a guerra vai continuar porque Zelensky não cede em praticamente nada, Trump mostra o seu optimismo difícil de explicar para as câmaras de televisão e em Moscovo Vladimir Putin coça a cabeça a tentar perceber o que vai na cabeça daqueles dois.

É que, apesar de as televisões e jornais internacionais focarem a sua narrativa nas palavras optimistas de Donald Trump, sobre a possibilidade de a guerra acabar dentro de semanas e de um inexplicável anúncio de que 95% do plano de paz está conseguido quando, na verdade, se refere apenas ao entendimento entre ucranianos e norte-americanos.

E a guerra não tem como acabar nas próximas semanas pela via negocial, podendo chegar ao fim se a Rússia conseguir os seus objectivos maximalistas pela via militar, o que também não é claro, apesar dos ganhos territoriais importantes recentes, porque o plano de 20 pontos de Volodymyr Zelensky, que foi desenhado com a contribuição dos seus aliados europeus, não cede em nada do que a Rússia poderia considerar o mínimo para ponto de partida negocial.

Se Zelensky quer garantias de segurança dos EUA que envolvem a presença militar ocidental no terreno e um "gatilho" que garanta a entrada em cena das forças da NATO contra a Rússia em caso do reatar do conflito após o acordo de paz assinado, mantendo um Exército de 800 mil soldados e a possibilidade de adesão à NATO no futuro, em Moscovo nada destas condições são aceitáveis e são para rejeitar sem sequer negociar.

Embora Putin já tenha mostrado que não quer alienar o que já foi feito na retoma das relações bilaterais entre Estados Unidos e a Federação Russa desde que Trump chegou à Casa Branca, a 20 de Janeiro deste ano, também já repetiu tantas vezes quais as suas condições para terminar o conflito que é impossível que o seu homólogo norte-americano não as conheça de cor e salteado.

E é tanto assim que o chefe do Kremlin não apenas repete as condições para o fim da guerra, que são, em síntese, nada de NATO para a Ucrânia, a aceitação da soberania russa nas cinco regiões anexadas em 2014 (Crimeia) e 2022 (Lugansk, Donetsk, Kherson e Zaporizhia) e a desmilitarização da Ucrânia, sem nenhumas forças ocidentais no país, como garante, sempre que Trump repete o seu optimismo negocial, que Moscovo vai conseguir o que quer na mesa das negociações ou no terreno através de acções militares.

E, como dizia na CNN Portugal o major-general Agostinho Costa, quando não se quer dizer que não a uma proposta para não extinguir a chama da esperança, nomeiam-se grupos de trabalho para analisar, estudar e propor soluções sobre determinado problema. Que é o que Washington acaba por fazer ao propor grupos de trabalho para temas como as questões de segurança para a Ucrânia e para a Rússia ou as questões económicas no âmbito deste conflito, incluindo as sanções à Rússia e a reconstrução da Ucrânia, e que, no Kremlin, Putin já disse que aceitava esse caminho, naquilo que é um claro sinal de que a conversa em Washington com Zelensky e Trump só serve para dar lastro mediático ao Presidente ucraniano quando e sempre que é visto ao lado do Presidente dos EUA.

Putin, como explicou o seu conselheiro para questões internacionais, Yury Ushakov, disse a Trump, na conversa telefónica que mantiveram no dia em que o americano recebia Zelebsky na Casa Branca, que achava boa ideia a criação de grupos de trabalho específicos, cuja definição será trabalhada nas semanas vindouras, o que é visto por analistas distintos como uma forma expedita de garantir que o processo negocial não morre depois de se conhecer o resultado do falhado encontro em Washington com o ucraniano.

É que, depois da conversa com Trump, Zelensky veio dizer publicamente que EUA e Ucrânia concordaram em 90% do plano de paz de 20 pontos que levou para a Casa Branca referente e com 100% de entendimento no que diz respeito às garantias de segurança, o que tanto Zelensky como Trump sabem que se trata de uma equação impossível conhecendo minimamente as condições russas, repetidamente expostas por Vladimir Putin.

Como era fundamental, depois de ter concordado com Putin, horas antes, via telefone, na criação de grupos de trabalho, que são a solução mágica para empurrar com a barriga os problemas, Trump disse, na mesma conferência de imprensa de Zelensky, que a questão dos territórios "é a mais complicada" e sobre s qual não existe entendimento entre Kiev e Washington, mas que "existem progressos e o fim da guerra está mais próximo que nunca".

O Presidente norte-americano, que, recorde-se, mantém neste processo a complexa e ambígua condição de mediador e de fornecedor de armas a Kiev ao mesmo tempo, defende que 95% do plano está concluído no que diz respeito ao pensamento sobre o assunto dos EUA embora se saiba que da parte russa, o que foi conseguido não é sequer suficiente para começar a negociar, daí a ideia dos grupos de trabalho...

É que nem sequer existe matéria-prima negocial para que russos e ucranianos acordem um cessar-fogo, como Zelensky tanto insiste e Putin diz que apenas serviria para os ucranianos se rearmarem e ganharem tempo para depois regressarem ao combate mais fortalecidos pelo apoio europeu, quando se sabe que na frente de combate as forças de Kiev enfrentam mais problemas que nunca e as russas somam conquistas em áreas e localidades a um ritmo que não era visto desde o início do conflito, como reconhece o site ligado ao Ministério da Defesa ucraniano "Deep State".

Fazer um resumo destas frenéticas horas que marcam o final de 2025 e esta guerra se aproxima do 4º aniversário, a 24 de Fevereiro, sendo já, de longe a mais longa e letal na Europa desde a II Guerra Mundial, não é fácil, até porque mediaticamente decorre outra guerra, entre os media ocidentais pró-Kiev e os russos ou canas nas redes sociais pró-Moscovo.

Mas uma possibilidade é esta: Zelensky não quer que a guerra acabe porque disso depende a sua continuação no poder, sabendo, como as sondagens mostram, que se realizar eleições perde com larga diferença para qualquer outro candidato; em Moscovo Putin não precisa de acabar a guerra porque está a conseguir militarmente o que lhe escapa na mesa das negociações; e em Washington, Trump tem de fazer de conta que está a negociar a sério enquanto retira lentamente apoio militar a Kiev até que a Ucrânia se veja obrigada a ceder face às crescentes dificuldades na frente de bastalha.

Com este cenário, todos conseguem os seus objectivos no todo ou em parte: Zelensky prolonga a sua permanência no poder mesmo que o seu mandato já tenha terminado legalmente em Maio de 2024, Putin vê no mapa o seu domínio sobre o leste ucraniano a crescer dia após dia e em Washington Trump pode sempre dizer que nunca desistiu de buscar a paz entre "dois homens que se odeiam de morte" como tem dito repetidamente.

Com isto, Washington e Moscovo retomam as suas relações bilaterais que estavam no charco antes de Trump chegar ao poder, Moscovo e Washington relegam a União Europeia para um rodapé da História, e Washington, Moscovo e Pequim, com Nova Deli a entrar paulatinamente neste xadrez onde se reduz a cinzas a velha Ordem Mundial Baseada em Regras e emerge um novo mundo onde as superpotências dividem o globo por "Esferas de influência" onde a Europa Ocidental é o resto zero deste complexo e novo "grand jeu" e a Ucrânia não tem importância nenhuma...