Este alerta dos bispos católicos congoleses surge num momento de agravamento da violência no leste da RDC, onde, há décadas, múltiplas guerrilhas, maioritariamente originárias dos países vizinhos, espalham o terror nas províncias do Kivu Norte, Kivu Sul, Ituri e mesmo no Grande Katanga, de forma a explorar os recursos naturais sem a pressão do Estado central, sendo que, agora, acrescentam a questão da islamização e a repressão às actividades religiosos que não a islâmica.

A chamada de atenção para a presença de grupos que procuram islamizar as comunidades desta vasta região, tradicionalmente cristãs ou animistas (veneração de divindades ancestrais que não são reconhecidas pelas principais religiões) surge num momento em que, no norte de Moçambique, a violência jihadista está a atingir picos de terror que chocam o mundo, com origem em milícias formadas a partir da Tanzânia, país que faz também fronteira com o leste da RDC, no Kivu Sul e Katanga.

A CENCO chamou a atenção, numa conferência de imprensa recente, em Kinshasa, para o surgimento de forças rebeldes que procuram ocupar largas extensões de terras aproveitando os "pontos fracos" das forças de segurança congolesas para alastrarem os seus interesses, sejam eles políticos, económicos ou, agora, também religiosos, embora, a partir dos relatos da imprensa congolesa, não tenha sido feita qualquer referência ou ligação entre esta nova realidade no leste da RDC e o terror jihadista na província moçambicana de Cabo Delgado.

Os bispos congoleses pediram, em conferência de imprensa, que o Governo de Kinshasa e a Missão da ONU para a RDC (MONUSCO) criem uma base permanente de concertação para a paz e a coesão nacional.

É ainda feita uma chamada de atenção para a possibilidade de elementos das Forças Armadas segurança da RDC, as FARDC, tenham já sido arregimentados por estes grupos e sejam agentes ao seu serviço enquadrados nas forças de segurança nacionais.

Embora não tenha sido feita qualquer ligação entre a situação trágica que vive o norte de Moçambique e esta nova realidade no leste da RDC, a verdade é que o início do fenómeno em Cabo Delgado começou igualmente com o surgimento de grupos armados, organizados por elementos radicais oriundos da Tanzânia, mas também da Somália, que, nos últimos anos foram radicalizando as comunidades locais, especialmente os mais jovens, a ponto de o norte de Moçambique ser hoje uma das regiões do mundo mais violentas por acção de grupos de radicais islâmicos.

A RDC partilha uma fronteira com milhares de quilómetros com Angola, cerca de 2.500 kms.

SADC considera ameaça jihadista um problema para toda a África Austral

A vaga de terror jihadista que há mais de três anos varre a província de Cabo Delgado, no norte de Moçambique, é uma ameaça a toda a África Austral e deve ser combatida em conjunto pelos Estados que compõem a Comunidade de Desenvolvimento desta sub-região do continente africano, defendeu, na semana passada, em Maputo, o chefe do Órgão de Defesa e Segurança da SADC e Presidente do Botsuana.

O líder rotativo do Órgão de Defesa e Segurança (ODS) da SADC e Presidente do Botsuana,Mokgweetsi Masisi, na Cimeira de Chefes de Estado e de Governo da SADC que teve lugar na capital moçambicana, subordinada à análise dos ataques em Cabo Delgado, defendeu que os países que compõem esta organização sub-regional, da qual faz parte Angola, têm de unir esforços para derrotar o terrorismo islâmico no norte de Moçambique.

Mokgweetsi Masisi propôs mesmo uma "resposta colectiva" para um problema que, mais cedo ou mais tarde, transbordará das fronteiras moçambicanas para outros países da África Austral.

Uma das razões comummente apontadas para o alastramento da influência destes grupos de cariz religioso radical islâmico é o descontentamento e a pobreza gerada por diversos factores, como, por exemplo, a pandemia da Covid-19, numa vasta lista de países africanos.

Esta Cimeira de Maputo foi organizada num contexto onde a comunidade internacional, com destaque para os parceiros de Moçambique no continente, estão a oferecer ajuda no combate aos radicais do al-shabbab (estado islâmico) mas com uma resposta do Presidente Filipe Nyusi que tem gerado controvérsia e que vai no sentido de defender que, por razões ce soberania, devem ser apenas tropas moçambicanas a enfrentar o terreno estes grupos armados que espalham o terror em Cabo Delgado, com cenas chocantes de decapitações e desmembramento de corpos de pessoas.

Estes ataques, recorde-se, já levaram a uma debandada de mais de 1 milhão de pessoas das suas casas e a morte de largas centenas de pessoas, incluindo estrangeiros ligados ao projecto de exploração de gás natural da Total.

O episódio mais recente, a 24 de Março, envolveu um ataque de larga escala à vila de Palma, que obrigou milhares de pessoas a procurarem, primeiro, refúgio, nas matas densas da região, e, depois, em Pemba, a capital da província de Cabo Delgado, a centenas de quilómetros dali, em busca de alimentos e abrigo.