Manuel Vicente foi ouvido na condição de declarante e na Assembleia Nacional porque o estatuto dos ex-vice-Presidentes lhes permite escolher o local para o efeito, depois de ter sido notificado e num momento em que múltiplas notícias veiculadas nos media nacionais davam o antigo número dois de José Eduardo dos Santos como estando fora do País, no Dubai.
A PGR fez entretanto saber, sem divulgar qual o foco das questões colocadas a Manuel Vicente, que se tratou de uma situação normal e, depois de ser ouvido na terça-feira, só volta a ser chamado se se justificar e outra condição para surgir neste processo só se vier a surgir qualquer evidência clara de culpabilidade.
O também deputado foi ouvido como declarante por ser presidente do Conselho de Administração da petrolífera nacional na altura dos factos que levaram Carlos de São Vicente à condição de arguido e depois a detido preventivamente por fortes suspeitas de corrupção e branqueamento de capitais que têm como génese uma transferência ilegal de 900 milhões USD para um banco suíço.
Da acusação consta Carlos São Vicente criou "um esquema ilegal" que lhe permitiu extrair à Sonangol mais de 900 milhões de dólares.
Como recorda a Lusa, o empresário angolano, que entre 2000 e 2016 desempenhou, em simultâneo, as funções de director de gestão de riscos da Sonangol e de presidente do conselho de administração da companhia AAA Seguros, sociedade em que a petrolífera angolana era inicialmente única acionista, terá levado a cabo naquele período "um esquema de apropriação ilegal de participações sociais" da seguradora e de "rendimento e lucros produzidos pelo sistema" de seguros e resseguros no sector petrolífero em Angola, graças ao monopólio da companhia.
Desta forma, Carlos São Vicente passou a ser o "detentor maioritário das participações nas AAA Seguros, com 89,89%, em detrimento da Sonangol, que viu as suas participações sociais drasticamente reduzidas em 10% [a 10%], num prejuízo estimado em mais de USD 900.000.000,00 [cerca de 763,6 milhões de euros ao câmbio actual]", não tendo a petrolífera "recebido qualquer benefício", em contrapartida, adianta-se no documento.
De acordo com o despacho, o arguido terá referido que as cedências de participação foram feitas "com base num acordo informal" entre ele, enquanto representante da AAA Seguros, e o então presidente do conselho de administração da Sonangol, e mais tarde vice-presidente de Angola, Manuel Vicente.
Ainda de acordo com o despacho transcrito, "grande parte do Activos das AAA Seguros, SA, que já cessou a actividade, pertencem a outras empresas do mesmo grupo detidas/controladas pelo arguido Carlos Manuel de São Vicente", através de "um processo fraudulento em prejuízo do Estado angolano". Perante o exposto, o documento conclui "não restarem dúvidas, dos suficientes indícios de estar o arguido Carlos Manuel de São Vicente, incurso na prática dos crimes de peculato (...), recebimento indevido de vantagens (...), corrupção (...), participação económica em negócio (...) tráfico de influências".
O AAA, liderado por Carlos São Vicente, é um dos maiores grupos empresariais angolanos, operando na área de seguros e da hotelaria.