O Standard Bank Angola (SBA) tornou hoje público que está a "acompanhar com atenção e preocupação" as notícias que, nos últimos dias, colocam Carlos São Vicente, seu administrador não-executivo e antigo presidente da administração da Seguradora AAA, anunciando que este "solicitou a suspensão imediata das suas funções" de forma a salvaguardar "a reputação e imagem do Banco".
O SBA adianta que está a par da "investigação criminal na Suíça, sobre suspeitas de branqueamento de capitais", que afecta Carlos São Vicente, deixando claro que "está a trabalhar em articulação com o Banco Nacional de Angola" na gestão deste delicado processo.
Garantindo que se "pauta pelas mais elevadas regras de transparência e rigor, bem como observa os mais exigentes padrões de Compliance e considera a sua reputação como o seu activo mais valioso", o SBA atesta que continuará "a acompanhar a evolução do processo assumindo o compromisso em manter o público informado, com qualidade e isenção".
O caso 900 milhões USD
O empresário angolano Carlos de São Vicente viu a justiça suíça congelar-lhe uma conta com 900 milhões de dólares norte-americanos por suspeita de se tratar de dinheiro proveniente de operações de branqueamento de capitais, noticiou um blog especializado em questões de justiça denominado Gotham City, na Suíça.
Segundo esta notícia, que o Gotham City elaborou depois de ter tido acesso ao despacho do Ministério Público da Suíça, foram sete as contas congeladas do ex-presidente da seguradora angolana AAA Seguros, Carlos Manuel de São Vicente que, em 2017, numa entrevista ao Novo Jornal, defendia que Angola não se desenvolvia por ter muitos corruptos.
Carlos de São Vicente é marido de Irene Alexandra da Silva Neto, antiga deputada e filha do primeiro Presidente de Angola, Agostinho Neto.
Destas sete contas congeladas, ainda de acordo com esta notícia, que foi igualmente trabalhada pelo Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação (ICIJ, na sigla em inglês), os fundos de seis delas foram já libertados, mantendo-se congelada a conta que tem cerca de 900 milhões de dólares.
"O meu cliente refuta fortemente as acusações contra ele", disse a advogada Clara Poglia em declarações ao ICIJ, acrescentando que o cliente "confirma que sempre agiu em acordo com a lei e isso será demonstrado no quadro do processo criminal".
Nas declarações ao ICIJ, a advogada alerta ainda que "qualquer publicação de aspetos relacionados com este procedimento viola o princípio da inocência [de Carlos São Vicente], bem como os seus direitos pessoais".
As autoridades suíças alegam que entre 2012 e 2019 o empresário transferiu quase 900 milhões de dólares da companhia de seguros para as suas contas, algo que só foi descoberto quando o banco SYZ alertou para uma transferência de 213 milhões de dólares, de acordo com os documentos da acusação divulgados no site do ICIJ.
"É pouco comum para um presidente executivo e do conselho de administração ter em sua posse fundos pertencentes a uma companhia, ainda para mais uma seguradora regulada pelo Estado, apesar de ter, neste caso, poder de representação individual da companhia", lê-se na acusação divulgada pelo consórcio de jornalistas.
Segredo de justiça, alega o empresário
Entretanto, contactado pelo Novo Jornal, ompresário recorre a «segredo de justiça» para fundamentar a opção pelo silêncio em relação à polémica em que está envolvido.
"Neste momento, não posso fazer declarações, porque o processo está em curso e há que respeitar o segredo de justiça e o sigilo bancário", respondeu, via email, ao Novo Jornal, o empresário, mostrando-se descontente com o facto de muitos órgãos terrem preterido de tentar o contraditório.
Em causa estão, sobretudo, os 900 milhões de dólares depositados no banco suíço SYZ a favor do presidente da seguradora AAA Seguros, uma conhecida empresa de direito angolano dissolvida, entretanto, neste ano, que era detida maioritariamente (90%) pelo empresário, mas que contava com 10% das acções pertencentes à estatal Sonangol.
ARSEG afasta intervenção nas transferências
A Agência Angolana de Regulação e Supervisão de Seguros (ARSEG) descarta qualquer acção nas transferências monetárias às resseguradoras contratadas no estrangeiro pela AAA Seguros, a quem atribui exclusividade nesse processo, juntamente com a intervenção da empresa petrolífera Sonangol e o Banco Nacional de Angola.
Segundo o administrador da ARSEG, Jardel Duarte, contactado pelo NJ, "a exclusividade de tratar da área do resseguro, nomeadamente do co-seguro, competia às AAA e à Sonangol, com base num decreto".
"Em 2016, foi exarado um novo decreto, que retirava à AAA Seguros a liderança do co-seguro e esta passou para a ENSA [Empresa Nacional de Seguros de Angola]", afirmou o administrador da ARSEG, acrescentando que "era isso que ocorria a nível do processo do resseguro, que funcionava na altura".
Reacção da Fundação Agostinho Neto
Entretanto, a Fundação Agostinho Neto já veio a público condenar as referências ao nome do primeiro Presidente de Angola por este ter relações familiares com membros próximos da família por ser casado com Irene Alexandra da Silva Neto, antiga deputada e filha do primeiro Presidente de Angola, Agostinho Neto.
O comunicado de imprensa foi assinado pela viúva do antigo Presidente, Maria Eugénia da Silva Neto e ainda por Mário Jorge da Silva Neto, Irene Alexandra da Silva Neto e Leda da Silva Neto, onde se pode ler que, "sejam quais forem as circunstâncias do processo judicial em curso em Angola é absolutamente condenável que, seja quem for, directamente ou por intermédio de terceiros evoque o nome do presidente Agostinho Neto".