Rui Nabeiro, fundador do grupo Delta Cafés, iniciou a sua actividade com tenra idade, aquela que é de brincar, e teve, por isso, de passar a "mourejar de sol a sol" nos idos de 60 do século passado, a partir de um pequeno armazém de torrefacção de café.
Deixou-nos para sempre no simbólico Dia do Pai, a 19 do corrente mês de Março, aos 91 anos de idade.
O grupo económico que criou, a partir de quase nada, tem hoje quatro mil trabalhadores a laborarem em dezenas de mercados mundiais, assumindo a liderança do café em alguns deles, como é o caso de Angola e de Portugal.
Tive a honra, no dia 10 do presente mês de Março, de ser palestrante numa homenagem que a Ordem dos Economistas portugueses lhe promoveu em Campo Maior.
Estava então longe de admitir que, a escassos nove dias após essa homenagem, o comendador Rui Nabeiro nos deixaria.
Homem solidário e estratega, com uma grande visão de futuro, o comendador é exemplo nos mais variados domínios para várias gerações, e o grupo que criou estende-se agora do café à vitivinicultura, passando pelo imobiliário e hotelaria, entre outros.
Como referi, o comendador sempre afirmou que devia muito do universo empresarial que criou a Angola e nela ao seu café, assinalando essa relação que hoje corre mundo com a marca Ginga e outra com o próprio nome do País, Angola.
Há anos, num almoço que com ele partilhei em Campo Maior, ouvi-lhe que, num período muito difícil, em plena guerra civil que então decorria em Angola, nos alvores da independência, quando milhares de portugueses abandonavam o país devido à dimensão do conflito, ele teve de se deslocar a Angola para concretizar a aquisição de uma partida de café, conseguiu-o, contra ventos e marés e por entre a metralha.
Foi também por essa operação que, a partir da pequena Vila de Campo Maior, no distrito de Portalegre, em Portugal, foi alargando por todas as cidades portuguesas e mais tarde por todo o mundo, o sabor invulgar do café angolano, que é do melhor entre os melhores.
Personalidade singular e exemplo para todas as gerações, o comendador Rui Nabeiro alcançou a síntese perfeita entre a criação de riqueza e a profunda relação afectiva com os seus trabalhadores, mantendo uma proximidade que, com o seu desaparecimento, não deixou de tocar todo o povo português.
Logo após a criação da sua primeira fábrica de torrefacção de café Cacuaco, nos idos de 80 do século passado, criou em Angola a empresa de distribuição Angonabeiro.
Mais tarde cimentou uma parceria com o grupo Refriango, assumindo a Delta a distribuição dos produtos daquela em Portugal, com êxito.
Numa conjuntura internacional tão difícil como a que vivemos, com implicações financeiras, económicas e sociais tão profundas, em todos os azimutes, a invocação do fundador do Grupo Nabeiro - Delta Cafés, mais do que uma obrigação profundamente sentida pela relação deste homem bom que tinha Angola no coração, é uma homenagem inadiável pelo que representou e representa também para os angolanos e da imagem de um produto de eleição - o café.
Sobretudo pelo sentido militante cívico que sempre teve em defesa de causas justas, com espírito de servir o seu semelhante, em particular os mais desfavorecidos, nunca descurando os objectivos sociais das empresas do grupo.
Não admira, por isso, a reacção espontânea de milhares e milhares de pessoas, de todas as idades e condições sociais, que compareceram no dia do seu funeral, no dia 21 do corrente.
O Grupo Nabeiro - Delta Cafés, líder do café em Angola, merece-o e é justo homenageá-lo num Jornal angolano.
*(Secretário-geral da UCCLA)