A decisão de retirada russa da Síria, ou uma forte redução da sua presença, começa agora a ser percebida com a ideia de que, por detrás da "revolução" que depós Assad, está a tentativa de apanhar os russos numa armadilha bélica para os enfraquecer na frente ucraniana.
Isto, porque, segundo diversos analistas próximos de Moscovo, a mão da norte-americana CIA por detrás do avanço dos "recauchutados" extremistas da al qaeda e do daesh, agora rebaptizados de Hayat Tahrir al-Sham (HTS), pretendia levar os russos a empenhar recursos e meios na defesa do regime de Assad, como o fez em 2015.
Se Moscovo tivesse repetido o empenho na protecção de Bashar al-Assad, como o fez antes, contra o daesh, especialmente em Alepo, a segunda maior cidade síria, localizada no centro-norte do país, objectivamente teria de enfraquecer a sua frente de guerra na Ucrânia.
E isso seria um excelente presente de Natal para o Presidente Volodymyr Zelensky, que está à beira de uma derrota militar inapelável se não conseguir convencer, como, de resto, está claramente empenhado em fazer, os seus aliados ocidentais a entrarem directamente no conflito contra os russos na Ucrânia.
Aparentemente, e nos primeiros dias do avanço das forças rebeldes do HTS, liderados por Abu al-Jawlani, um antigo e bem conhecido líder jihadista seguidor de Ossama bin Laden no Iraque, que agora aparou a barba e o cabelo e se veste com o mesmo dress code que Zelensky, os russos ainda fizeram levantar os seus caças e fizeram avançar as unidades do antigo Wagner para Alepo.
Mas rapidamente perceberam que isso os levaria directamente para a boca do lobo, ou para a armadilha letal de uma guerra para a qual não dispunham de meios locais para enfrentar, contra largos milhares de combatentes de vários grupos radicais, sendo o mais relevante o HTS de Jawlani, treinados pela Turquia e pelas secretas dos EUA e de Israel, com financiamento da União Europeia e dos países árabes do Golfo.
O Kremlin não apenas retirou da linha de combate, como, segundo o próprio, contra a sua vontade, obrigou Bashar al-Assad a viajar para Moscovo com a sua família, e começou a retirar pessoal de apoio nas suas bases em Latakia, a naval, em Tartus, no Mediterrâneo, e a aérea, de Khmeimim.
E com o passar dos dias, ficou ainda claro que esta retirada não seria apenas parcial, estando já visto como certa a saída definitiva dos russos da Síria, embora, nas últimas horas, o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, tenha vindo deixar implícito que o novo regime sírio de Jawlani não apenas não atacaria as suas bases como estaria a convidar Moscovo a permanecer.
Com esta atitude, a Rússia, que claramente escolheu entre dois males, porque a saída da Síria é um forte revés para o Kremlin, ao invés de se envolver numa nova frente de guerra, deixa o país mergulhado na dúvida sobre como vão as várias organizações e interesses gerir a presença e a partilha do território.
Se os russos poderiam ser o inimigo comum e agregador dos grupos da al qaeda e do daesh ainda presentes no centro do país, do HTS, dos clãs familiares poderosos que se combatem há séculos, num mosaico de interesses de difícil gestão por EUA, que ocupa o leste, Israel, que está a invadir pelo Sul, Turquia, a noroeste, e os países árabes do Golfo, como os EAU e a Arábia Saudita ou o catar, com a sua saída, deixam espaço livre para o caos e a ingovernabilidade...
Zelensky atira-se contra a diplomacia
A Ucrânia, que teria todo o interesse em ver os russos a terem de repartir os seus meios e recursos por uma nova frente de guerra na Síria, vê com inquietação a decisão de Moscovo, porque isso reforça a ideia de que a sua prioridade máxima é a frente europeia.
Além disso, o Presidente Zelensky está a ver cair por terra a possibilidade de os seus aliados norte-americanos e europeus conseguirem convencer o novo regime sírio de deixar os gigantescos arsenais de Assad, de material militar de origem russa (soviética), ser enviado para Kiev de forma a reforçar a capacidade das forças ucranianas.
E não é porque Abu al-Jawlani se tenha recusado a fornecer essas armas a Kiev, é porque as forças de defesa israelitas (IDF) estão há uma semana a destruir um após outros todos os arsenais e paióis em território sírio.
Essa destruição sistemática decorre com ataques aéreos e através de comandos terrestres, nalguns casos com explosões de tal magnitude, com os vídeos a correrem as redes sociais, que se chegou a pensar que tinha sido usado uma bomba nuclear no maior arsenal situado em Latakia.
A razão pela qual Israel está a destruir o armamento sírio é para evitar que este, mais tarde, possa ser usado contra si.
Isto, porque, como tem noticiado a imprensa ocidental, Telavive viu com bons olhos e ajudou à queda do regime de Assad, porque isso lhe permitiu anexar ainda mais territórios dos Montes Golan, mas não confia minimamente nos jihadistas agora maquilhados em rebeldes democratas pelas secretas ocidentais e turca.
Com esta contrariedade, mais uma, porque Zelensky não está a conseguir obter dos EUA, à beira de a Casa Branca mudar de inquilino, para um Donald Trump muito menos convencido a apoiar Kiev contra Moscovo, os meios militares que lhe permitam manter a chama da vitória acesa, ao Presidente ucraniano resta tentar desmaterializar os esforços diplomáticos em curso para o obrigar a sentar-se à mesa com Putin para acabar com a guerra.
Isso mesmo está a ser feito com um ataque directo contra o primeiro-ministro húngaro, Viktor Orban, que preside actualmente à União Europeia, e tem estado em forte correria diplomática entre Washington, Bruxelas e Moscovo para encontrar uma saída pacífica para o conflito (ver links em baixo).
Zelensky disse nas últimas horas que não quer ver Orban a liderar quaisquer negociações e que o fará directamente com o Donald Trump quando este tomar posse, a 20 de Janeiro, embora o ainda Presidente-eleito já tenha dado sinais claros de que tem em grande apreço o primeiro-ministro da Hungria.
Apesar disso, o líder ucraniano não quer o húngaro a mediar quaisquer conversações, porque não precisa de ninguém para falar directamente com Trump, mas a verdade é que, não estado os EUA em guerra com a Rússia, Trump será sempre, em si mesmo, um mediador.
O empenho de Zelensky contra Viktor Orban é tamanho que recusou liminarmente a proposta que este fez para um cessar-fogo no Natal, considerando que o também presidente da União Europeia não é equidistante face ao relacionamento amistoso que tem com Vladimir Putin, embora também Trump o tenha e com ele insiste em falar.
E insistiu na retórica da força como fórmula para vergar a Rússia: "Somos um país forte, mostramos isso mesmo no campo de batalha! Quem na Europa mostrou essa força? A Hungria tem essa força para pressionar Putin a sair da Ucrânia?".
Alguns analistas entendem que Zelensky está a jogar a sua última cartada, última e única que lhe resta, que é convencer os norte-americanos e os europeus a desmultiplicar o envio de armas e financiamento para Kiev e a avançar para uma guerra directa com os russos através da entrada rápida da Ucrânia na NATO e a entrada de tropas ocidentais no combate aos russos.
Cenário que é uma impossibilidade, como Trump tem repetido, tendo mesmo dito que a decisão do ainda Presidente, Joe Biden, autorizar o uso dos misseis ATACMS contra alvos na profundidade russa, foi "uma decisão estúpida".
E sem a autorização de Washington, a Ucrânia não poderá aderir à NATO, e, sem o apoio norte-americano, Zelensky será obrigado a negociar, com ou sem a intermediação de Viktor Orban... com Vladimir Putin, porque a cada diz que passa, as forças russas avançam mais uns quilómetros no sudeste ucraniano.
Foi detido alegado autor do atentado contra general russo
O atentado, na terça-feira, 17, em Moscovo, que vitimou o tenente-general Igor Kirillov, um importante chefe militar russo que dirigia a secção de guerra química, biológica e radiológica, através da explosão de uma trotinete eléctrica armadilhada, na porta da sua casa, foi um, mais um, golpe ucraniano no orgulho russo.
Reivindicado pelos serviços secretos militares ucranianos (GUR), liderados por Kyrylo Budanov, este atentado, onde, além de Kirillov, morreu ainda um seu assistente, Ilya Polikarpov, foi um forte revés para o Kremlin, que, há uma semana, tinha visto ser igualmente morto pelos ucranianos um importante cientista da área de desenvolvimento dos sistemas de misseis, Mikhail Shatsky.
A resposta, segundo a porta-voz dos Negócios Estrangeiros, Maria Zakharova, não tardará, tendo esta deixado no ar a possibilidade de Moscovo optar, desta feita, devido à gravidade desta sucessão de atentados contra figuras importantes do Estado russo, por optar por outro tipo de retaliação que não o mero disparo de misseis e drones contra a infra-estrutura eléctrica ucraniana.
Segundo a RT, as investigações sobre o atentado contra Kirillov conduziram à detenção de um cidadão do Uzbequistão, de 29 anos, que confessou o crime, ou o ataque legítimo, segundo os ucranianos, devido ao envolvimento deste general em alegados ataques químicos no conflito, organizado pela secreta de Kiev e a troco da promessa de 100 mil USD e um passaporte de um país europeu...
Os russos recusam a acusação a Kirillov, que etsá na lista das sanções ocidentais, sobre o seu envolvimento em ataques químicos na Ucrânia, afirmando que, pelo contrário, este teve um papel relevante na denúncia da existência de laboratórios de material biológico e químico na Ucrânia, geridos pela secreta externa norte-americana, a CIA.