A par deste braço de ferro entre a FED e os mercados, que temem disrupções devido aos ataques rebeldes às embarcações que se dirigem ao Canal do Suez, os stocks dos EUA também mostram dúvidas quanto à vitalidade da indústria norte-americana.

Com a rota alternativa ao Canal do Suez do sul de África igualmente comprometida pela ameaça da pirataria da Somália ao norte de Moçambique, a oferta tende a encolher mas depara-se com a retracção substantiva no consumo das grandes economias ocidentais.

Daí que os analistas estejam agora à espera para ver em que direcção se move a agulha da bússola da OPEP+, organização que agrega os países da OPEP e a Rússia + nove desalinhados desde 2017 para equilibrar os mercados a seu favor.

E o que se antecipa é que o "cartel" vai mesmo prolongar o seu calendário de cortes por 2024 adentro, que está, actualmente nos 3,6 milhões de barris por dia (mbpd), sendo 2 mbpd em quotas negociadas e perto de 1,5 mbpd por iniciativa singular de sauditas e russos.

Todavia, como a Reuters recorda, uma parte destas perdas resulta mais da recolha de dividendos que é sempre exponenciado quando os stocks engordam nos Estados Unidos da América porque isso tem um significado evidente: menor consumo em perspectiva.

Um derradeiro motivo para esta queda de cerca de 1% no preço do Brent nesta quarta-feira, 28, é que existe uma possibilidade real de ser declarado um cessar-fogo em Gaza, como o Presidente dos EUA, Joe Biden, chegou a antecipar como certo na terça-feira.

E isso levaria a uma redução do atrito no Mar Vermelho, que, por sua vez, limparia o risco ao longo da costa oriental de África, condensando o risco numa irritante normalidade, tão ao gosto das economias asiáticas, que esfregam nela os dedos graças ao sequente aumento do consumo no ocidente para a sua produção industrial barata e volumosa.

Ainda assim, o barril de Brent, que seve de principal referência para as ramas exportadas por Angola, estava esta tarde, perto das 14:30, hora de Luanda, nos 83,50 USD, menos 0,12% que no fecho da sessão anterior, mas muito acima do preço médio usado para elaborar o OGE 2024, que foi de 65 USD.

As contas de João Lourenço

Para Angola, apesar de ter abandonado a OPEP recentemente, que é um dos produtores e exportadores que mais dependem da matéria-prima em todo o mundo, devido à escassa diversificação económica, ter o Brent nos 83 USD permite, embora não seja o antidoto definitivo, diluir alguns dos efeitos devastadores da crise cambial e inflacionista, até porque o país enfrenta também o problema da persistente redução da produção diária.

Com OGE 2024 elaborado com um valor de referência médio para o barril de 65 USD, estes valores actuais permitem um relativo optimismo, mas aumentar a produção é o factor-chave, o que ficou mais fácil depois de Angola ter, em Dezembro passado, anunciado a saída de membro da OPEP, o que deixa um eventual acréscimo da produção fora dos limites impostos pelo cartel aos seus membros como forma de manter os mercados equilibrados entre oferta e procura.

O crude ainda responde por cerca de 90% das exportações angolanas, 35% do PIB nacional e 60% das receitas fiscais do país, o que faz deste sector não apenas importante mas estratégico para o Executivo.

O Presidente da República, João Lourenço, deposita esperança, no curto e médio prazo, de conseguir o objectivo de aumentar a produção nacional, actualmente perto dos de 1,12 mbpd, gerando mais receita no sector de forma a, como, por exemplo, está a ser feito há anos em países como a Arábia Saudita ou os EAU, usar o dinheiro do petróleo para libertar a economia nacional da dependência do... petróleo.

O aumento da produção nacional não está a ser travada por falta de potencial, porque as reservas estimadas são de nove mil milhões de barris e já foi superior a 1,8 mbpd há pouco mais de uma década, o problema é claramente o desinvestimento das majors a operar no país.

Aliás, o Governo de João Lourenço tem ainda como motivo de preocupação uma continuada e prevista redução da produção de petróleo, que se estima que seja na ordem dos 20% na próxima década, estando actualmente pouco acima dos 1,1 milhões de barris por dia (mbpd), muito longe do seu máximo histórico de 1,8 mbpd em 2008.

Por detrás desta quebra, entre outros factores, o desinvestimento em toda a extensão do sector, deste a pesquisa à manutenção, quando se sabe que o offshore nacional, com os campos a funcionar, está em declínio há vários anos devido ao seu envelhecimento, ou seja, devido à sua perda de crude para extrair e as multinacionais não estão a demonstrar o interesse das últimas décadas em apostar no país.

A questão da urgente transição energética, devido às alterações climáticas, com os combustíveis fosseis a serem os maus da fita, é outro factor que está a esfumar a importância do sector petrolífero em Angola.