Com efeito imediato, à medida que explodiam as áreas militares dos rebeldes iemenitas, o barril de Brent, em Londres, referência maior para as ramas exportadas por Angola, mas também o WTI em Nova Iorque, disparava para valores do início do mês, acima dos 71 USD.
Os ataques dos EUA foram justificados pela Casa Branca como prevenção para que o estreito de Bab-el-Mandeb, que liga o Mar de Aden (Indico) ao Mar Vermelho (Canal do Suez), por onde transita 15% do crude consumido no ocidente e mais de 20% do comércio mundial, não seja atacado pelos Houthis.
Apesar da sua natureza preemptiva, provavelmente relacionado com a retoma dos ataques israelitas em Gaza, no meio de um cessar-fogo frágil, este ataque dos EUA, que fez dezenas de mortos e centenas de feridos entre civis, não sucedeu a qualquer acto hostil dos rebeldes iemenitas.
Mas, depois de acontecer, os Houthis, assim denominados no ocidente mas de nome oficial Ansar Allah, voltaram a avisar que todos os meios navais com interesses ligados a Israel, incluindo petroleiros, serão alvejados ao navegar no Mar Vermelho.
Alias, outro dos recados pretendidos por Donald Trump com este ataque era dirigido ao Irão, no sentido de advertir Teerão para o risco de uma retaliação "devastadora" dos EUA se continuarem a apoiar os atacantes iemenitas, sendo que este país já está de novo sob ameaça de novas sanções ao seu estratégico sector petrolífero, o que ajuda a aumentar o preço ao reduzir a oferta.
Houthis e iranianos negam uma ligação material, apenas política e estratégica concernente ao que se passa em Gaza, mas são aliados na garantia aos americanos de que não se deixam ao ameaçar e vão sempre retaliar a quaisquer ataques.
Ora, este caldo perigoso novamente entornado no Médio Oriente não passou desapercebido aos analistas do sector petrolífero e aos traders, que rapidamente perceberam que pode bem acontecer de novo que os petroleiros que demandam o ocidente a partir do Golfo Pérsico poderá ter de alcançar a Europa e as Américas contornando o continente africano pelo Cabo.
Essa volta, que acrescenta semanas e milhões de dólares aos custos de transporte, foram, em finais de 2023, após o ataque, a 07 de Outubro, do Hamas a Israel, e a invasão israelita de Gaza, responsáveis por uma subida fulgurante do preço da matéria-prima.
E voltou a acontecer, agora de forma mais comedida, com este ataque dos EUA, com o barril de Brent a subir mais de 1,10 %, para os 71,55 USD, pela manha, fixando-se nos 71,20 USD perto das 14:30, hora de Luanda, desta segunda-feira, 17.
E ainda iria melhorar o contexto global antes de piorar, com as notícias de um robustecimento da economia chinesa com um aumento substancial das vendas no retalho, em correspondência directa com as medidas internas projectadas pelo Governo de Pequim com o objectivo de aumentar o consumo interno para compensar as quedas nas exportações.
Até aqui, tudo estava bem, na perspectiva dos países exportadores, como Angola, que passou por momentos difíceis há duas semanas com o barril a baixar dos 70 USD com que foi definido o preço médio para o OGE de 2025, mas como se sabe, o importante não é a queda, é a forma como se aterra...
Com o facto já anunciado de que a OPEP+ vai retomar parcialmente a produção, aumentando 138 mil barris por dia já em Abril, começando um percurso longo mas, crê-se, sólido, de regresso à produção normal, actualmente quase 6 mbpd abaixo do "normal", deu-se início a um novo risco, o do excesso de produção.
E foi precisamente isso, a par dos dados que mostram uma subita fragilização da economia dos EUA, que levou mesmo Donald trump a admitir um período de transição antes do fulgor prometido na campanha, que levou a Goldman Sachs a divulgar um comunicado onde os seus analistas apontam para um corte no valor da matéria-prima.
Tudo somado, a gigante casa financeira norte-americana aponta para m ano de 2025 carregado de crude que a economia planetária não vai consumir, pressionando, natiralmente, os preços em baixo, admitindo mesmo uma queda acentuada do preço.
E para piorar as expectativas, a Agência Internacional de Energia (AIE) veio, quase em simultâneo, sublinhar que a produção actual passa em 600 mil barris por dia a procura, reduzindo significativamente a procura ao longo de 2025, o que encaixa nos dados referenciados pelos "super traders", que também estão a fazer soar as campainhas de alarme.
"A indústria está a extrair petróleo em excesso", avisam os analistas, embora alguns admitam que a manipulação dos dados é sempre possível e que este momento aparentemente de risco para o sector, pode bem ser resultado da pressão pública e notória da Casa Branca sobre os países exportadores, especialmente os sauditas e os russos.
É que ninguém ignora que Donald Trump tem feito tudo para baixar o valor do crude de forma a combater a inflação nos EUA e ajudar a melhorar os indicadores, como prometeu antes do seu regresso ao poder, a 20 de Janeiro deste ano.
É que, inesperadamente, considerando apenas factores de mercado, este momento, com aumento relevante entre os países da OPEP+, organização que junta os Países Exportadores (OPEP) e a Rússia ao lado de outros mais pequenos produtores, e também nos países fora da OPEP+, não estava nas linhas dos oráculos mais experimentados.
O que, para Angola, pode ser um problema... se se conformarem as expectativas.
Como Luanda olha para este cenário global?
O actual cenário internacional tende a empurrar os preços para muito próximo, ou mesmo abaixo, do valor estimado no OGE 2025, que é de 70 USD.
Preços estes que, apesar de ainda estarem na margem positiva de proximidade desse valor, estão, assim, muito próximos da linha em que os alarmes começam a disparar em Luanda.
Essa a razão pela qual Angola é um dos países mais atentos a estas oscilações, devido à sua conhecida dependência das receitas petrolíferas, e a importância que estas têm para lidar com a grave crise económica que atravessa, especialmente nas dimensões inflacionista e cambial.
No entanto, porque o OGE nacional elaborado para 2025 apostou nos 70 USD, o actual valor já deixa as contas nacionais mais periclitantes e mais expostas a qualquer desequilíbrio internacional.
Isto, porque o crude ainda responde por cerca de 90% das exportações angolanas, 35% do PIB nacional e 60% das receitas fiscais do país, o que faz deste sector não apenas importante mas estratégico para o Executivo.
O Governo deposita esperança, no curto e médio prazo, de conseguir o objectivo de aumentar a produção nacional, actualmente perto dos de 1,1 mbpd, gerando mais receita no sector de forma a, como, por exemplo, está a ser feito há anos em países como a Arábia Saudita ou os EAU, usar o dinheiro do petróleo para libertar a economia nacional da dependência do... petróleo.
O aumento da produção nacional não está a ser travada por falta de potencial, porque as reservas estimadas são de nove mil milhões de barris e já foi superior a 1,8 mbpd há pouco mais de uma década, o problema é claramente o desinvestimento das majors a operar no país.
Aliás, o Governo de João Lourenço tem ainda como motivo de preocupação uma continuada e prevista redução da produção de petróleo, que se estima que seja na ordem dos 20% na próxima década, estando actualmente pouco acima dos 1,1 milhões de barris por dia (mbpd), muito longe do seu máximo histórico de 1,8 mbpd em 2008.
Por detrás desta quebra, entre outros factores, o desinvestimento em toda a extensão do sector, deste a pesquisa à manutenção, quando se sabe que o offshore nacional, com os campos a funcionar, está em declínio há vários anos devido ao seu envelhecimento, ou seja, devido à sua perda de crude para extrair e as multinacionais não estão a demonstrar o interesse das últimas décadas em apostar no país.
A questão da urgente transição energética, devido às alterações climáticas, com os combustíveis fosseis a serem os maus da fita, é outro factor que está a esfumar a importância do sector petrolífero em Angola.