Como o Novo Jornal tem vindo a noticiar, há muito que o Governo estuda a melhor forma de esbater o impacto social da retirada dos subsídios aos combustíveis e, ao que tudo indica, a fórmula escolhida é a do gradualismo, com a gasolina a ser mais afectada inicialmente e depois o gasóleo.
O anúncio deverá surgir em conferência de imprensa do ministro de Estado para a Coordenação Económca, Manuel Nunes Júnior, ainda na tarde desta quinta-feira, 01 de Junho, um dia histórico em Angola, país que tem actualmente dos combustíveis mais baratos do mundo, apenas atrás da Venezuela e do Irão, ou da Líbia, se se considerar gasóleo e gasolina.
A opção por arrancar com este melindroso processo através do aumento da gasolina é porque este combustível tem um menor impacto social, desde logo nas actividades económicas ligadas aos transportes, de carga e públicos de passageiros, e onde estes têm efeitos colaterais, na indústria e na agricultura e pescas.
Mas o gasóleo não vai ficar de fora e resta saber se a medida vai ser mais ou menos agressiva, por etapas longas ou curtas e, entre outras medidas, se vão existir benefícios para as actividades mais expostas, como os transportes colectivos de passageiros, as pescas e a agricultura, entre outros, aplicando, por exemplo, preços distintos através de um mecanismo de controlo, como acontece na Europa com o chamado gasóleo "verde".
Como o Novo Jornal noticiou na terça-feira, os membros do Bureau Político do MPLA estiveram reunidos na quarta-feira e, no final, embora sem detalhar ou confirmar, o porta-voz do partido no poder, Rui Falcão, mandou informar os jornalistas que estavam no local que qualquer informação sobre este assunto, se existir algo para dizer, será após o Conselho de Ministros desta quinta-feira.
No entanto, segundo soube o Novo Jornal, em cima da mesa está como mais forte opção avançar já com um aumento expressivo na gasolina, que deverá ficar entre os 300 e os 350 kwanzas por litros na bomba, enquanto o gasóleo terá uma actualização menos agressiva e, provavelmente, apenas será iniciada dentro de meses, ou mesmo em 2024.
Isto, quando, nos mercados internacionais, a "commodity" gasolina está a valer cerca de 80 cêntimos de USD por litro, perto de 430 kwanzas, dependendo do câmbio, e dos contratos existentes entre fornecedor e comprador, porque estes podem incluir outros factores que impactam nestes valores, como os transportes.
Se se confirmar que o Executivo pode colocar a gasolina perto dos 350 kwanzas na bomba, então, a retirada do subsídio a este combustível será, apesar de expressivo, ainda parcial, mantendo o Estado um gasto anual considerável.
Já no que diz respeito ao gasóleo, segundo fontes do Novo Jornal, é de esperar uma pequena actualização para breve, mas outros acertos mais substantivos só terão lugar, provavelmente, no final do ano ou já em 2024.
Esta decisão de reduzir substancialmente os subsídios aos combustíveis, como o Novo Jornal tem noticiado ao longo dos anos, tem sido uma das grandes dores de cabeça do Executivo e tem sido protelada ano após ano, porque é claramente uma opção com forte impacto social num país onde os combustíveis são dos poucos bens de uso diário com preço controlado e baixo.
Alias, sabe-se, como a opinião da maior parte dos economistas coincide, que o aumento do preço dos combustíveis levará, inevitavelmente, ao aumento em cadeia dos preços de uma forma geral, mas em especial naqueles produtos que dependem directamente do uso destes, como os transportes, as pescas, alguma da agricultura e da agro-indústria, etc.
Mas os gastos com estes subsídios têm sido apontados como uma das questões de mais difícil gestão política porque, além dos custos anuais que vão dos 1,5 mil milhões USD aos 2 mil milhões USD por ano, os organismos financeiros internacionais, como o Fundo Monetário Internacional (FMI) têm pressionado o Governo de Luanda a avançar com a sua redução ou mesmo a sua eliminação total.
Outro factor que está a levar o Executivo de João Lourenço, senão mesmo um dos mais importantes, é que as novas refinarias em construção no país, algumas delas entregues a privados, infra-estruturas com custos elevados de funcionamento, com os actuais preços, dificilmente teriam condições de sobrevivência sem um apoio expressivo do Estado, o que poderia mesmo aumentar em vez de diminuir os gastos com os subsídios actualmente em vigor.
O que pensa o Governo há muito tempo?
O Governo tem abordado a questão da eliminação das subvenções aos combustíveis ao longo dos anos, e, numa dessas ocasiões, como o Novo Jornal noticiou aqui, por exemplo, a 30 de Setembro de 2020, a ministra das Finanças, Vera Daves, referia-se a esta questão anunciando que seria encontrada uma forma diluição progressiva dos subsídios, afirmando que estava a acompanhar de perto esta questão.
Nessa datam, e depois de o presidente da Sonangol ter feito um lancinante pedido de uma solução para os custos que a empresa estava a suportar com as subvenções, e à margem de um encontro que teve lugar na terça-feira com o representante do Banco Mundial em Angola, Vera Daves disse aos jornalistas que está a acompanhar de perto este processo e que para ele seria encontrada uma "boa solução", ou seja, retirar progressivamente os apoios de forma a diluir o esperado impacto social.
O próprio Banco Mundial e o FMI já tinham deixado claro que defendiam que este processo seja realizado com pinças de forma a esbater as suas repercussões no tecido social mais débil, e ainda mais em tempo de severa crise económica, que ainda se mantém.
"Entre o actual momento social que o País vive e as dificuldades económicas geradas pela subvenção, naturalmente que será encontrada a melhor solução e no melhor momento", disse Daves a 30 de Setemebro de 2020.
Recorde-se que estas declarações de Vera Daves surgiram depois do presidente do Conselho de Administração da Sonangol, Sebastião Gaspar Martins, ter afirmado publicamente que um técnico que estava a ser realizado pela petrolífera nacional para lidar com o incontornável fim dos subsídios, já estava concluído e que cabia ao Governo decidir.
Até aqui, tal como o Governo foi avançando ao longo dos últimos anos, a decisão iria ser tomada mas estava dependente de um estudo técnico para enquadrar o fim da subsidiação dos combustíveis em Angola a cargo da petrolífera nacional, a Sonangol, que é quem mais interesse tem nesse âmbito porque é quem paga a diferença entre o custo no posto de abastecimento e o custo real dos combustíveis, na sua larga maioria, importados a preços de mercado que se aproximam dos 450 kwanzas como preço mínimo traduzido em dólares nos mercados internacionais.