A batalha entre Kamala Harris e Donald Trump pela maioria dos 538 votos do Colégio Eleitoral nas eleições presidenciais desta terça-feira está ao rubro, mas, agora, já na contagem dos votos. Os resultados das eleições são, nos últimos anos, declarados poucas horas após o encerramento das urnas, mas este ano poderá haver uma espera mais longa, devido à disputa acirrada em muitos Estados, o que pode significar que os meios de comunicação social sejam obrigados a aguardar mais tempo antes de projectar o vencedor.

Kamala Harris começou a corrida à Casa Branca em Julho deste ano, após a desistência de Joe Biden. A actual vice-presidente poderá vir a ser a primeira mulher e também a primeira ásio-americana a chegar ao cargo mais importante do país.

O adversário, Donald Trump, candidato republicano, foi o 45º Presidente dos Estados Unidos, num mandato que ficou marcado por grande imprevisibilidade, pela gestão da Covid-19, mas também pela invasão do Capitólio, a 6 de Janeiro de 2021.

No entanto, num sistema profundamente bipartidário, estes não são os únicos candidatos em quem os norte-americanos poderão votar. Há vários Estados em que também entram, para além do Partido Democrata e Partido Republicano, candidatos de movimentos, como o Chase Oliver, do Partido Libertário, ou Jill Stein, do Partido Verde, e ainda Cornel West, candidato independente.

O que mais se destacou foi Robert F. Kennedy Jr, que abandonou a corrida ainda em Agosto, tendo depois declarado apoio a Donald Trump.

Mas nesta eleição decide-se mais do que a presidência

Para além da presidência e da vice-presidência, decide-se nesta eleição a composição de grande parte do Congresso e também os governadores de alguns Estados.

Na Câmara dos Representantes, vão a eleição 435 lugares. De momento, há uma maioria republicana de 220 para 213. Já no Senado, actualmente controlado pelos democratas (49-47) haverá renovação de apenas 34 dos 100 lugares.

Decide-se também os governadores de 11 dos 50 Estados do país: Delaware, Indiana, Missouri, Montana, New Hampshire, Carolina do Norte, Dakota do Norte, Utah, Vermont, Washington e West Virgina.

Os eleitores de 41 Estados vão ainda votar um total de 159 iniciativas eleitorais. Em dez Estados, incluindo o Arizona, Colorado e Flórida, vão votar iniciativas relacionadas com o aborto. Outros, incluindo a Flórida, Dakota do Norte e Dakota do Sul vão votar a legalização da cannabis.

E na política externa?

Não é incomum dizer-se que todos os cidadãos do mundo deveriam ter direito a votar nas eleições dos EUA porque tamanha é a influência que a maior economia do Planeta e a maior potência militar global tem sobre todos e cada um de nós.

Isso, mesmo que tal proeminência esteja claramente já abalada pelo crescente bloco do Sul Global representado pelos BRICS, assentes no eixo China-Rússia-Índia, é possível de verificar pela cobertura mediática que as eleições norte-americanas merecem e todos os países do mundo.

Mas, no que diz respeito a África e a Angola, o que representa uma mudança na Casa Branca...?

Provavelmente quase tudo, porque é conhecido e famoso o alheamento de Trump - basta ir ver os anos em que foi Presidente, entre 2016 e 2020 -, para a política externa, sendo o seu mote concentrar quase tudo na política interna, e muito menos atenção prestou a África...

Para Angola, esta questão assume especial interesse, porque, com a Administração democrata de Joe Biden, Luanda passou a estar no mapa das prioridades dos EUA, como se vê pela aposta de Washington no Corredor do Lobito, cujo potencial passa quase em absoluto pela ligação à RDC e aos gigantescos recursos naturais congoleses.

Recursos naturais esses que são a pedra de toque da luta global entre americanos e chineses pelo domínio e influência em todo o mundo, sendo o "factor x" das novas indústrias tecnológicas, de onde despontam minérios como o coltão, cobalto ou as insondáveis terras raras.

E a grande questão é claramente uma: se Kamala Harris vencer, nada obsta a que a aposta de Washington no Corredor do Lobito como prego espetado na estratégia monopolista da China nos recursos da RDC tenha continuidade, mas se Trump vencer, poucas garantias há de que os americanos passem ao lado deste projecto.

A única estaca que pode aguentar o peso do alheamento histórico que Trump dedica a África é o facto de também ele ter a China como "inimigo a abater" e a questão dos recursos africanos terem, sem sombra de dúvida, um papel de primeira linha nesse combate global entre as duas grandes superpotências económicas.

Igualmente relevante é a programada visita de Joe Biden a Luanda na primeira semana de Dezembro, porque se pode perguntar, naturalmente, qual será o ponto de manter a visita em caso de vitória de Donald Trump?

Claro que há a relação pessoal forjada entre Biden e o Presidente João Lourenço, e ainda o facto de os Estados terem continuidade nos seus interesses estratégicos, que vão além das lideranças políticas...

Mas é igualmente verdade que Donald Trump não será um Presidente como os outros, não apenas por causa da sua famosa teimosia, mas também pelo ódio que se ergueu entre Trump e a dupla Biden e Kamala Harris, que não tem paralelo com nenhum outro período histórico na política norte-americana, especialmente no grau de agressividade visível da retórica de campanha.

Mas só depois, no pós-eleições, quando as equipas de Trump, se este sair vencedor do pleito de amanhã, começarem o processo de passagem de pastas, é que se saberá se o regresso à Casa Branca permitirá ou não manter algumas das apostas estratégicas de Biden e se, entre estas, estará a questão das elações entre Luanda e Washington e o investimento no Corredor do Lobito.