Era o tudo ou nada. Se José Eduardo dos Santos não se matriculasse naquele dia, jamais o liceu Salvador Correia entraria no seu plano de estudos, e, sem ele, talvez nunca se tivesse dado o seu encontro com a causa nacionalista.
Afinal, conforme o próprio relata, foi no universo escolar juvenil que a sua história despertou para o combate anticolonialista.
"O que me marcou, estando a estudar no ensino secundário, além da discriminação e da diferença que havia entre os filhos de portugueses e os angolanos - sobretudo os de raça negra -, foi o facto de não termos perspectivas. Era o abismo à frente de nós. Essa foi a razão por que optámos desde muito cedo pela luta de libertação nacional".
O testemunho do Presidente da República, extraído de uma grande entrevista à brasileira TV Bandeirantes, realça o peso decisivo do Salvador Correia para a sua formação política, mas omite um passo determinante neste percurso.
"Era o último dia da matrícula e o certificado [da quarta classe] ainda não estava disponível, pois a repartição apenas funcionava à tarde. A idade máxima para entrar no liceu era dez anos e se não o fizesse nessa altura não tinha outra oportunidade. Avelino dos Santos teve de apelar à criatividade para encontrar uma solução".
A história, narrada pelo jornalista Cândido Bessa a partir das memórias do irmão mais velho de José Eduardo dos Santos, o entretanto falecido Avelino dos Santos, recupera-se das páginas do Jornal de Angola, publicadas há precisamente um ano, para assinalar os 74 anos do Chefe Estado.
Segundo Avelino dos Santos, José Eduardo dos Santos foi por si orientado "para simular lágrimas com a saliva" e, com isso, sensibilizar as pessoas para a sua tristeza e desespero.
"O truque funcionou e conseguiu ser matriculado", recordou na altura o irmão mais velho do Chefe do Estado, de volta ao episódio que cruzou a história de Zédu com a causa nacionalista, mais tarde projectada na luta anticolonialista e, com a morte de António Agostinho Neto, elevada à Presidência de Angola.
"Nós conhecíamos as suas capacidades. Ele foi sempre um grande cabeça, muito inteligente e organizado. Por isso, não nos surpreendeu" [a sua chegada a Presidente], rematou o mais-velho.