Na primeira reunião presencial em mais de dois anos, por causa da pandemia da Covid-19, os ministros dos Petróleos e da Energia da OPEP+, organização liderada pela Arábia Saudita e pela Rússia, se esta recomendação for assumida, o que se prevê, como de costume, que aconteça, os mercados deverão recebê-la com estrondo, aguardando-se uma subida exponencial da matéria-prima.
Esta recomendação de 2 mbpd, que já tinha sido aventada por algumas fontes durante a manhã de hoje e na terça-feira, terraplana as mais consideradas, que apontavam para cortes entre os 500 mil e 1 milhão de barris por dia.
Face a estas informações que estão a ser avançadas pelas agências e pelos sites especializados, é agora quase certo que o corte se vai situar entre os 1,5 milhões e os dois milhões bpd.
Mas este número, apesar de considerável, pode ter um impacto menos robusto se os mercados tiverem em linha de conta o acto de o "cartel" estar a produzir abaixo da quota definida nas anteriores reuniões, num valor que chega aos 3,6 mbpd, muito por incapacidade dos membros de atingir a sua parte, como é o caso de Angola, por razões variadas mas em quase todos os casos por desinvestimento nos últimos anos de crise.
Se desde o início de 2020 os membros da OPEP+ não se sentavam fisicamente à mesma mesa devido ao Sars CoV-2, o que volta hoje a suceder, também desde Março desse mesmo ano que não ocorria um corte na produção do "cartel" tão robusto como aquele que se adivinha para hoje ao final da tarde.
A organização liderada pela Arábia Saudita e pela Rússia, pode mesmo chegar a uma redução de 2 mbpd como forma de garantir que a esperada e crescente crise na economia global, com inflação a bater recordes na Europa e nos EUA, e a recessão a espreitar já com a cabeça toda de fora, não venha a criar o mesmo terramoto que a pandemia da Covid-19 que, recorde-se, em Abril de 2020 levou o barril a ser comercializado a uns incríveis 40 USD negativos, ou seja, mesmo pagando 40 USD por barril, ninguém queria ficar com a matéria-prima.
Mas, mesmo que esta quebra na produção venha a ser menos expressiva, em resultado da reunião de hoje, em Viena de Áustria, o pânico já está a tomar conta dos governos das grandes economias ocidentais - a China e a Índia temem menos este movimento porque contam com o petróleo russo em grande quantidade e vendido com grandes descontos devido às sanções em vigor por causa da guerra na Ucrânia - porque a inflação e o risco de recessão que lhes está a corroer as economias é resultado directo do aumento brutal da energia, especialmente gás e crude.
A CNN, canal de notícias norte-americano, noticiou que o Presidente dos EUA, Joe Biden, perante esta possibilidade de um novo e proeminente corte na produção pela OPEP+, reuniu de emergência a sua Administração e colocou no terreno todo o pessoal disponível para procurar, junto dos países membros, influenciar de forma a reduzir ao máximo os danos que um eventual corte robusto vão provocar de imediato.
Os EUA atravessam um período dramático devido ao refluxo das sanções aplicadas pelo ocidente à Rússia, com uma inflação a bater recordes de 40 anos, e com o risco - alguns analistas admitem ser já irreversível - de uma recessão ao virar da esquina, quando se aproximam rapidamente as eleições de meio-termo, a 08 de Novembro próximo, onde Joe Biden, que já se sabe que vai voltar a concorrer em 2024, será testado de forma como há muitos anos não ocorre, prejudicado que está fortemente pela condição decrepita da economia norte-americana, que o pode levar a perder as maiores no Senado e na câmara dos Representantes, o que seria um rude golpe nas suas aspirações.
Mas o mesmo sucede na Europa ocidental, onde alguns países, como a Alemanha, o motor da economia europeia, está a observar uma fragilização permanente da sua economia devido aos elevados custos da energia, especialmente, o gás oriundo da Rússia, do qual depende grandemente para manter viva a sua poderosa indústria, mas também do crude, estando Berlim "entalada", como, de resto, Washington, entre a urgência de aliviar o peso das consequências da guerra na Ucrânia e o refluxo do apoio substantivo político e militar a Kiev no seu esforço de guerra contra a Rússia.
O barril de crude tem vindo, esta semana, já por causa das fugas de informação que apontam para uma redução substantiva da produção da OPEP+ a definir hoje, a valorizar de forma impressiva, saindo do buraco dos 84 USD em que afundou em finais de Setembro, estando o Brent, em Londres, hoje, a valer, perto das 15:45, hora de Luanda, 92,3 USD, +0,57% que no fecho de terça-feira.
Mas os analistas não duvidam que se se confirmar o corte da OPEP+ pela fasquia mais alta, perto de 2 mbpd, o barril será catapultado para cima dos 100 USD, e mesmo além disso, podendo abeirar-se deste patamar se o corte for menos pronunciado.
A componente política desta reunião da OPEP+ é outra faceta a ser observada porque em Washington, segundo os media norte-americanos, Biden & Co. estão a olhar para a situação a partir de uma atitude hostil de Moscovo e Riade, dois países a atravessar as mais difíceis e complexas relações com os EUA, a ponto de o Presidente norte-americano ter visto o príncipe saudita Mohammed Bin Salman recusar-se a atender-lhe o telefone, como noticiaram os media internacionais.
Embora, como costume, não se saiba qual a posição de Angola nesta reunião, mesmo sendo um dos maiores produtores africanos, actualmente mesmo acima da Nigéria, mas por causa de grandes problemas internos em Abuja, Luanda tem o foco neste encontro de Viena de Áustria porque ainda depende grandemente dos rendimentos do petróleo para amaciar a crise económica que o país atravessa há anos.
Alias, este momento é relevante ainda porque o crude responde a 95% das exportações nacionais, mais de 35% do PIB e perto de 60% das receitas fiscais angolanas.
E, a sublimar ainda esta posição angolana, está o facto de que a sua produção actual, perto de 1,1 mbpd, está longe da quota atribuída inter pares na OPEP+, devido, essencialmente, ao envelhecimento dos seus campos e à falta de investimento na pesquisa e na manutenção da sua infra-estrutura produtiva offshore que vem em crescendo desde 2014, ano em que a crise ganhou rubor e o barril deu um tombo ruidoso para baixo da fasquia dos 100 USD.
Outra perspectiva
Apesar deste cenário, há uma dúvida que atravessa a mesa dos 23 membros da OPEP+. Esta: Se baixar a produção, no imediato sobem os preços, aumentando os rendimentos dos produtores/exportadores, alguns deles, como Angola ou a Nigéria, muito dependentes deste sector, mas isso levará a que a inflação mantenha a sua fase de ascensão nas grandes economias consumidoras de crude, o que levará inevitavelmente a uma deterioração do seu tecido económico e, logo, a uma redução do consumo de energia, pressionando os preços em baixa.
Perante este dilema, alguns analistas, embora escassos, admitem que o cartel será levado a escolher uma posição de prudência, com uma opção reduzir pouco a produção - a anterior decisão, no início de Setembro, foi de baixar, para Outubro, em 100 mil bpd - ou então, devido à pressão de alguns dos seus membros, mais sensíveis à pressão dos EUA, manter o actual estado de coisas.
Mas não é assim que pensam, por exemplo, os analistas da JP Morgan Chase, uma das maiores casas financeiras do mundo, que, segundo a Bloomberg, avança que a OPEP+ deverá optar um corte de até 500 mil barris por dia de forma a estabilizar os preços num patamar acima dos 90 USD por barril.
Mas, com a guerra na Ucrânia em pano de fundo, os líderes de facto da OPEP+, Arábia Saudita e Rússia, deverão aproveitar para desafiar abertamente os EUA, com as relações entre Washington de um lado e Riade e Moscovo do outro, a deteriorarem-se a olhos vistos, sendo que os EUA anseiam por mais crude no mercado para menos dólares pagos por barril e menos custo a atestar as viaturas nos postos de abastecimento.