Esta garantia ficou desenhada num discurso para marcar o aniversário da anexação das quatro regiões do leste ucraniano, e agora no oeste da Federação Russa, embora sem qualquer legitimidade sob a perspectiva ocidental e das Nações Unidas, onde Vladimir Putin falou das razes culturais, nacionais e sanguíneas das populações destes territórios como totalmente russas.

Disse que se tratou de uma decisão corajosa dessas populações, que votaram num esmagador referendo pela integração da Rússia, mas sem a admissão de legitimidade da parte ucraniana e dos seus aliados ocidentais, e sublinhou que se trata agora de "um só povo" e que juntos poderão "ultrapassar todos os obstáculos".

Descrita como a "reunificação" da Rússia, este processo de anexação as quatro regiões, cinco se se contar com a Crimeia, em 2014, é agora, pelas palavras de Putin, uma carta fora do baralho negocial que se espera venha a acontecer ao longo de 2024, o que dificulta esse processo.

Alias, a questão territorial, pela solidez das afirmações a esse respeito por ambos os lados da contenda, com o Presidente Volodymyr zelensky a alinhar pelo mesmo diapasão, que a guerra só termina com a saída de todos os russos da Ucrânia cujas fronteiras são reconhecidas pela comunidade internacional deste a independência do país da então URSS em 1991.

Face a este muro de betão armado negocial, qualquer entendimento entre Moscovo e Kiev só será possível depois de uma vitória inequívoca de um lado sobre o outro ou se a questão territorial for descartada como essencial para as movimentações das peças no xadrez da paz.

Putin voltou a acusar o ocidente de ter estado por detrás desta guerra, desde logo ao apoiar o golpe de Estado de 2014, quando o Presidente pró-russo Viktor Yanukovych foi deposto num contexto de grande violência na Praça Maidan, tendo o apoio ocidental a este golpe ficado claramente registado.

E voltou a insistir que fora os EUA e os seus aliados da NATO que forçaram o caminho para a guerra, armando a Ucrânia até aos dentes desde 2014, abrindo a porta a uma adesão à NATO, que Moscovo considera uma "ameaça existencial", forçando a aproximação das forças militares da NATO para as fronteiras da Rússia.

E lembrou que as suas forças "nacionalistas" ucranianas, apoiadas pelo ocidente, mantiveram uma pressão militar, com ataques permanentes, aos povos do Donbass que se rebelaram contra o golpe ilegal em Kiev, o que sabiam que levaria a Rússia a ficar sem opções semºao defender estas populações.

E agora, um ano após a anexação destas regiões, Putin vem dizer que ao "defender esses compatriotas estava-se a defender a própria Rússia".

"E juntos agora lutamos pela nossa soberania, a nossa Pátria e os nossos valores espirituais, unidade e vitória", frisou neste discurso comemorativo, no qual acrescentou que nada poderá impedir a conquita dos objectivos e vender todos os desafios".

Face a este reforçar das decisões estratégicas da Rússia para esta guerra, e quando essas decisões são colocadas face a face com as que são comummente reafirmadas por Kiev, fica claro que dificilmente, salvo de surgir algo de inesperado, como uma pressão dos aliados ocidentais sobre a Ucrânia para mudar o "chip" para a paz e as negociações, este será um conflito com prazo de validade curto.

Mas há uma mudança em curso na Europa ocidental e nos EUA que poderá ser esse tal "cisne negro", essa aparição de algo inesperado, que é o complexo e lato ciclo eleitoral entre os principais aliados de Kiev.

Desde logo nos EUA, onde já é claro que se Joe Biden for derrotado, como as sondagens assim o dizem, e de forma cada vez mais robusta, por Donald Trump, o apoio de Washington a Kiev passa de 80 para 8, o que condena a capacidade de esforço de guerra.

Mas há ainda os casos da União Europeia, que tem eleições para o seu Parlamento comunitário em 2024, e nos dois mais aguerridos aliados de Kiev na Europa, a Polónia e a Eslováquia, com este último a ir às urnas este Sábado, 30 de Setembro, com um partido pró-russo à frente nas intenções de voto manifestadas nas mais recentes sondagens.

Em Outubro são os polacos que vão a votos, mas aí só um terramoto eleitoral poderá fazer Varsóvia sair da redoma da influência norte-americana e por conseguinte, de uma posição pró-ucraniana, apesar da presenta e intrincada disputa com Kiev por causa dos cereais ucranianos que a Polónia não quer deixar atravessar a fronteira devido a problemas de competitividade interna.