Cerca de 40 milhões de eleitores votam este domingo para escolher o sucessor de Joseph Kabila, que deixa o poder depois de 18 anos. No entanto, fora do escrutínio deste domingo está mais de 1 milhão de cidadãos, o que levou a oposição e a população a contestarem a decisão da Comissão Nacional Eleitoral Independente (CENI).
No boletim de voto que os congoleses vão preencher constam 21 candidatos, destacando-se os concorrentes Emmanuel Ramazani Shadary, Martin Fayulu, e Félix Tshisekedi. Além do próximo Presidente, os eleitores vão escolher os representantes parlamentares nacionais e provinciais.
A violência foi uma constante durante a campanha eleitoral, que terminou na sexta-feira.
A organização não-governamental Associação Congolesa de Acesso à Justiça (ACAJ) contabilizou pelo menos dez mortos, a maioria durante comícios da oposição e em manifestações contra o candidato da coligação no poder - a Frente Comum para o Congo.
Inicialmente previstas para 2016, as eleições foram adiadas por duas vezes. O exercício eleitoral deverá contar com cerca de 270 mil observadores nacionais e internacionais, tendo o Governo congolês vetado a presença de algumas missões internacionais, incluindo da União Europeia e da Fundação Carter, o que levou a oposição a alertar para eventuais fraudes.
Nas conclusões do relatório elaborado pelo norte-americano CRG, destacam-se a intencionalidade da coligação no poder, liderada por Joseph Kabila, em adiar a realização de eleições com recurso a expedientes para os quais utilizou a Comissão Nacional Eleitoral Independente (CENI), o Governo e o Parlamento, elaborando propositadamente um orçamento para as eleições muito abaixo das necessidades e alocando meios técnicos e logísticos aquém do que seria esperado.
RDC, a maldição da riqueza num dos países mais pobres do mundo
Diamantes, petróleo e outros recursos naturais fazem da República Democrática do Congo (RDC), um dos países mais ricos de África, mas a população, massacrada por conflitos sangrentos, governantes corruptos e epidemias, continua a ser das mais pobres do mundo.
Ocupando o primeiro lugar entre os "mais pobres" do mundo (países com um PIB [Produto Interno Bruto] per capita anual inferior a 1.000 dólares), em 2017, o rendimento anual de um congolês não ia além dos 439 dólares, segundo a consultora Focus Economics.
As projecções para 2019 apontam para um aumento de apenas 36 dólares nestes rendimentos, devendo a RDC manter a sua nada invejável posição no ranking da pobreza, apesar da imensa riqueza.
O quarto país africano mais populoso (81 milhões de habitantes em 2018, segundo a Organização das Nações Unidas - ONU), tem quase o mesmo tamanho da Europa ocidental e uma economia fortemente assente na indústria mineira.
As exportações são dominadas pelos diamantes (o país era o quarto maior produtor nos anos 1980 e ficou tristemente celebrizado pelos seus "diamantes de sangue"), mas são também abundantes o ouro e a prata, o cobre, cobalto, cádmio, zinco, manganês, estanho, germânio, urânio, rádio, bauxite, ferro e carvão.
Possui também grandes quantidades de madeira, uma matéria-prima que pôs mais uma vez o país sob os holofotes mundiais, depois das denúncias de organizações não-governamentais (ONG) que puseram em causa a legalidade da exploração deste recurso devido aos negócios nebulosos de algumas empresas.
Além das florestas, a agricultura é a principal actividade económica do país, representando quase metade do PIB, com o café, óleo de palma, borracha, algodão, açúcar, chá e cacau a sobressaírem como principais produções.
A vida selvagem e a natureza luxuriante, de densas florestas tropicais que abrigam um dos últimos refúgios de gorilas de montanha (o Parque Nacional de Virunga), são atractivos mais do que suficientes para atrair turistas, mas este potencial nunca foi suficientemente aproveitado devido às questões de segurança que tornam o destino pouco recomendável.
O antigo Zaire, renomeado Congo por Laurent Kabila quando substituiu Mobutu Sese Seko como chefe de Estado, tem uma história turbulenta, marcada pela violência e por guerras internas que deixaram milhões de mortos.
Ficaram bem conhecidas as atrocidades do rei belga Leopoldo II, que tornou o país no seu reino privado entre 1885 e 1908, e o primeiro Presidente do país, Patrice Lumumba, que liderou a independência dos antigos colonos belgas em 1960, teve menos de três meses de permanência no cargo, até ser executado a 05 de Setembro de 1960.
Entre 1965 e 1997, sob o longo jugo de Mobutu, a RDC mergulhou ainda mais na miséria, enquanto o Presidente via acumular a sua fortuna, gastando milhões de dólares num extravagante complexo residencial da sua aldeia natal que ficou conhecido como a "Versalhes da selva".
Como se não bastassem os conflitos e a exploração abusiva dos seus recursos, os congoleses viram-se a braços, recentemente, com o regresso de milhares de migrantes expulsos de Angola e uma nova epidemia do vírus Ébola, já considerada a pior de sempre na história do país.
A epidemia do vírus que se transmite por contacto físico através de fluidos corporais infectados e que provoca febre hemorrágica, foi declarada em 01 de Agosto deste ano, em Mangina, nas províncias de Kivu Norte e Ituri, tendo provocado a morte a 326 pessoas e infectado 549, segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS).
A RDC vai a eleições no domingo, pela primeira vez desde 2011, mas a disputa entre os principais candidatos pode agravar ainda mais as tensões.
A instabilidade política piorou nos últimos tempos face à pressão sobre o Presidente Joseph Kabila, que assumiu o poder após o assassínio do seu pai, Laurent Kabila em 2001, para abandonar o cargo.
Kabila foi reeleito em 2011 numa votação contestada e adiou várias vezes novas eleições até nomear, em Agosto, um candidato para lhe suceder. Emanuel Ramazani Shadary irá disputar o sufrágio com Félix Tshisekedi, um feroz crítico de Kabila e outros 19 candidatos.