Tropas russas estacionadas no Níger, segundo um oficial superior norte-americano, na condição de anonimato, entraram na base dos EUA onde estão cerca de mil militares que operam a esquadra de drones para a África Oriental e do Sahel.
Esta informação foi prestada à Reuters e rapidamente se espalhou como fogo em capim seco, considerando mesmo a agência que se trata de uma situação preocupante, porque há mais de um mês que o Governo de Niamey exigiu a saída das forças norte-americanas do país.
O Níger é um dos três países do Sahel, com o Mali e o Burquina Faso, que, depois de golpes militares, cortaram relações, total ou parcialmente, com a França, antiga potência colonial, e afastaram-se de Washington na exacta medida que se aproximaram da Rússia e da China. (ver links em baixo nesta página)
Agora, num contexto global, onde russos e norte-americanas nunca estiveram tão perto de um confronto deste o fim da Guerra Fria, em 1991, por causa da guerra na Ucrânia, é em África que essa linha pode estar à beira de ser trespassada.
Isto, porque, segundo este oficial dos EUA no Níger contou à Reuters, pessoal militar russo entrou na base aérea norte-americana, criando uma situação de risco sério, porque os militares russos estão no país a convite da junta militar.
Enquanto isso, os norte-americanos estão no país contra a vontade da junta militar liderada pelo general Abdourahamane Tchiani, que depós em Junho de 2023 o Presidente Mohamed Bazoum, a quem já foi ordenada a saída do país.
Esta ousada acção dos militares russos é claramente uma tentativa de pressionar os norte-americanos a deixarem o país.
Mas também colocou tropas norte-americanas e russas olho no olho, como não sucedia há d+ecadas, num momento de claro confronto político-diplomático global, com a guerra na Ucrânia como ponto mais quente, onde Washington e a NATO alimenta o esforço de guerra de Kiev contra Moscovo
Nesta base ocupada, situada nas imediações do aeroporto de Niamey, pelas tropas norte-americanas no Níger estão cerca de mil militares, sendo a especialidade da maioria deles a operação de drones de vigilância de longo curso, que monitorizam, alegadamente, a actividade jihadista no Sahel e Saara e África Oriental.
Quanto aos russos, serão mais de 5 mil, quase integralmente, excepto a equipa de conselheiros, antigos elementos do Grupo Wagner, que mudaram de insígnias após a morte do seu fundador, Yevgeny Prigozhin, em Agosto do ano passado após uma tentativa de intentona em Moscovo.
Esta situação foi de alguma tensão durante horas mas poderá evoluir para a condição de permanente risco de confrontos porque os militares russos ocuparam um hangar, onde estão a instalar a sua "base", quase lado a lado com os norte-americanos.
Além de ser um evidente desafio, esta situação vai exigir a criação de fortes medidas de protecção para a informação ali recolhida pelos americanos, podendo mesmo tornar a sua presença insustentável a prazo no país ou, pelo menos, naquela base.
Macron ameaça Putin... de novo
Entretanto, o Presidente francês, Emmanuel Macron, voltou a mexer com o sistema nervoso central da NATO e do Kremlin, ao dizer, numa entrevista à revista britânica The Economist, que se o Presidente ucraniano pedir, a França vai enviar unidades militares para combater os russos.
A única condição importa por Macron para enviar milhares de militares franceses para a frente de guerra na Ucrânia é a Rússia atravessar as linhas de defesa de Kiev, em qualquer ponto da linha da frente, que tem mais de mil quilómetros.
Ora, como já sublinharam vários analistas militares, ou Macron não pensou bem no que disse, ou já decidiu que a França vai entrar na guerra ao lado da Ucrânia.
Isto, porque, para ter forças de Paris ao seu lado a combater, Volodymyr Zelensky só precisa de ficcionar uma ruptura defensiva, ou, como é cada vez mais normal que venha a suceder devido à clara superioridade russa em todas as área do campo de batalha, ela ocorra naturalmente.
Nesta entrevista, que foi dada com o claro objectivo de lançar de novo o tema da entrada da NATO no conflito ucraniano, Emmanuel Macron notou ser "legítimo" analisar essa possibilidade assim que a Rússia furar as linhas ucranianas e Kiev fizer o pedido formal de ajuda.
"Não colocamos nenhuma possibilidade de parte porque estamos a ludar com alguém que não coloca nenhuma possibilidade de parte", disse Macron, refereindo-se ao Presidente russo Vladimir Putin mas sem explicitar sobre o que quer dizer com "nada colocar de parte".
Isto, porque Putin já disse e repetiu dezenas de vezes que quer negociar uma saída para a guerra com a Ucrânia e que não tem qualquer intenção de avançar para as fronteiras da NATO na Europa Ocidental.
Isto, numa altura em que, claramente, as linhas de defesa ucranianas na frente de guerra são trespassadas pelas forças russas diariamente, logo consubstanciando as condições para a entrada da guerra no conflito, e ainda por cima com o facto evidenciado já de que Zelensky já por diversas vezes repetiu os pedidos de ajuda aos países das NATO, especialmente com o pedido ruidoso de criação de uma zona de exclusão aérea sobre a Ucrânia.
Nas últimas semanas, as forças russas, como reconhece o Presidente Zelensky, têm avançado e conquistado dezenas de localidades nas zonas de Donetsk e Zaporizhia, com evidências de iminente colapso da capacidade defensiva ucraniana, com a debandada de unidades umas atrás das outras e retirada desordenada para linhas recuadas noutros casos.
Macron considerou que esta entrevista teve como objectivo estremecer os países da NATO para garantir que a Rússia não pode, sob nenhuma perspectiva, vencer esta guerra, porque se tal se verificar "não haverá paz na Europa".
Estas palavras são de tal movo estridentes que desde a sua publicação, na quinta-feira, 02, os media internacionais e os canais de Youtube e as redes sociais com contas dedicadas a este conflito não conhecem outro tema.
E são de tal modo inquietantes, porque o envio de tropas francesas para combater na Ucrânia seria a entrada da NATO na guerra que, tanto o Presidente norte-americano, Joe Biden, como o russo, Vladimir Putin, já disseram que assim que for trocado o primeiro tiro entre a NATO e a Federação Russa nada poderá travar a escalada para uma devastadora guerra nuclear.
Ora, sabendo disso, a tese mais vincada é a de que Macron está apenas a tentar ganhar protagonismo internacional quando a França está em clara perda global enquanto potência, como, de resto, é melhor exemplo a situação no Sahel e África Ocidental, com o processo de desmantelamento da "FranceAfrique".
E também a criar antecipadamente o argumento para se proteger quando a Rússia, como será inevitável, ganhar a guerra no campo de batalha ou na mesa das negociações, podendo então alegar que a NATO só não foi em socorro efectivo da Ucrânia porque os restantes aliados a isso se opuseram.
Macron fez ainda questão de sublinhar que o Ocidente tem de pensar bem se pretende deixar emergir uma situação em que o apoio quase ilimitado em material militar à Ucrânia não foi suficiente para impedir a derrota face à Rússia, que muitos consideravam uma potência de segunda linha com armas nucleares.
Crescem dúvidas sobre pacote de apoio dos EUA
Com este ruído gerado pela entrevista de Macron, ficou para uma segunda linha a crescente vaga de dúvidas sobre a eficácia do recentemente aprovado pacote de ajuda militar norte-americana à Ucrânia, finalmente aprovado pelo Congresso, de 61 mil milhões USD, propostio pelo Presidente Biden.
Isto, porque, depois de esmiuçado, começa a ser claro que pouco dessa verba servirá efectivamente para adquirir armas para reforçar as forças ucranianas, especialmente sistemas de defesa antiaérea.
Isto, porque dos 61 mil milhões, apenas cerca de 13 mil milhões USD são para armamento novo, sendo o restante para repor stocks nos EUA, para financiar a presença militar dos EUA na Europa, especialmente nos exercícios no âmbito da NATO, e uma outra parte para pagar despesas do Estado ucraniano.
Além disso, só nesta semana, confirmado por diversas fontes, incluindo ucranianas, a Rússia destruiu vários locais de armazenamento de munições e misseis enviados para a Ucrânia ao abrigo deste pacote de ajuda dos EUA na região de Odessa.
Com o ímpeto que as forças russas estão a ganhar terreno na frente de batalha, e com a superioridade aérea inequívoca, como apontou o analista suíço, antigo oficial da NATO e elemento da intelligentsia helvética, todo o material que chega aos ucranianos é fundido na fornalha da guerra sem tempo para fazer qualquer diferença.
Alias, o próprio ministro dos Negócios Estrangeiros ucraniano, Dmitri Kuleba, já veio dizer, numa igualmente bizarra entrevista à revista norte-americana Foreign Policy, que os EUA não podem estar à espera de ver a Rússia ser derrotada quando a Ucrânia não dispõe de meios adequados.
E, numa alusão que permite traduzir por aceitação de uma derrota iminente, Kuleba desafiou os EUA a procurarem o problema do seu lado e não do lado ucraniano, sublinhando que a Rússia conseguiu ser mais eficiente na produção de armamento que toda a aliança ocidental.
"É um mau sinal", advertiu o chefe da diplomacia ucraniana, acrescentando que "as coisas têm de mudar se formos sérios sobre a questão de defender a ordem mundial como a conhecemos".
"Questionam-se", pediu Kuleba, sobre "o que é que estão a fazer mal para que o vosso aliado não consiga prevalecer no campo de batalha", numa das mais estridentes declarações de desconforto em Kiev com o "pouco" que os países da NATO estão a fazer para ajudar a Ucrânia.
Um dos exemplo que está na mente de Kuleba e de todo o regime em Kiev é no campo da defesa antiaérea, porque, nas últimas semanas, a Rússia destruiu praticamente a capacidade de resposta ucraniana fornecida pelo ocidente, desde os sistemas Patriot aos alemães Iris-T, ou aos antigos S-300 ou os NASAMS também dos EUA, mas de curto e médio alcance.
A título de exemplo, a Ucrânia precisa, segundo Kuleba, de um mínimo de sete Patriot, com custos por unidade de 1,3 mil milhões USD, o que, praticamente consumiria a totalidade do apoio dos EUA recentemente aprovado, que é, de facto, de 13 mil milhões USD.
Além disso, com a superioridade aérea russa total, os ucranianos são obrigados a levar para a linha da frente os sistemas que lhes restam, expondo-os aos ataques de misseis e drones russos, como sucedeu ainda esta semana, onde mais um Iris-T foi destruído, sendo que cada um custa mais de mil milhões USD e com este já são pelo menos cinco inutilizados este ano.