A Central Nuclear de Zaporijia, uma das maiores do mundo e a de maior capacidade na Europa, com seis reactores de grande produção, chegando aos 5.700 MW em pleno funcionamento - a maior barragem angolana, a de Laúca, atinge os 2.000 MW -, situada no sudeste ucraniano, junto ao Rio Dniepre, foi tomada pelos russos poucos dias depois da invasão da Ucrânia ter começado, mas as forças de Kiev não desistem de tentar retomar o controlo desta infra-estrutura fundamental para a economia do País e para garantir que milhões de casas não congelam no Inverno.
E é esse o problema, ucranianos e russos não parecem estar dispostos a largar a posse da central nuclear nas mãos do inimigo. O facto conhecido e provado é que a estrutura nuclear está há semanas a ser bombardeada nas suas imediações, por ucranianos, garantem os russos, pelos invasores, atestam as forças ucranianas, o que deixa como certo que este é um dos pontos mais quentes do conflito no leste europeu pelas suas consequências devastadoras caso alguma coisa corra mal, por ser mal planeada ou com propósito, atingindo um dos seis reactores da unidade nuclear de produção de energia eléctrica.
Na memória dos europeus está ainda o desastre nuclear de Chernobyl, no norte da Ucrânia, que resultou da explosão de um reactor, espalhando uma nuvem tóxica radioactiva que cobriu uma vasta geografia europeia, chegando mesmo ao sul da Europa e ao extremo norte escandinavo, matando dezenas de milhares de pessoas e deixando doentes centenas de milhares.
A ONU já veio, pela voz do seu Secretário-Geral, António Guterres, alertar para o perigo que representa esta disputa explosiva entre russos e ucranianos pelo controlo da central de Zaporijia, pedindo que a Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA) obtenha autorização de ambos os lados para vistoriar a estrutura, tendo o chefe da agência, Rafael Grossi, admitido que existe um risco de acidente grave mas que esse perigo não é iminente, para já.
Entretanto, já depois de o Presidente russo, Vladimir Putin, ter anunciado que a AIEA estava autorizada a enviar uma equipa ao local, para salvaguardar eventuais ocorrências, com Kiev a manter-se reticente, optando antes por encetar conversas directas com os norte-americanos, como sucedeu esta quinta-feira, numa conversa entre os Presidentes Joe Biden e Volodymyr Zelensky, sobre este assunto.
Os EUA, tal como a União Europeia e o Reino Unido, são os grandes defensores da continuação da guerra dos ucranianos contra os russos, armando Kiev sem limites, para, como disse a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, o Secretário da Defesa dos EUA, Lloyd Austin, e o primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, corroer e desgastar a Rússia até ao seu limite, tendo, para isso criado um fluxo ininterrupto de armas para Kiev e um fluxo ainda mais denso de pacotes de sanções económicas para Moscovo.
As sanções económicas da União Europeia, do Reino Unido e dos EUA atiradas contra a Federação Russa, atingindo drasticamente Moscovo mas ainda mais copiosamente o mundo ocidental, que, por causa delas, vive hoje uma inflação histórica de mais de 40 anos, um desemprego galopante e sem fim à vista, a recessão é já inevitável em algumas latitudes e o descontentamento popular está a atingir níveis estratosféricos, levando mesmo a derrotas ou fracos resultados eleitorais importantes em países como a Itália, França...
A Rússia é de entre os países directamente atingidos pela crise, o que menos está a ser afectado, como o demonstram as análises de instituições internacionais, sendo disso exemplo os ganhos cambiais da sua moeda, o Rublo, face ao dólar e ao euro.
E, para a Europa ocidental, o pior pode ainda estar para vir graças ao decréscimo do fluxo de gás natural russo para a Europa, fundamental para o aquecimento das casas e para a poderosa indústria europeia especialmente a petroquímica alemã, que é o país-motor da economia da Europa ocidental, e onde se admite já um colapso com consequências devastadoras.
A par disto tudo, os combustíveis não travam a escalada nos preços, os alimentos aumentam com uma fluidez destrutiva nas zonas mais empobrecidas do mundo, de África ao sudoeste e sudeste da Ásia... fruto directo do conflito no leste europeu.
Não pode ser ainda ignorado risco de uma escalada nuclear, porque, no caso de uma envolvência directa de países da NATO no conflito ucraniano, os russos já avisaram, tal como o Presidente norte-americano, que um avanço para o patamar em que o recurso ao arsenal nuclear é inevitável seria o passo seguinte.
O que se sabe neste momento é que todas as grandes potências ocidentais voltaram a comprometer-se directamente no incessante apoio militar a Kiev por ocasião das comemorações do Dia Nacional da Ucrânia e da passagem do marco dos seus meses de guerra, a 24 de Agosto o que não abre apenas a porta a um infindável conflito como deixa mais perto um holocausto nuclear.
Contexto da guerra na Ucrânia
A 24 de Fevereiro as forças russas iniciaram a invasão da Ucrânia por vários pontos, tendo o Presidente russo dito que se tratava de uma "operação militar especial", sublinhando que o objectivo não é a ocupação do país vizinho mas sim a sua desmilitarização e desnazificação e assegurar que Kiev não insiste na adesão à NATO, o que Moscovo considera parte das suas garantias vitais de segurança nacional.
O Kremlin critica há vários anos fortemente o avanço da NATO para junto das suas fronteiras, agregando os antigos membros do Pacto de Varsóvia, organização que também colapsou com a extinção da URSS, em 1991.
Moscovo visa ainda garantir o reconhecimento de Kiev da soberania russa da Península da Crimeia, invadida e integrada na Rússia, depois de um referendo, em 2014, e ainda a independência das duas repúblicas do Donbass, a de Donetsk e de Lugansk, de maioria russófila, que o Kremlin já reconheceu em Fevereiro.
Do lado ucraniano, a visão é totalmente distinta e Putin é acusado de estar a querer reintegrar a Ucrânia na Rússia como forma de reconstruir o "império soviético", que se desmoronou em 1991, com o colapso da União Soviética.
Kiev insiste que a Ucrânia é una e indivisível e que não haverá cedências territoriais como forma de acordar a paz com Moscovo, sendo, para o Presidente Volodymyr Zelensky, essencial o continuado apoio militar da NATO para expulsar as forças invasoras.
A organização militar da Aliança Atlântica está a ser, entretanto, acusada por Moscovo de estar a desenrolar uma guerra com a Rússia por procuração passada ao Exército ucraniano, o que eleva, segundo o ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Sergei Lavrov, o risco de se avançar para a III Guerra Mundial, com um confronto directo entre a Federação Russa e a NATO, que tanto o Presidente dos EUA, Joe Biden, como o Presidente Vladimir Putin, da Rússia, já admitiram que se isso acontecer é inevitável o recurso ao devastador arsenal nuclear dos dois lados desta barricada que levaria ao colapso da humanidade tal como a conhecemos.
Esta guerra na Ucrânia contou com a condenação generalizada da comunidade internacional, tendo a União Europeia e a NATO assumido a linha da frente da contestação à "operação especial" de Putin, que se materializou através de bombardeamentos das principais cidades, por meio de ataques aéreos, lançamento de misseis de cruzeiro e artilharia pesada, e com volumosas colunas militares a cercarem os grandes centros urbanos do país, mas que agora está concentrada no leste e sudeste da Ucrânia.
Na reacção, além da resistência ucraniana, Moscovo contou com o maior pacote de sanções aplicadas a um país, que está a causar danos avultados à sua economia, sendo disso exemplo a queda da sua moeda nacional, o rublo, que chegou a ser superior a 60%, embora já tenha, entretanto, recuperado.
Estas sanções, que já levaram as grandes marcas mundiais a deixar a Rússia, como as 850 lojas da McDonalds, a mais simbólica, abrangem ainda os seus desportistas, artistas, homens de negócios, a banca e grande parte das suas exportações, ficando apenas de fora o sector energético, do gás natural e em pate do petróleo...
Milhares de mortos e feridos e mais de 5,5 milhões de refugiados nos países vizinhos da Ucrânia são a parte visível deste desastre humanitário.
O histórico recente desta crise no leste europeu pode ser revisitado nos links colocados em baixo, nesta página.