E a verdadeira surpresa seria o Irão protelar indefinidamente esse ataque, que está prometido pelo próprio Líder Supremo, aiatola Ali Khamenei, até já ninguém esperar, apanhando assim de surpresa Israel e os seus aliados norte-americanos e britânicos.

Tanto em Washington como em Londres, a defesa de Israel está a ser vista como se de uma ameaça aos próprios Estados Unidos e Reino Unido fosse, o que fica claro ao somar os meios militares destacados por estes dois países na região.

Só os Estados Unidos deslocaram para o Mar Mediterrâneo Oriental dois porta-aviões, o USS Abraham Lincoln e o USS Gerald R. Ford, embora, com clara e intencional desinformação passada para os media norte-americanos, seja difícil verificar se estes já estão no local, se estão a caminho ou se são outros os navios desta classe em prontidão na região.

Mas não há dúvidas de que os EUA e o Reino Unido têm presentemente dois porta-aviões, ou vão ter em breve, um porta-helicópteros, cerca de 20 navios de guerra de diferentes categorias, incluindo submarinos nucleares.

Além de terem efectuado um reforço substancial dos meios colocados nas bases da região que Londres e Washington possuem no Médio Oriente, incluindo na Arábia Saudita, Emiratos, Catar, Bharain e Kuwait...

Nestas bases estarão agora mais de 100 aviões de guerra, incluindo dezenas dos modernos F-35 e F-22, além de mais de 40 mil miliares dos vários ramos, com destaque para várias unidades de forças especiais.

A liderar a força ocidental de apoio a Israel para uma eventual guerra com o Irão, ou para defender Telavive de um ataque retaliatório de Teerão, está há já vários dias na região, segundo a Associated Press, o general Michael Erik Kurilla, que dirige o Centro de Comando dos EUA para o Médio Oriente, com visitas sucessivas aos vários países onde estão localizadas as bases norte-americanas.

Face a este poderio militar, que ofusca o que está disponível pelo Irão, mesmo com os recentes acordos de segurança assinados com a Rússia e a China, em Teerão estão a ser equacionadas todas as possibilidades, como alguns analistas começam a apontar, incluindo a possibilidade de o Irão deixar Washington e Telavive a cozinhar na sua própria tensão por tempo indeterminado.

E a visita em curso do actual líder do Conselho de Segurança da Rússia, o até há pouco tempo ministro da Defesa, general Sergei Shoigu, a Teerão, é um indicador claro de que Moscovo está a cooperar com o seu mais importante aliado na região, a par da Síria, no que diz respeito à gestão do presente cenário e nos que podem surgir no futuro imediato e mais longo.

Até porque os estrategas iranianos e russos, e, provavelmente, chineses, com quem Teerão também tem um acordo de cooperação militar estratégica, sabem que se o ataque que foi anunciado não surgir em breve, tanto em Telavive como em Washington vão começar a surgir questões complexas e melindrosas.

Nomeadamente as decisões do Governo do primeiro-ministro israelita Benjamin Netanyhau, nomeadamente a facada nas costas do Presidente dos EUA, Joe Biden, que foi o assassinato de Ismail Haniyeh quando este liderava a delegação do Hamas nas negociações de paz com Israel que decorriam em Roma, Itália e nas quais Washington estava publicamente empenhada.

A questão agora em cima da mesa é, para os estrategas iranianos, se será um golpe mais eficaz lançar ataques contra Israel, incluindo com recurso aos grupos que controla na região, como o Hezbollah, no sul do Líbano, e os Houthis, no Iémen, além das milícias xiitas no Iraque e na Síria, ou deixar Netanyhau e Joe Biden a arder em lume brando na expectativa estratégica.

Para já, passada uma semana desde a morte de Haniyeh, além do nº 2 do Hezbollah, general Fuad Shukr, igualmente abatido por Israel, horas antes, no Líbano, uma coisa, segundo vários analistas, é certa: em Teerão não está em equação apenas uma opção.

E, para dar força a esta tese, o Irão acaba de convocar uma reunião de emergência com os Estados árabes da região, colocando em cima da mesa um pedido de reconhecimento do direito de contra-atacar Israel depois das duas mortes da passada semana.

As questões complicadas para Netanyhau e Biden

São simples de fazer mas complexas para responder.

- Porque é que Netanyhau optou por arriscar humilhar o seu principal aliado, obrigando-o a colocar-se ao seu lado, apesar de ter feito propositadamente colapsar as negociações com o Hamas em que Washington estava totalmente empenhada na qualidade de mediador?

- O que leva Biden a ignorar a forma indigna como o primeiro-ministro o está a tratar, expondo ainda mais as suas fragilidades, ignorando não só os seus apelos para aceitar ceder o suficiente para assinar um cessar-fogo com o Hamas, como implodiu esse processo negocial com os atentados da semana passada?

Com a tensão instalada face à expectativa alimentada pelos media internacionais de um iminente ataque iraniano a Israel, estas questões estão em segundo plano, mas com o passar dos dias, se os misseis iranianos não começarem a voar para Israel, começarão a voar para as páginas dos jornais e ecrãs de tv estas perguntas...

Nalguns média, como no britânico The Guardian, ou no norte-americano The New York Times, a resposta iraniano já está em curso, na forma de um recente ataque com roquetes de pequena dimensão e poder explosivo, a uma base anglo-americana no Iraque, lançados por uma milícia xiita pró-iraniana.

A Base Asad, a maior que os EUA possuem no Iraque, contra a vontade do Governo de Bagdade, foi atingida por dois roquetes katyusha na noite de segunda-feira para hoje, terça, 06, ferindo cinco militares ocidentais.

No entanto, este tipo de ataques são comuns e ocorrem ciclicamente, mesmo fora de contextos de maior melindre, como é o caso do actual cenário, sendo difícil encarar o que foi feito contra a Base Asad como parte da retaliação de Teerão.

São, no entanto, um alerta para as lideranças militares norte-americana e israelita, com o secretário da Defesa, Lloyd Austin, e o ministro das Defesa, Yoav Gallant, em permanente contacto, tendo mesmo, segundo a Reuters, feito já uma análise a este ataque no Iraque, considerando tratar-se de uma arriscada escalada regional.

Ora, uma das certezas que os EUA têm, na circunstância de despoletar um conflito alargado israelo-iraniano, todas as bases e instalações militares norte-americanas na região, incluindo os seus meios navais, como os porta-aviões, alvos vulneráveis aos misseis hipersónicos iranianos, serão alvos preferenciais das milícias e grupos pró-Teerão.

E no momento em que os EUA vivem um período flamejante de campanha eleitoral para as Presidenciais de 05 de Novembro, quaisquer baixas militares podem influir negativamente nos objectivos democratas de Kamala Harris em levar de vencido o republicano Donald Trump.

E essa é a outra indesculpável armadilha de Netanyhau aos democratas de Joe Biden e Kamala Harris, forçando esta tensão que, no contexto eleitoral, pode gerar vantagens para Trump, que é o amigo de longa data e candidato preferido do primeiro-ministro israelita.

Já para Netanyhau, a razão para correr tantos riscos ao manipular o poder do principal aliado de Israel e a maior potência militar do mundo, é, sendo isso o motivo mais visível, é afastar as atenções do fracasso da sua operação militar em Gaza, empurrar para longe as dúvidas crescentes sobre as "oportunas" falhas de segurança interna aquando do ataque do Hamas do 07 de Outubro e protelar o momento em que terá de voltar à barra do tribunal na condição de arguido acusado de corrupção agravada.

Além deste quadro, Netanyhau tem ainda sobre a sua cabeça a ameaça dos pequenos partidos radicais, ideológica e religiosamente, que já ameaçaram deitar abaixo a coligação liderada pelo Likud, se a operação em Gaza terminar sem a destruição total do Hamas, a libertação de todos os reféns e fazer daquele território um lugar seguro para Israel, que são as promessas por cumprir feitas após o 07 de Outubro pelo primeiro-ministro israelita.

Entretanto, em Gaza, as atrocidades israelitas continuam sem travão e só na última semana foram mortas mais de 150 pessoas, como sempre, na sua maioria crianças, colocando o número total de mortos em Gaza desde 07 de Outubro nas 40 mil, das quais mais de 20 mil são crianças e perto de 15 mil mulheres e idosos.

Seguem ainda as acusações de genocídio contra Netanyhau e os seus ministros, bem como os mandatos internacionais de captura emitidos contra estes, bem como lideresdo Hamas, pelo Tribunal Peal Internacional e pelo Tribunal Internaconal de Justiça.