De acordo com os dados divulgados pelas agências sobre a economia chinesa, a segunda maior do mundo e o maior importador global de petróleo, a actividade das refinarias do gigante asiático cresceu 15% face ao mesmo período de 2020 e a produção industrial disparou entre Janeiro e Fevereiro.

Em destaque está a indústria pesada chinesa de aço, cimento, alumínio e carvão, que cresceu neste período acima de 10% tendo como referência o ano de 2019, antes do surgimento da pandemia da Covid-19.

Estes dados sobre a actividade económica chinesa, a par das fortes expectativas geradas pelo pacote de estímulos aprovados pela Administração Biden para a economia dos EUA, ainda a mais robusta do mundo, e a eficácia comprovada dos cortes da OPEP+, que recentemente aprovou a extensão do controlo da produção para Abril, estão a dar novo "gás" ao sector petrolífero.

No entanto, este optimismo reforçado por uma luz cada vez mais intensa ao fundo do túnel, de longos meses de sufoco pandémico, alimentada pelas campanhas de vacinação um pouco por todo o mundo, pode ser ligeiramente excessivo, havendo mesmo analistas a admitir que, depois de trespassada a barreira dos 70 USD por barril, o caminho estará aberto para uma caminhada firme até aos 100 dólares.

Tal optimismo assenta na ideia de que os cortes da OPEP+ vão prolongar os efeitos positivos no sector para a segunda metade de 2021, mesmo que o próprio "cartel" tenha admitido no seu último relatório uma baixa significativa nas perspectivas da procura nos próximos meses.

O que, na verdade, surge fundamentado num claro movimento ascendente nos mercados, onde o Brent, que serve de principal referência para os valores médios das exportações angolanas, está a ganhar há quase dois meses consecutivos, com apenas ligeiras oscilações.

Porém, alguns analistas mais cautelosos têm estado a alertar para a ausência de bases sólidas para o actual optimismo.

Por exemplo, Cyril Widdershoven, um reputado analista do sector, num artigo recente publicado no site especializado OilPrice.com, formula uma sentença em forma de interrogação: "Se fosse hoje perguntado aos optimistas qual a base onde assenta esse optimismo, não teriam nada de específico para dizer, apenas um poderiam revelar um `sentimento"".

Sendo certo que a volatilidade do sector energético impõe, muitas vezes, subidas ou descidas no valor da matéria-prima sem razões aparentemente válidas, também neste momento ocorre um fenómeno desse tipo, com o sobe e desce a ser motorizado por razões adjacentes aos dados frios da economia, sejam os cortes artificiais na produção, seja o sentimento de alívio pandémico nos EUA, devido às vacinas, ou ainda com uma diminuição dos confinamentos em alguns países europeus, excepção feita à evidente retoma da China, especialmente no sector da indústria pesada.

Para já, no que diz respeito a Angola, este florescimento da procura é uma boa notícia num momento de claro sufoco económico, com o barril de Brent a atingir, perto das 10:30, hora de Luanda, os 69,70 USD por barril, mais 0,66 % que no fecho de sexta-feira.

Hoje...

A produção nacional está abaixo dos 1,3 mbpd e em constante declínio devido ao desinvestimento das "majors" a operar no offshore nacional, especialmente a partir de 2014, quando se verificou uma quebra abrupta do valor do barril, que passou de mais de 120 USD para menos de 30 dois anos depois, em 2016.

Apesar das mudanças substanciais na legislação referente ao sector e às alterações profundas nesta indústria decisiva para o País, a produção demora a arrancar para os patamares mais próximos daqueles que se viram no passado.

Para já, com o barril acima dos 69 USD, o Executivo de João Lourenço conta com uma folga de mais de 30 USD em cima dos 39 USD que foi o valor usado como referência para a elaboração do OGE 2021, o que permite encarar com maior optimismo esta saída esperada da crise mundial, apesar dos fortes constrangimentos que a economia nacional enfrenta.

O crude é ainda responsável por mais de 94% das exportações angolanas, mais de 50% do PIB e representa 60% das receitas do Executivo para poder gerir as necessidades da governação, o que, face a uma lenta e demorada diversificação da economia nacional, se traduz numa mais optimista entrada no novo ano e nova década do século XXI.

E no que respeita aos futuro breve, o sector exige reflexão e claramente uma forte aposta na diversificação da economia, porque, como é hoje já consensual, o petróleo não tem muito mais tempo como principal combustível da economia mundial.

O alerta da Carbon Tracker

Alias, um estudo internacional recente, elaborado pela iniciativa Carbon Tracker, citado pela Lusa, aponta Angola como um dos países mais vulneráveis ao processo global de descarbonização da economia por razões de protecção climáticas que se traduz mesmo no desinvestimento das petrolíferas no sector para investirem nas denominadas energias limpas.

Este estudo denominado "Beyond Petrostates" nota que Angola enfrenta, até 2040, um défice de receitas na casa dos 76%, o que coloca o País na linha da frente das maiores vítimas deste processo planetário de substituição do petróleo como grande fonte energética mundial, o que exige de Angola um redobrado empenho na diversificação da sua economia.

O estudo diz isso mesmo, que os países nestas condições estão obrigados a definir políticas fortes de substituição de fontes de rendimento sob risco de enfrentarem dificuldades devastadoras para o seu futuro.

Para exemplificar esse abismo que têm pela frente, o estudo revela que as quedas das receitas nos próximos anos vão ser superiores a 13 mil milhões de dólares.

A Carbon Tracker é um think tank financeiro independente que desenvolve análises detalhadas e aprofundadas sobre o impacto da transição energética nos mercados de capitais e no potencial investimento em combustíveis fósseis.